Ficha do Proponente
Proponente
- Cauê Ueda (PPGMPA-ECA-USP)
Minicurrículo
- Cauê Ueda é mestrando no Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da ECA-USP, onde pesquisa aspectos sonoros presentes em obras do cinema silencioso. Profissionalmente atua como produtor executivo na Tamago e como artista audiovisual independente.
Ficha do Trabalho
Título
- O som das obras silenciosas de Humberto Mauro
Seminário
- Estilo e som no audiovisual
Formato
- Presencial
Resumo
- Através da análise de quatro exemplares da fase silenciosa do diretor Humberto Mauro – Tesouro perdido (1927), Braza dormida (1928), Sangue mineiro (1929) e Lábios sem beijos (1930) –, abordaremos mecanismos de linguagem que remetem a ideia de som por meio da imagem e como o diretor imprimia um sentido poético neste tratamento.
Resumo expandido
- Profícuo realizador desde o início de sua carreira, Humberto Mauro produziu cinco longas-metragens silenciosos. Datada de 1926, Na primavera da vida é a primeira destas obras, da qual restaram apenas relatos e alguns poucos fotogramas. Gomes (1974) indica que tratou-se de uma espécie de ensaio para os demais filmes que Mauro viria a realizar. É sobre tais obras, desenvolvidas e lançadas ao longo de quatro anos, que esta comunicação se debruça: Tesouro perdido (1927), Braza dormida (1928), Sangue mineiro (1929) e Lábios sem beijos (1930). Ao observar o arco de amadurecimento do diretor, notamos que não há somente um refinamento da decupagem utilizada nestes filmes, mas também dos aspectos audiovisuais, onde o som, ainda que não soe fisicamente para o espectador, faz-se presente.
Abarcando paralelismos de entendimento para nos afastarmos de generalizações sobre a produção da época, na qual poderíamos entender que o cinema nunca fora realmente silencioso (BERNARDET, 1981) ou que haveriam, sim, exibições realizadas em pleno silêncio (ALTMAN, 2004), encontramos em um mínimo denominador comum uma evidência de que tais fitas não dependiam efetivamente de um suporte sonoro para a compreensão de seus enredos. Havendo ou não música performada ao vivo ou atores atrás da tela declamando linhas de texto, os filmes se explicavam por si próprios, ocupando-se somente com o que era exibido em quadro.
As razões recairiam tanto sobre questões de ordem tecnológica e econômica acerca da dificuldade na sincronização entre som e imagem, como também de uma certa afiliação de que caberia ao cinema ser uma arte essencialmente silenciosa, sem necessidade alguma da presença do som audível e sincrônico na exibição (ARNHEIM apud SZALOKY, 2002). Ainda assim, temos o entendimento de que essa manifestação pode emergir da imagem cinematográfica a partir de uma sugestão, tal qual ocorre em outras artes (CHION, 2009), cabendo, inclusive, o entendimento de que o cinema abriga o som desde sua gênese (MANZANO, 2003).
Alguns realizadores perceberam tal potencialidade e foram além de uma mera ocorrência sonora discreta, ora proporcionada pela ação de uma personagem ou por uma ambientação característica de uma cena, utilizando o que está implícito na imagem para estimular e agregar novos elementos ao enredo. Por meio de uma gramática provida de expedientes de linguagem, tais ideias sonoras poderiam prover, por exemplo, interessantes pontos de virada na história.
De forma diversa a maioria das obras nacionais da época disponíveis para análise nos dias de hoje, percebemos que Mauro não somente recorreu a essas estratégias narrativas, como também operou estímulos aurais para criar uma nova instância em seus filmes, em especial nas sequências idílicas que vivenciam suas personagens principais. Recorrendo a elementos sonoros cenográficos, tais como música e ruídos de ambiente, o diretor habilitou um caráter lírico em suas cenas, ativando emoção e sentimentos, e, inclusive, aludindo a possíveis sonoridades em uma exibição silenciosa.
A abordagem dessas quatro obras passa pela técnica de “análise narrativa” e por questionar “o que ouço do que vejo” (CHION, 1994), formas preliminares de observação. Para além das constatações do relacionamento entre imagem e som, também serão elencados expedientes narrativos empregados e quais as implicações oferecidas no andamento do enredo dessas fitas (ALVIM, CARREIRO, 2016; CHION, 2009). Por fim, cabe uma leitura contextualizada da composição entre a decupagem e a contextualização das situações onde a poesia aflora da imagem a partir do impulsionamento de uma noção sonora.
Bibliografia
- ALTMAN, R. Silent film sound. New York: Columbia University Press, 2004.
ALVIM, L.; CARREIRO, R. Uma questão de método: notas sobre a análise de som e música no cinema. Matrizes, v. 10, n. 2, p. 175–193, 2016.
BERNARDET, J.-C. O som do cinema brasileiro. Filme Cultura, v. XIV, n. 37, p. 2–7, 1981.
CHION, M. Audio-vision: sound on screen. New York: Columbia University Press, 1994.
CHION, M. Film, a sound art. New York: Columbia University Press, 2009.
COSTA, F. M. DA. O som no cinema brasileiro: revisão de uma importância indeferida. Tese de doutorado—Rio de Janeiro: Universidade Federal Fluminense, 2006.
GOMES, P. E. S. Humberto Mauro, Cataguases, Cinearte. São Paulo: Perspectiva, 1974.
MANZANO, L. A. F. Som-imagem no cinema: a experiência alemã de Fritz Lang. São Paulo: Perspectiva, FAPESP, 2003.
SZALOKY, M. Sounding images in silent film: visual acoustics in Murnau’s “Sunrise”. Cinema Journal, v. 41, n. 2, p. 109–131, Winter 2002.