Ficha do Proponente
Proponente
- Gabriel Philippini Ferreira Borges da Silva (Unespar)
Minicurrículo
- Gabriel Philippini Ferreira Borges da Silva é bacharel em Cinema e Audiovisual pela Universidade Estadual do Paraná (Unespar) – Campus de Curitiba II, mestrando do Programa de Pós-Graduação/Mestrado Acadêmico em Cinema e Artes do Vídeo (PPG-CINEAV) da Unespar, vinculado à linha de pesquisa: Processos de Criação no Cinema e nas Artes do Vídeo, membro do Grupo de Pesquisa CineCriare/ Cinema: criação e reflexão (Unespar/PPG-CINEAV/CNPq) e atua como curador e montador de cinema.
Ficha do Trabalho
Título
- De 1973 à 1993: David Neves em descompasso de Cinema Novo
Seminário
- Cinema no Brasil: a história, a escrita da história e as estratégias de sobrevivência
Formato
- Presencial
Resumo
- O crítico-cineasta David Neves iniciou sua trajetória junto ao Cinema Novo Brasileiro, colaborando com escritos e filmes presentes no cânone do movimento. Porém, a partir dos anos 1970, o crítico-cineasta demonstrou divergências com os rumos e escolhas de alguns dos principais quadros cinemanovistas. Nesta comunicação, com base em suas críticas, relatos e nos longas-metragens que dirigiu, desenvolvemos uma análise do posicionamento de David Neves durante os anos de crepúsculo do movimento.
Resumo expandido
- Desde o início de sua trajetória no cinema no final da década de 1950, David Neves se articulou junto aos principais quadros do Cinema Novo Brasileiro e, junto aos colegas, nas discussões dos cineclubes, nos bares e nos laboratórios, Neves participou da formulação do movimento. Crítico-cineasta de realização tardia, sua participação no grupo concentrou-se, em seus primeiros anos, na crítica, na diplomacia, na amizade, na participação – em funções de assistência – da produção de filmes e na organização de mostras mundo afora.
Contudo, quando passou à direção, Neves desenvolveu um projeto estético autônomo (PINTO, 2020), com a realização de interesses estilísticos diversos aos que demonstravam, àquele momento, os principais diretores do movimento. Em filmes e textos mais dedicados às coisas do que “às ideias” (NEVES, 2004, p. 319), Neves manifestou seu interesse pelo detalhe e o particular, em oposição ao que percebia em um cinema brasileiro tomado por uma “constante que tem sido a visão de conjunto, o mural” (ibidem).
A divergência de Neves foi acirrada nos anos 1970, após o auge do Cinema Novo. Com os novos desafios de produção da época, Neves publicou, em 1973, um texto que julgamos seminal dessa perspectiva. No artigo – de título posteriormente atribuído por Carlos Augusto Calil: Idiotas da Subjetividade – mesmo mantendo a reverência àquelas personalidades cuja obra admirava, o cineasta critica a influência de José Celso e Glauber Rocha para o cinema brasileiro produzido entre 1964 e 1971, dizendo que: “essas influências desvirtuam o cinema, solenizam em excesso o relacionamento do autor com o filme” (idem, p. 226). Com seu característico tom ameno, o crítico conclamava uma nova escola, que deixasse a atenção excessiva à objetividade e cedesse à subjetividade contra a “despersonalização” (idem, p. 225) do cinema.
A partir de 1978, a crítica de Neves se tornou ainda mais dura contra o desenvolvimento de um cinema baseado nas fórmulas de sucesso de Xica da Silva e Dona Flor e Seus Dois Maridos, durante os anos de estabelecimento da Embrafilme. Em textos publicados entre 1978 e 1981, como “Vale quanto pesa, ou: não compre gato por lebre”; “A Lua Vista da Terra” e “Cinema-Novo rico, Cinema Novo-rico”, Neves demanda deste cinema, que se tornava cada dia mais caro, “um esforço maior de concepção” (idem, p. 241).
Em paralelo a esta defesa crítica, Neves voltava a se movimentar para a realização (em 1979 dirige Muito Prazer, seu terceiro longa-metragem, após um hiato de quase dez anos) e começava a se relacionar e produzir filmes com um grupo de jovens realizadores como Carlos Moletta, Joaquim Vaz de Carvalho, Jom Tob Azulay e Paulo Thiago.
Nesta comunicação, apresentamos este panorama e a análise do posicionamento de Neves a partir ao estudo de entrevistas, relatos e notas deixados por Neves e seus colegas de realização, reunidos em catálogo de mostra (BRITO, FERREIRA, 2015) e livros autorais (NEVES, 1993; NEVES, 2004) do crítico-cineasta. Além das fontes textuais, somamos às referências a análise fílmica de cenas dos longas-metragens de Neves que parecem demonstrar sua divergência de posicionamento às grandes produções “despersonalizadas” da época.
Encontramos, assim, o retrato de um cineasta cinemanovista que, nos anos 70, autonomiza seu projeto estético e “cria um universo próprio” (PINTO, 2020) de outras relações. Como ainda registra nos relatos de seu livro Cartas do Meu Bar: “Os outros, da minha turma, inventaram o trabalho quando ele se tornou escasso. Mantenho a noção lamentável de que não fui com eles (…) Preguiça, hoje, de ver filmes de outros companheiros. Sensação da recíproca, para liberar a minha consciência” (NEVES, 1993, p. 43).
Apesar de ainda contar com a presença de velhos amigos em seus filmes e acompanhar algumas das ideias do movimento, Neves parece caminhar – como outros de seus colegas já desagregados das vitrines do movimento coletivo – em descompasso de Cinema Novo.
Bibliografia
- AUTRAN, Arthur. O pensamento industrial cinematográfico brasileiro. São Paulo: Hucitec, 2013.
BERNARDET, Jean-Claude. Cinema brasileiro: propostas para uma história. São Paulo: Companhia das Letras, 2009
BRITO, T.; FERREIRA, P. H. Paisagens do Rio de Janeiro: A poética de David Neves. Rio de Janeiro. Caixa Cultural. 2015.
NEVES, D. E. Cartas do meu bar. São Paulo: Editora 34, 1993.
NEVES, D. E. Telégrafo visual: crítica amável de cinema. Org: Carlos Augusto Khalil. São Paulo: Editora 34, 2004.
PINTO, P. David Neves: projetos de vida e autonomia do crítico-cineasta. Intexto, v. 48, p. 194-211, jan./abril. 2020.
VIANY, A. O Processo do Cinema Novo. Org. José Carlos Avellar. Rio de Janeiro: Aeroplano, 1999.