Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Esther Hamburger (USP)

Minicurrículo

    Professora Titular do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão e do Programa de Pós-Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da ECA, USP. Bolsista 1D do CNPq, pesquisadora do Laica. Doutora em Antropologia pela Universidade de Chicago, pesquisadora visitante no DRCLAS da Universidade de Harvard e bolsista Tinker no Departamento de Cinema/ ILAS da Universidade de Columbia. Essa apresentação é um desdobramento de pesquisa sobre Fábula de Arne Sucksdorff.

Coautor

    Letícia Xavier de Lemos Capanema (UFMT)

Ficha do Trabalho

Título

    O making off de um filme nunca feito: Sucksdorff em Um mundo à parte

Mesa

    Cinema no Pantanal

Formato

    Presencial

Resumo

    A convite do Itamaraty e da UNESCO, o cineasta sueco Arne Sucksdorff chega ao Rio de Janeiro em 1962 para ministrar um curso para cineastas engajados no projeto do Cinema Novo. Após, realizou o longa Fábula em 1965. Em 1967, iniciou filmagens no Pantanal, permanecendo na região por vinte anos como preparação para um filme futuro. Este estudo analisa a série Mundo à Parte realizada no Pantanal, buscando relacionar características dessa obra à trajetória de Sucksdorff no cinema sueco e brasileiro.

Resumo expandido

    Considerado por Escorel (2013) como “um naturalista tardio ou um ambientalista precursor”, o sueco Arne Sucksdorff inicia sua graduação em Zoologia, na Universidade de Estocolmo, e a interrompe em 1937 para ingressar na Reimanschule, escola de Artes em Berlim. Devido à ascensão do nazismo, regressa à Suécia onde inicia a realização de documentários. Em seu país, Sucksdorff realizou quinze curtas e três longas, entre 1936 e 1961, além de dois curtas e um longa na Índia. Nos anos 1950, o cineasta era mencionado nos principais debates sobre cinema documentário. John Grierson (1951), citado por Jönsson (2010), inscreveu o cinema de Sucksdorff (junto a Joris Ivens, Jean Epstein e Jean Ferno) na vertente que segue a tradição de Robert Flaherty. Siegfried Kracauer (1960) situa Ritmos da cidade (1948) como parte das sinfonias dedicadas à cidade que revelam experiências cotidianas das pessoas nas ruas e materialidades da natureza, dimensões que a câmera de cinema é capaz de descobrir e sugerir.

    No início de 1960, o cineasta gozava prestígio como sugerem o prêmio de melhor documentário estrangeiro da Academia Americana por Ritmos da cidade – o primeiro Oscar do cinema sueco – e o Grande Prêmio Técnico no Festival de Cannes por seu primeiro longa A grande aventura (1952), à época, um dos filmes mais populares da Suécia, além de prêmios em Veneza e Berlim, entre outros

    A convite do Itamaraty e da UNESCO, em 1962, Sucksdorff chega ao Rio de Janeiro para ministrar um curso de cinema para jovens, alguns engajados no projeto do Cinema Novo, que assim tiveram acesso a um importante grupo de equipamentos: uma câmera blimpada Arriflex de 35mm, um gravador Nagra e uma moviola Steenbeck – esta última providenciada pelo Itamaraty. Esses equipamentos são utilizados não apenas por alunos do curso, mas também em outros projetos de filmes brasileiros. Como exercício final, é realizado o curta Marimbás (1963) a partir do roteiro do estudante Vladimir Herzog. Concluído o curso, em 1963, Sucksdorff dá início às filmagens de Mitt hen är Copacabana, conhecido no Brasil como Fábula. O filme é uma ficção com características de documentário que aborda a difícil realidade de quatro crianças que vivem entre o morro e as areias de Copacabana. Em 1967, inicia filmagens e a uma série fotográfica no Pantanal mato-grossense. Em 1970, conheceu a cuiabana Maria Graça de Jesus, com quem se casou e constituiu família. Sucksdorff permaneceu cerca de vinte anos em Mato Grosso.

    A partir desse breve panorama da trajetória do cineasta, propomos uma análise de sua derradeira obra fílmica, a série Mundo à Parte composta de 4 filmes rodados em 16mm no Pantanal mato-grossense: Os Anos Felizes; Os Anos na Selva; Manha de Jacaré; e O Reino da Selva. Buscamos relacionar tais filmes, em que o cineasta participa da cena com sua família, à trajetória de Sucksdorff no cinema sueco e brasileiro, bem como sua construção do olhar sobre a relação humana com a natureza.

    A série se caracteriza por uma visão lírica da vida no exuberante e vulnerável bioma pantaneiro. Ela é resultado de uma pesquisa in loco para a realização de um filme futuro – que nunca foi feito – que deveria se chamar O sorriso da escuridão. O cineasta planejava levantar recursos para o projeto enquanto trabalhava nos telefilmes encomendados pela Rádio e TV da Suécia.

    Seguindo a tradição do documentário encenado – atenuada pelo uso da câmera sem tripé, trilho ou carrinho, e pela ausência de atores, colocando a si e a sua família em performances diante da câmera – Sucksdorff cria uma representação lírica de sua aventura nômade de 10 anos no Pantanal. Junto de sua mulher, seu filho recém-nascido e de ajudantes e animais pantaneiros, formavam uma inusitada família estendida. Os filmes retratam os anos vividos entre fazendas e acampamentos, em atividades que envolviam ensaios fotográficos, pesquisas e catalogação do bioma, envoltos por uma dinâmica ambiental de encantamento e preocupação com o futuro do Pantanal.

Bibliografia

    ESCOREL, E.. Missão Sucksdorff: o que poderia ter sido. Revista Piauí, 2013. Disp: . Acesso: 17/03/2024.

    HAMBURGER, E. Arne Sucksdorff professor incômodo no Brasil. Doc On-line, n. 27, www.doc.ubi.pt, pp. 81-108.

    HAMBURGER, E.; CAPANEMA, L.. À parte do mundo: uma agrônoma cuiabana e um cineasta sueco no Pantanal Mato-grossense dos anos 1970. Entrevista com Maria Sucksdorff e seus filhos, Anders Eduardo e Claudio Arne. In: Cinema e Audiovisual em Mato Grosso. Vol. 2. São Paulo: Paruna Editorial, 2023.

    JÖNSSON, M.. Performative Nature – The Nature of Sweden in Arne Sucksdorff’s Wartime Documentaries. In: IVERSEN, Gunnar; SIMONSEN, Jan Ketil (Eds.). Beyond The Visual. Sound and Image in Ethnographic and Documentary Film. Hojbjerg: Intervention Press, 2010.

    KRAKAUER, S. Theory of film: the redemption of physical reality. Princeton: Princeton University Press. [1960] (