Ficha do Proponente
Proponente
- Rodrigo Corrêa Gontijo (UEM)
Minicurrículo
- Rodrigo Gontijo é artista, curador e professor na Universidade Estadual de Maringá. É Doutor e Mestre em Multimeios pelo Instituto de Artes da UNICAMP e Bacharel em Comunicação e Multimeios pela PUC-SP. Organizou os livros “Cineclubismo à Distância” (EDUC, 2022) e “Sobre o Contemporâneo: multimeios de possibilidade” (Vox Littera, 2023). Como artista desenvolve projetos de cinema ao vivo, instalações audiovisuais e filme-ensaio.
Ficha do Trabalho
Título
- Toca Raul, Moreira, Pandeiro e Gal: os cine-encontros de Ivan Cardoso
Seminário
- Cinema experimental: histórias, teorias e poéticas
Formato
- Presencial
Resumo
- Esta comunicação analisa, à luz da “pedagogia da encruzilhada” (Rufino, 2019) e da “imaginação percussiva” (Simas, 2019), os curtas “Raul Seixas – Sexo, Drogas e Rock n’ Roll” (1999), “Jackson do Pandeiro – A Brasa do Norte” (1977/2012), “Moreira da Silva” (1974), “Gal Fa-tal” (1971). Pretende-se investigar os processos criativos de Ivan Cardoso, que se mesclam à inventividade dos músicos e intérpretes retratados.
Resumo expandido
- Este trabalho está em continuidade com pesquisas anteriores sobre os cine-encontros de Ivan Cardoso, nomenclatura aqui designada para se referir aos curtas independentes do diretor que prestam homenagem à artistas brasileiros. Através de foto-filme, documentário experimental, cine-clipe e retratos superoitistas, somos surpreendidos pela irreverência de Moreira da Silva, ousadia de Raul Seixas, versatilidade de Jackson do Pandeiro e potência de Gal Costa em seu lendário show “Fa-Tal”.
Tais filmes incorporam fusões culturais, desafiam as normas vigentes e reinventam a linguagem do campo audiovisual. As encenações de um personagem astro do rock em sessões fotográficas realizadas por Cardoso, compõem “Raul Seixas – Sexo, Drogas e Rock n’ Roll” (1999), foto-filme trilhado por músicas de Little Richards, Bill Haley, Roberto e Erasmo Carlos e interpretadas pelo cantor baiano. A mistura de diferentes gêneros, como Rockabilly e Jovem Guarda é algo recorrente na obra de Seixas desde sua estreia, com “Let Me Sing, Let Me Sing” que funde baião com rock.
A incorporação da cultura norte-americana mesclada a brasilidades também está presente na obra de Jackson do Pandeiro, a começar pelo seu nome artístico. José Gomes Filho adota a alcunha de Jackson por ser fã de Jack Perry, ator norte-americano de filmes de faroeste. O filme de Cardoso começou nos anos 70, mas foi abandonado logo em seguida por divergências com o músico paraibano. “Jackson do Pandeiro – A Brasa do Norte” (1977/2012) foi retomado 35 anos depois, tornando-se um cine-clipe da música “Chiclete com Banana”.
“Moreira da Silva” (1974), o primeiro filme em 35mm de Ivan Cardoso, traz toda a malandragem do inventor do samba de breque em formato de números musicais apresentados em locações no Rio de Janeiro, além de um cine-clipe filmado no Jóquei Clube carioca.
E por fim, incorporando o espírito libertário da época, o Super-8 “Gal Fa-tal” (1971) começa com imagens coloridas de Gal Costa no Píer de Ipanema mescladas à cenas de “Nosferato no Brasil” (1971), curta também de Cardoso. Na sequência, surgem cenas em preto e branco do show “Fa-tal”, no qual Gal Costa, vibrante e sedutora, “mexe, remexe, dá nó nas cadeira e deixa a moçada com água na boca”, tal qual diz a letra “Falsa Baiana”, interpretada pela cantora.
Nestes quatro curtas, Ivan Cardoso “ivampiriza” (termo cunhado por Augusto de Campos) culturas e promove experimentações da linguagem audiovisual através de “uma criação pop-carioca de resistência […] de um Méliès sem truques e sem truca, que leu e tresleu Godard” (PIGNATARI, 2018, p.16). Ivan Cardoso temperou com “bebop” o seu “samba” audiovisual e fez destes quatro cine-encontros, cine-clipes que, como em um espelho, reflete a malandragem do morro carioca mesclada à inventividade dos músicos nordestinos, para brincar com o imprevisível, reinventar ritmos internos e dobrar a linguagem audiovisual. Assim, como os músicos retratados, Cardoso incorpora uma “imaginação percussiva” (SIMAS, 2019), que longe das lógicas normativas, “rompem constâncias, acham soluções previsíveis […] inventam a vida no desconforto, na precariedade” (SIMAS, 2019, p.26). Na margem à frente de seu tempo, “vadiando no inesperado e esculhambando as certezas das existências assombradas pelo desencanto” (RUFINO, 2019, p.20), Cardoso antecipa tendências estilísticas que irão se consolidar no formato videoclipe.
Bibliografia
- CARDOSO, I; LUCCHETTI, R.F. Ivampirismo – O Cinema em Pânico. Rio de Janeiro: EBAL, 1990.
CARDOSO, Ivan. De Godard a Zé do Caixão. Rio de Janeiro: Funarte, 2002.
CARDOSO, Ivan. O Mestre do Terrir. São Paulo: Imprensa Oficial, 2018.
LICHOTE, L.; PRETO, M.; SALOMÃO, Omar (orgs). Gal Costa. São Paulo: BEI Editora, 2021.
MACHADO, A. A televisão levada à sério. São Paulo: Editora Senac, 2001.
NETO, T.; SALOMÃO, W. (org.). Navilouca. Rio de Janeiro: Edições Gernasa e Artes Gráficas, 1974
PIGNATARI, Décio. A Marca do Terrir. In: CARDOSO, I. O Mestre do Terrir. São Paulo: Imprensa Oficial, 2018.
RUFINO, Luiz. Pedagogia das Encruzilhadas. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2019.
SIMAS, Luiz Antonio. O Corpo Encantado das Ruas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019.