Ficha do Proponente
Proponente
- Gustavo de Souza Araujo (PPGCINE-UFF)
Minicurrículo
- Mestrando no Programa de Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense, o PPGCine-UFF. Estuda temporalidades no roteiro audiovisual através da percepção de ritmo e andamento prévios na escrita e como esses elementos impactam a relação roteiro-filme.
Ficha do Trabalho
Título
- Marcas de sensações de temporalidades na escrita do roteiro
Seminário
- Estudos de Roteiro e Escrita Audiovisual
Formato
- Presencial
Resumo
- Este estudo examina o roteiro de filmes brasileiros contemporâneos, com foco em marcas textuais de temporalidades e como elas são refletidas para a imagem em tela. Verbos e advérbios podem influenciar a interpretação da cadência de uma ação através do significado das palavras. Em Temporada (2018), de André N. Oliveira, buscamos dar continuidade às análises da pesquisa para compreender se o roteiro do longa antecipa sensações de ritmo em algumas cenas.
Resumo expandido
- Este trabalho faz parte de uma pesquisa que se dedica ao estudo do roteiro cinematográfico sob a perspectiva de suas temporalidades, como duração, andamento e velocidade. Além da “regra” da proporção de página por minuto de filme, propagada por manuais de roteiro (Field, 2001), o estudo aqui proposto busca encontrar na escrita das rubricas marcas que demonstram essa relação mediante outras perspectivas. David (2014) considera o roteiro um colaborador rítmico de um filme. Logo, ao confrontar o material escrito com a materialização visual, investigo como os elementos textuais influenciam a construção da temporalidade nessas imagens.
Em um primeiro momento, nota-se que no roteiro alguns advérbios de modo como lentamente e silenciosamente podem ajudar a especificar a dilatação de uma ação. Com os resultados encontrados, fica evidente que não é só a quantidade de palavras e espaço na folha que determinam a duração ou o ritmo. Embora esses dados objetivos possam contribuir para a cadência da leitura e para o tom da cena, as interpretações da temporalidade audiovisual inscritas no roteiro podem ser percebidas também através da semântica das palavras.
Ao pensar a temporalidade das palavras com a escrita, a fala e a gramática, relaciono os conceitos de tempo linguístico, do discurso e tempo verbal abordados por Nunes (2013). Na rubrica do roteiro, há uma convenção sobre o uso preferível dos verbos no presente do indicativo. Isso se dá, pois, a ação acontece no momento em que se lê/vê. Portanto, o uso do gerúndio não seria considerado apropriado, porque sugere continuidade ou ação em curso. Essa ideia é mais difundida em aulas teóricas do que observada no mercado e nos roteiros analisados ao longo da pesquisa.
Temporada (2018), dirigido e escrito por André Novais Oliveira, é um dos objetos do estudo. Seu roteiro analisado é o último tratamento, publicado no livro “Roteiro e diário de produção de um filme chamado Temporada”. O longa mergulha no cotidiano de Juliana (Grace Passô) uma mulher que se muda para Contagem/MG, por conta de um novo emprego no combate a endemias. A trama retrata mudanças pessoais da personagem, uma reflexão sobre seu casamento, a perda de uma filha e a reconstrução de relações familiares e sociais.
O autor do filme incorpora uma narrativa em estilo naturalista, com elementos que criam um vínculo com o público ao destacar situações comuns e triviais da vida; como em algumas das cenas analisadas que vemos a andança das personagens, muitas vezes em silêncio, pelas ruas da cidade. A força dessas imagens reside nos planos contemplativos, geralmente abertos e com poucos movimentos de câmera, que são para Flanagan (2018) e Cuff (2017) fatores que contribuem para percepções de lentidão.
Diferente de Unicórnio (2017) de Eduardo Nunes, o filme discutido antes, Temporada apresenta mais diálogos e menos cenas longas, embora a lentidão seja perceptível; o que pode ser atribuído à sensação subjetiva da duração (Monteiro, 2017). Os diálogos têm um impacto significativo no tempo dramático da cena, como destaca Doc Comparato (2018). Assim, as falas são um dos fatores verificáveis dessas construções rítmicas.
Ao comparar o filme escrito e o filme de imagens em movimento, busca-se identificar elementos textuais que influenciam a temporalidade além das páginas. A fim de analisar essas unidades, um ponto de partida está em uma afirmação de Benedito Nunes de que a duração depende de duas medidas: “uma espacial, a do texto, medida em linhas e páginas, outra temporal, a da história, medida em segundos, minutos, horas, etc.” (Nunes, 2013).
Em primeiro lugar, como instrumento de análise, será utilizada uma tabela com os dados de duração de cada cena, para verificar a relação inicial entre número de páginas e tempo em tela. No roteiro será procurada as marcas presentes na gramática do texto, o espaço/tempo da cena e verbos de ação na rubrica. Em segundo lugar, a análise se aprofundará na subjetividade temporal das cenas escolhidas.
Bibliografia
- COMPARATO, Doc. Da criação ao roteiro: teoria e prática. Doc Comparato. 5ª ed. – São Paulo: Summus, 2018.
CUFF, Paul. The Cinema as Time Machine: Temporality and Duration in the Films of Abel Gance. Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 4, n. 2, p. 353-374, 2017.
DAVID, Ian. Screenwriting and emotional rhythm. Journal of Screenwriting, v. 5, n. 1, p. 47-57, 2014.
FIELD, Syd. Manual do roteiro. São Paulo: Editora Objetiva, 2001.
FLANAGAN, Matthew. “’Slow Cinema’: Temporality and Style in Contemporary Art and Experimental Film”. (Tese de doutorado). Exeter, University of Exeter, 2012.
MONTEIRO, Lúcia Ramos. “O cinema existe e resiste. Longa duração, análise fílmica e espectatorialidade nos filmes de Lav Diaz”. Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 4, p. 434-455, 2017.
NUNES, Benedito. O Tempo na Narrativa. São Paulo: Edições Loyola, 2013
OLIVEIRA, André N. Roteiro e diário de produção de um filme chamado Temporada. Belo Horizonte: Javali, 2021.