Ficha do Proponente
Proponente
- Guilherme Gonçalves da Luz (UFRGS)
Minicurrículo
- Pós-doutorando em Comunicação no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFRGS, Mestre e Doutor pelo mesmo Programa. Integrante do Grupo de Pesquisa Semiótica e Culturas da Comunicação (GPESC) e do Grupo de Pesquisa Agenciamentos da Imagem (GPAGI). Coordenador de Comunicação da Secretaria de Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Coordenador do Programa EPEC Laboratório de Mídias Indígenas (LAMINDI FURG).
Coautor
- Karol Souza Garcia (UFC)
Ficha do Trabalho
Título
- Heterotopias queer em Querelle (1982) e Inferninho (2018)
Formato
- Presencial
Resumo
- Propomos observar e tipificar, nos filmes Querelle (1982), de Rainer Fassbinder e Inferninho (2018), de Pedro Diógenes e Guto Parente, o que chamamos de heterotopias queer: espacialidades contra-hegemônicas que produzem mundos próprios erigidos pela conjugação entre a atuação de personagens queer como “performance de reivindicação política” (MARCONI, 2021, p. 77) e a heterogeneidade das relações que se constituem na topologia deste sistema de signos (MACHADO, 2010).
Resumo expandido
- Propomos observar e tipificar, nos filmes estudados, o que chamamos de heterotopias queer: espacialidades contra-hegemônicas que produzem mundos próprios erigidos pela conjugação entre a atuação de personagens queer como “performance de reivindicação política” (MARCONI, 2021, p. 77) e a heterogeneidade das relações que se constituem na topologia deste sistema de signos (MACHADO, 2010). Michel Foucault (2013) diz ser impossível viver sob o nada. Segundo o autor, é preciso haver uma variedade de espaços e lugares feitos para serem habitados. Há lugares que emparedam os corpos em lógicas distributivas regidas por regimes disciplinares e biopolíticos (o Estado, a família, o Capital, o Patriarcado, as instituições), e conjugam um mundo normatizado, que relega corpos não conformados a estados residuais. Ainda de acordo com o autor, há lugares absolutamente alheios a todos esses, eles “são como que contraespaços”, atuando como “lugares reais fora de todos os lugares” (p. 20). O estudo de tal categoria é importante porque os espaços são elementos fundamentais das relações de poder. Metodologicamente, separamos nossa reflexão em três partes: I – a análise de elementos formais e temáticos dos filmes que se relacionem com o conceito acima; II – a tipificação das heterotopias nas obras estudadas e III – a descrição do modo como elas denunciam, junto à construção de seus espaços, as relações de poder as quais corpos não normativos estão implicados. O filme Querelle (1982), de Rainer Fassbinder, se passa inteiramente em um porto e compõe o que chamamos de uma heterotopia de passagens, um lugar cujas ocupações transitórias e as relações frágeis produzem uma espacialidade apartada das lógicas heteronormativas que disciplinam os corpos de marinheiros. É nesse jogo de instabilidades que Querelle (1982) explora, através do espaço, o desejo em seus múltiplos arranjos. Inferninho (2018), de Pedro Diógenes e Guto Parente, descreve e nomeia um bar administrado pela travesti Deusimar. Trata-se, sem dúvida, de um topos que se produz por uma diversidade de tipos quase inclassificável, mas há, neste espaço, uma espécie de força centrípeta que impede as personagens de saírem dali, engendrando uma heterotopia de eterno retorno que condena a heterogeneidade a repetição do mesmo. Paul Preciado (2018) diz que no fim da década de 1980 um grupo de “sapatonas, bichas, drags, transgêneros e transexuais”, espalhados pelos Estados Unidos, “reagiu às chamadas políticas de identidade gays e lésbicas e suas demandas de integração na sociedade heterossexual” e tornou as ruas espaços de “teatralização de raiva política” (p. 253). Tal ação gerou atos performativos cada vez mais hiperbólicos. A carnavalização do espaço público o desloca de sua finalidade primeira e o dispõe como uma heterotopia das relações, dos modos de devir outro através dos travestimementos, das máscaras, da multiplicidade inapreensível que se entranha nos portos, nos becos, nas esquinas. Entendemos que os espaços heterotópicos “não refletem a estrutura social nem a da produção, não são um sistema sócio-histórico nem uma ideologia” (FOUCAULT, 2013, p. 38), mas rupturas da vida ordinária que criam, no jogo próprio de suas constituições, “zonas autônomas temporárias” (GUATTARI, 1985), cuja função é a produção de territórios de significação (DELEUZE, GUATTARRI, 2012) queer.
Bibliografia
- DELEUZE, G; GUATTARI, F. Mil Platôs, vol.4. São Paulo: Editora 34, 2012.
FOUCAULT, M. O Corpo Utópico e as Heterotopias. São Paulo: N-1, 2013.
GUATTATI, F. Revolução Molecular: pulsações políticas do desejo. Brasília: Brasiliense, 1981.
MACHADO, I. A questão espaço-temporal em Bakhtin: cronotopia e exotopia. in Círculo de Bakhtin: Teoria Inclassificável. Campinas: Mercado de Letras, 2010.
MARCONI, D. Ensaios sobre autoria queer no cinema brasileiro contemporâneo. Belo Horizonte: UFMG, 2021.
PRECIADO, P. Testo Junkie: Sexo Drogas e Biopolitica na era Farmacipornografica. São Paulo: N-1, 2018.