Ficha do Proponente
Proponente
- Fabio Allan Mendes Ramalho (UNILA)
Minicurrículo
- Professor adjunto na Universidade Federal da Integração Latino-Americana, atua no bacharelado em Cinema e Audiovisual e no Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Estudos Latino-Americanos. Doutor em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco (2014) e mestre pela mesma instituição (2009). Membro do coletivo de realização audiovisual Surto & Deslumbramento. E-mail: fabio.ramalho@unila.edu.br
Ficha do Trabalho
Título
- Formas da dissociação em Carnival of souls e La mujer sin cabeza
Seminário
- Cinema Comparado
Formato
- Presencial
Resumo
- Nesta comunicação, proponho discutir as ressonâncias que se estabelecem entre Carnival of souls (Herk Harvey, 1962) e La mujer sin cabeza (Lucrecia Martel, 2008), atribuindo ênfase às estratégias fílmicas empregadas para dar forma a certo senso de descompasso e mal-estar que permeia tais obras. A noção de dissociação surge como aposta para elaborar as fissuras nos modos como as figuras em cena se situam em relação ao universo sensível no qual se movem.
Resumo expandido
- O filme de horror Carnival of souls (Herk Harvey, 1962) elabora esteticamente o senso de desconexão espaço-temporal experimentado pela protagonista após um traumático acidente de carro do qual, sugere-se inicialmente, ela teria sido a única sobrevivente. A partir daí, o filme se instaura numa espécie de zona contígua entre vida e morte, e as inquietantes visões que passam a povoar os dias da personagem suscitam a elaboração de uma experiência de liminaridade. Em La mujer sin cabeza (Lucrecia Martel, 2008), por sua vez, o choque do contato — condensado no incidente inicial na estrada — e as dinâmicas de sociabilidade se colocam como elementos desencadeadores de um modo súbito de estranhamento e senso de alienação.
Ao rever o filme de Harvey, o jogo de ressonâncias que se estabelece entre as duas obras sobressaiu e me inquietou, provocando o interesse em uma análise em perspectiva comparada. Cabe assinalar que a relação entre os filmes já foi apontada antes, em primeiro lugar pela própria Lucrecia Martel (BARRENHA, 2012), mas também por diferentes estudiosos da obra da realizadora argentina – além de Barrenha, essa aproximação é mencionada em D’Alessandro (2021) e Rubino (2015), dentre outros. Destaco ainda o exercício realizado pela pesquisadora britânica Catherine Grant, que, motivada pela declaração de Martel, lançou-se a uma investigação a respeito das correspondências formais e narrativas entre ambas as obras, em um videoensaio intitulado The Haunting of The Headless Woman (2019). Nesta comunicação, pretendo retomar as potencialidades abertas por esse conjunto de obras (os longas de Harvey e Martel e também a proposição crítica de Grant), guiado por um conjunto de interrogantes: que exercícios de experimentação com as espacialidades e temporalidades do cinema tais filmes nos permitem vislumbrar? Como essas obras conseguem plasmar em sua materialidade aspectos de certo modo intangíveis que perpassam diferentes experiências de desajuste ou descompasso em relação ao mundo?
O termo dissociação surge como uma aposta ou pista para elaborar essas fissuras nos modos como as figuras em cena se situam em relação à ordem social. Pretendo esboçar uma maneira de entender esse termo que, embora preservando um sentido de desconexão em relação à realidade circundante na qual se movem as protagonistas, ainda assim busca se afastar de qualquer concepção psicologizante, seja da personagem em cena, seja do próprio discurso audiovisual (BUTLER; PALESH, 2004). Em vez disso, interessa-me assumir uma perspectiva centrada na estética do cinema, compreendida como articulação de elementos sensíveis diversos que, juntos, compõem a materialidade das obras e engendram, a partir dela, o que poderíamos chamar de “sensível cinematográfico” (CHATEAU, 2019, p. 18). Com isso, busco pensar os universos singulares que os filmes constituem — as relações, lógicas e dinâmicas internas que os governam — como dispositivos que delineiam sensibilidades e, portanto, como convites para explorarmos maneiras de estar no mundo, incluindo-se aí diferentes expressões de mal-estar.
Bibliografia
- BARRENHA, Natalia Christofoletti. “La mujer sin cabeza (Lucrecia Martel, 2008) y el mecanismo del olvido en el pasado y el presente”. Revista Comunicación, N. 10, Vol.1, p. 643-652, 2012.
BELLOUR, Raymond. El cuerpo del cine: hipnosis, emociones, animalidades. Santander: Shangrila Textos Aparte, 2013.
BUTLER, Lisa D.; PALESH, Oxana. Spellbound: Dissociation in the Movies, Journal of Trauma & Dissociation, 5:2, 2004, p. 61-87.
CHATEAU, Dominique. Estética del cine. Buenos Aires: La Marca Editora, 2019.
D’ALESSANDRO, Natalia. Lo siniestro en la representación de espacios provinciales. Question/Cuestión, n. 69, Vol. 3, p. 1-17, agosto 2021.
RUBINO, Atilio Raúl. Terror y sexualidad: lo ominoso en el cine de Lucrecia Martel. HeLix (7), p. 71-87, 2015.