Ficha do Proponente
Proponente
- Guilherme Henrique Pereira Mariano (UFS)
Minicurrículo
- Graduado (DCOS) em Cinema e Audiovisual e mestre (PPGCINE) em Cinema e Narrativas Socias pela Universidade Federal de Sergipe, com interesse especial pela expressividade do cinema de fluxo, tanto teórico, ao desenvolver a dissertação “A metafísica da noite no cinema de fluxo: a intuição do devir material nas paisagens durativas”, quanto prático, ao dirigir, roteirizar e produzir o curta-metragem O gato (2018).
Ficha do Trabalho
Título
- Do romantismo ao cinema de fluxo: a construção das paisagens durativas
Formato
- Presencial
Resumo
- Pretendemos apresentar as mudanças na representação da paisagem nas imagens artísticas, a partir de seu estabelecimento como um tema legítimo no romantismo pictórico até o realismo sensório do cinema de fluxo, propondo, assim, o conceito de “paisagens durativas” para traduzir um novo estágio da relação entre os espectadores e as paisagens de filmes como Sábado à noite (2007), em que experienciamos uma intuição que dissolve os limites materiais entre os corpos, as paisagens e o próprio filme.
Resumo expandido
- Para o olhar de nossa época, o valor artístico de uma paisagem parece óbvio. No entanto, a paisagem como um tema central para as artes possui uma trajetória construída em confluência com os ideias imagéticos da sociedade. E, tal qual estes ideais, os modos de representação da natureza ao nosso redor passam por uma constante transformação, fazendo da reflexão paisagística uma eficiente ferramenta de compreensão dos possíveis rumos da nossa relação com as imagens artísticas. Sendo assim, esta proposta de comunicação individual pretende apresentar as mudanças na representação da paisagem, a partir de seu estabelecimento como um tema artístico legítimo no romantismo pictórico, como nos aponta Gombrich (2011, p. 491-492), até o cinema de fluxo – representado aqui pela obra Sábado à noite (2007), de Ivo Lopes Araújo – e sua exploração sensória da materialidade do mundo, onde vemos comumente um nível “gasoso” e “invisível” da imagem sendo apontado pela teoria e crítica cinematográfica contemporâneas (Silva, 2009 apud Vieira Jr., 2020, p. 38). Iniciaremos, então, com os românticos que, inspirados pela busca da essência humana na natureza, deram início ao processo de mobilização do olhar, que agora ansiava pelo encontro com um mundo que já estava dado fora da pura idealidade do ateliê, ainda que esse olhar continuasse refém dos preceitos racionais da pintura clássica ao se expressar através dos simbolismos das “paisagens textuais” (Aumont, 2004, p. 48-51). Após, veremos os impressionistas continuarem esse desejo pela mobilidade e se entregarem ainda mais a ele, iniciando uma busca pela representação imediata da pulsação do mundo diante de seus olhos, fazendo com que o corpo do artista agora fosse ao encontro dos estímulos – o objetivo agora era transmitir o fugidio da realidade que se apresentava aos seus sentidos, a efemeridade da constante fluidez dos cenários que lhes serviam de motivo, o que fez da “natureza qualquer” interessante por sua pura existência (p. 49). Foi esse espírito impressionista que habitava Lumière na criação de seu cinematógrafo e de suas “vistas”, fazendo com que a natureza qualquer ganhasse movimento e se atualizasse nos “espaços quaisquer” identificados por Deleuze (2018, p. 173-174), que desde então tiveram suas abundantes potencialidades exploradas como a principal matéria-prima por aqueles cineastas que preteriram a hegemonia do “olhar consciente” em lugar do “olhar sobre um certo aspecto do mundo” (Aumont, 2000 apud Oliveira Jr., 2010, p. 120). Enfim, chegaremos na década de 80, onde se observou uma concentração crescente de cineastas que fizeram surgir uma tendência estética, o cinema de fluxo, em reação ao hiper-racionalismo maneirista que estava se estabelecendo (p. 72-83), em que a materialidade ao redor fora estendida a novos contornos, desvelando um outro estágio da relação com a espacialidade em nosso entorno que propusemos chamar, na dissertação A metafísica da noite no cinema de fluxo (Mariano, 2023), de “paisagens durativas”. Este conceito, concebido a partir das ideias de intuição e duração de Bergson (1999), surge como tradução desse novo estágio ocupado pela natureza no cinema deste início de séc. XXI, em que experienciamos não apenas uma representação da materialidade ao nosso redor, mas uma presentificação (Gumbrecht, 2010) dessas paisagens através das complexas relações corporais que se estabelecem entre o corpo do espectador, os corpos em tela e o corpo do filme (Sobchack, 1992) – assim, defenderemos, com o auxílio do filme Sábado à noite, uma experiência intuitiva de dissolução dos limites materiais entre os corpos (em cena e espectatoriais), a câmera e as paisagens urbanas apresentadas pela obra.
Bibliografia
- AUMONT, J. O olho interminável: cinema e pintura. São Paulo: Cosac Naify, 2004.
BERGSON, H. Matéria e memória. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
DELEUZE, G. Cinema 1 – A imagem-movimento. São Paulo: Editora 34, 2018.
GOMBRICH, E. H. A história da arte. Rio de Janeiro: LTC, 2011.
GUMBRECHT, H. U. Produção de presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC-Rio, 2010.
MARIANO, G. H. P. A metafísica da noite no cinema de fluxo: a intuição do devir material nas paisagens durativas. Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Cinema, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2023.
OLIVEIRA JR., L. C. O cinema de fluxo e a mise en scène. Escola de Comunicações e Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
VIEIRA JR., E. Realismo sensório no cinema contemporâneo. Vitória: EDUFES, 2020.
SOBCHACK, V. The address of the eye: a phenomenology of film experience. New Jersey: Princeton University Press, 1992.