Ficha do Proponente
Proponente
- DANIELA GOMES (USP)
Minicurrículo
- Licenciada e Bacharel em História pela Universidade Federal de Ouro Preto, é Mestre em Comunicação pela mesma instituição e, atualmente, Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da USP. É integrante do Grupo de Pesquisa Cnpq “História e Audiovisual: circularidades e formas de comunicação”. Pesquisa o cinema estadunidense contemporâneo analisando os filmes a partir das relações teóricas e metodológicas entre cinema e história.
Ficha do Trabalho
Título
- Imaginando o fim do mundo: cinema catástrofe na era Bush-Cheney.
Formato
- Presencial
Resumo
- Analisamos as representações da catástrofe e os discursos de crise política e social presentes na construção cinematográfica do filme O Dia Depois de Amanhã (2004), de Roland Emmerick. Partimos de um esforço de compreensão do cinema catástrofe estadunidense em sua historicidade enquanto gênero cinematográfico, demarcando diferentes nuances em diferentes contextos, históricos e culturais, do país.
Resumo expandido
- Analisamos os discursos escatológicos que encontram eco nas narrativas cinematográficas de desastre dos anos 2000 nos Estados Unidos e suas associações com tensões e crises políticas que marcaram o primeiro mandato presidencial de Bush-Cheney (2001-2009); a partir da análise fílmica de O Dia Depois de Amanhã (2004), de Roland Emmerich. Como hipóteses de compreensão do universo narrativo de catástrofe no contexto dos mandatos presidenciais Bush-Cheney, temos que a recorrência de finais felizes para cenários que prometem total disrupção reforçam uma visão conservadora e patriarcal enquanto solução para um contexto de crise social e política.
Etimologicamente, temos que “catástrofe” vem do Grego e significa, “inverter”, “reviravolta”, “virar de cabeça para baixo”. Na Antiguidade, era um termo utilizado para indicar o desfecho de uma representação dramática. Assim, a catástrofe seria um final, feliz ou triste, mas que representaria o clímax de uma narrativa. Nos estudos filosóficos sobre as “teorias da catástrofe”, o termo se apresenta em uma breve confusão semântica na medida em que, no momento em que a teoria é proferida, catástrofe era entendida enquanto componente de uma teoria que procurava analisar a permanência de todas as coisas, sua resistência diante do tempo. Tal compreensão retirava da “catástrofe”, como passava a ser experimentada pela sociedade, o seu aspecto de “evento excepcional”. Essa confusão vai se desmanchando à medida que as catástrofes, ou os fenômenos de interesse da teoria, começavam a escapar do imaginário se transformando em ameaças reais, constantes. Assim, pensar em catástrofe passa a ser algo mais próximo da sua raiz etimológica no sentido de representar uma grande inversão, uma ruptura. Reviravoltas que significam calamidades, destruições, caos, drama.
Para o cinema, a representação de grandes catástrofes humanas se constituiu em um gênero específico, com algumas características e tipologias em comum. Ainda que a compreensão sobre os gêneros do cinema perpassa pela heterogeneidade dos mesmos, entendendo-os como não fechados, o “cinema catástrofe” é reconhecido enquanto gênero responsável pela representação de grandes tragédias, guerras, explosões, reviravoltas calamitosas e destrutivas.
Pensando em um corpus analítico que pretenda analisar os filmes catástrofe como objetos capazes de revelar sobre discursos e imaginários de uma sociedade, partimos da definição proposta pela filósofa Annie le Brun que coloca a catástrofe enquanto “um acontecimento que é, a um só tempo, ruptura e mudança de sentido e, por isso, pode ser tanto um começo como um fim. Em suma, um acontecimento decisivo que perturba a ordem do mundo, embora também possa levar a um outro mundo.” (p. 40). Assim, os filmes catástrofes que abordaremos sobre o contexto ressaltado, em diálogo com nosso filme objeto, lidam com uma especificidade de desastre que representam uma ameaça ao mundo e para a humanidade, colocando como possibilidade a sua destruição total, mas, em seu clímax final, levam à criação de um “novo mundo” e ao resgate dos seres humanos.
Essa estrutura narrativa da catástrofe é semelhante à narrativa religiosa cristã, particularmente ocidental, sobre o apocalipse (essa grande narrativa bíblica catastrófica). É dela, também, o grande anticlímax narrativo que indica uma destruição em massa do mundo e da humanidade para, após todos os episódios dramáticos e destrutivos ocorrerem, propor uma nova ordem, um novo mundo restaurado. E está presente, como pretendemos demonstrar e analisar, na estrutura narrativa cinematográfica do filme O Dia Depois do Amanhã.
De seu plot inicial, e do desenvolvimento discursivo sustentado durante toda a duração do filme, dedicamos nossa atenção para alguns pontos centrais: a permanência de um discurso escatológico cristão que evita uma destruição total tanto do mundo como da espécie humana; e a historicidade do gênero e o nosso olhar para o filme/objeto enquanto documento para a escrita da História.
Bibliografia
- ASIMOV, Isaac. Escolha a Catástrofe. São Paulo: Comp. Melhoramentos de São Paulo, 1980.
KELLNER, Douglas. Cinema Wars: Hollywood film and politics in the Bush-Cheney Era. Wiley-Blackwell, 2010.
KELLNER, Douglas. O apocalipse social no cinema contemporâneo de Hollywood. MATRIZes, 10(1), 13-28, 2016.
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LAGNY, Michèle. O cinema como fonte de História. In: NÓVOA, Jorge; FRESSATO, Soleni Biscouto; FEIGELSON, Kristian. Cinematógrafo: um olhar sobre a História. Salvador, São Paulo: EDUFBA/Editora UNESP, 2009.
SONTAG, Susan. A imaginação da catástrofe. In: Contra a interpretação: e outros ensaios. São Paulo: Companhia das Letras, 2020.
YACOWAR, Maurice. The Bug in the Rug: notes on the Disaster Genre. In: GRANT, Barry Keith (editor). Film Genre Reader III. Austin: University of Texas Press, 2003.