Ficha do Proponente
Proponente
- Paula Mermelstein Costa (UFJF)
Minicurrículo
- Paula Mermelstein Costa é crítica de arte e pesquisadora. É atualmente professora substituta de artes visuais na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). É mestra em Artes Visuais pela Universidade de São Paulo (USP), com uma dissertação sobre pintura contemporânea, e bacharel em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Desde 2020, co-edita a Revista Limite, publicação online de crítica de cinema e arte.
Ficha do Trabalho
Título
- James Benning: arte conceitual e experiência empírica
Formato
- Presencial
Resumo
- Investiga-se, aqui, a natureza dual de grande parte dos filmes de James Benning, a partir das relações que estabelece com procedimentos da arte conceitual e do cinema estrutural, e conexões com obras de outros artistas como Andy Warhol e Ed Ruscha. Embora fundamentados em disposições seriais de imagens e jogos com palavras, os filmes de Benning pedem um comportamento quase contrário por parte do espectador; um olhar atento às particularidades de cada imagem e uma experiência empírica.
Resumo expandido
- Procedimentos artísticos conceituais vão muito além do número restrito de obras que de fato se intitulam “arte conceitual”, movimento que ganhou força nas décadas de 1960 e 70. Sua influência se alastra em diferentes variações, em diferentes épocas, encontrando mesmo diferentes origens – os readymades de Marcel Duchamp no início do século são frequentemente considerados precursores do que estava por vir. “Procurar uma definição universalmente válida de “arte conceitual” é inútil,” como afirma a crítica e historiadora alemã Isabelle Graw, para quem as premissas do conceitualismo seriam um aspecto primordial da arte contemporânea, a serem utilizadas enquanto procedimentos de obras diversas, e não apenas um rótulo generalizante (2010, p.195).
Ainda que relações entre a arte conceitual e o cinema estrutural do mesmo período tenham sido traçadas, a obra de James Benning não se encaixa plenamente em nenhum dos dois âmbitos, mas observa a recorrência de alguns de seus mesmos mecanismos. Parece ser, por exemplo, a partir de um procedimento conceitual, que o cineasta experimental nomeia seus filmes de 10 Céus, 13 Lagos, 20 Cigarros, 4 Poços de Petróleo ou 2 Cabanas – todos produzidos entre as décadas de 1970 e 2010.
Os títulos nos remetem a trabalhos de outros artistas, especialmente a certas obras de Andy Warhol e Ed Ruscha feitas na década de 1960, que também não são necessariamente inseridas dentro da arte conceitual enquanto movimento mas com certeza dialogam com seus preceitos. É de forma semelhante à Benning, afinal, que Warhol irá enumerar produtos ou celebridades em trabalhos como 32 Latas de Sopa Campbell, 9 Marilyns, 16 Jackies, 8 Elvises e 13 Homens mais Procurados. Os números, aqui, são tão arbitrários quanto específicos, como se escolhidos por uma máquina – é conhecida a afirmação de Warhol quanto a “querer ser uma máquina”.
Encontramos o recurso também nos foto-livros do artista Ed Ruscha, intitulados 26 Postos de gasolina, 34 Estacionamentos, 9 Piscinas. Ruscha justifica sua escolha da seguinte forma: “O primeiro livro veio de um jogo de palavras. O título veio antes de eu sequer pensar nas imagens. Eu gosto da palavra “gasolina” e eu gosto da qualidade específica de “vinte e seis”.” (2018) As fotografias em si, presentes em cada livro, não se destacam muito esteticamente. Parecem, inclusive, emular um amadorismo. O que importa, aqui, é o conjunto, a listagem, e mais ainda o gesto por trás da feitura do livro, a atenção voltada à algo tão arbitrário quanto específico. Aquelas que eram antes consideradas as virtudes de um artista, a escolha de temas, o trabalho com o material, são de certa forma desprezadas ao tornarem-se consequência em um ato lúdico, performático, e mesmo readymade (c.f. Iversen).
As relações da filmografia de Benning com as obras dos dois artistas vai além; com os filmes de Warhol, por muitos considerado precursor do cinema estrutural, vai compartilhar as longas durações, enquanto com as obras de Ruscha, a predileção por registrar lugares que poderiam ser considerados pouco atraentes, cenários urbanos ou industriais. Os filmes de Benning mencionados anteriormente apresentam lagos, pessoas fumando cigarros ou poços de petróleo com os típicos planos longos e estáticos do cineasta, aos quais o próprio já se referiu como “stills com tempo” (2022). Se até aqui a relação entre número/palavra e tema tinha algo de readymade, a situação muda por completo com o acréscimo do tempo. A atenção que até então direcionava-se ao conceito, ao jogo, se volta ao corpo do espectador, e ao seu olhar. Como em certos filmes do cinema estrutural, “somos também deixados sozinhos em nossa própria experiência da duração, do não acontecimento, em que o filme ao qual estamos assistindo e o nosso próprio ato de ver encontram-se” (Mourão, Duarte, 2015). A duração dos planos de Benning, afinal, não permite que apenas “viremos a página”, ela exige uma experiência empírica.
Bibliografia
- Alberro, Alexander. Buchmann, Sabeth (Orgs.). Art After Conceptual Art. Cambridge: MIT Press, 2006.
Benning, James. Conversa com James Benning. Revista Limite, n.8, novembro, 2022. Disponível em: https://limiterevista.com/2022/11/12/conversa-com-james-benning/
Graw, Isabelle. Expressão conceitual. Trad. Analu Cunha e Daniel Lannes. Revista Arte & Ensaios, Rio de Janeiro, v.20, n.20, pp.194-209, julho, 2010. Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/ae/article/view/51567.
Iversen, Margaret. Auto-Maticity: Ruscha and Performative Photography. Art History, vol. 32, no.5, 2009: 836-851.
Michelson, Annette (Org.). Andy Warhol (October Files). Cambridge: The MIT Press, 2001.
Mourão, Patrícia; Duarte, Theo (orgs). Cinema estrutural. Aroeira, 2015.
Ruscha, Ed. “Ed Ruscha and the Art of the Everyday”. Tate Org, 2018. Disponível em: https://www.tate.org.uk/art/artists/edward-ruscha-1882/ed-ruscha-and-art-everyday.