Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Cristiane Freitas Gutfreind (PUCRS)

Minicurrículo

    Doutora em Sociologia pela Sorbonne. Professora titular do PPGCom e do curso de Produção Audiovisual da PUCRS. Bolsista produtividade do CNPq. Foi professora visitante na Université Montpellier 3 (2007 e 2023). Membro da Association Française des Enseignants et Chercheurs en Cinéma et Audiovisuel (AFECCAV). Líder dos grupos de pesquisa Cinema e Audiovisual: comunicação, estética e política (Kinepoliticom) e Cinema, Audiovisual, Tecnologias e Processos Formativos (Encruzilhada).

Ficha do Trabalho

Título

    Imagens em conflito no documentário brasileiro contemporâneo

Formato

    Presencial

Resumo

    A proposta visa analisar os documentários brasileiros que utilizam imagens da ditadura militar em um contexto de acirrado conflito político, para revelar os antagonismos do presente. As imagens indagam sobre a subjetivação dos sujeitos e do seu espaço social, traduzindo nas telas as marcas dos sentimentos e dos ressentimentos em relação à história recente, além de considerar a herança do autoritarismo, que reforça as diferenças políticas, culturais e sociais no país.

Resumo expandido

    A proposta busca compreender como o documentário brasileiro se apropria das imagens sobre a ditadura militar (1964 – 1985) para configurar a narrativa em conflito sobre o político. Após as Manifestações de Junho de 2013 e o Golpe Parlamentar de 2016, a ditadura militar esteve presente não apenas em filmes restritos à temática, mas também em documentários sobre o golpe. O objetivo desta proposta está no entendimento de como esses filmes usam as imagens da ditadura militar, em um contexto de acirrado conflito político, para revelar os antagonismos do presente. No ano em que se completa 60 anos do golpe militar, faz-se importante ressaltar as especificidades do atual contexto histórico, considerando a herança da ditadura e os aspectos desta transportados para as telas que dizem respeito à liberdade de expressão, ao uso indevido da força para cercear direitos individuais, à manipulação das mídias, aos ativismos, bem como à dor física e social que deixou suas consequências no imaginário contemporâneo. O documentário contempla um esforço memorialístico e indaga sobre a subjetivação dos sujeitos e do seu espaço social, além de traduzir nas telas as marcas dos sentimentos e dos ressentimentos sobre a história. Dessa forma pretende-se resgatar o sentido histórico da apropriação das imagens da ditadura, na atualidade, considerando os antagonismos no país. No político, é imprescindível o embate entre “nós “e “os outros”, mas essa disputa se torna perigosa, de acordo com Mouffe (2015) quando “os antagonismos estabelecem uma relação amigo/inimigo”. Simmel (1998) acrescenta que o poder é a força propulsora dos conflitos, algo inerente as formas sociais, mas, ao potencializar as tensões e as injustiças sociais, é usado de forma manipuladora para ameaçar grupos contrários. Nos últimos anos, o país vive esse tipo de conflito provocado pela ascensão da extrema-direita que tem como espectro a ditadura militar. Assim, o regime deixou como herança uma cultura autoritária reatualizada, reforçando as diferenças econômicas, políticas e sociais do país. Por isso, o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, trouxe à tona movimentos conservadores. Ou seja, instaurou-se uma intolerância deliberada às diferenças de crença, gênero e raça, à orientação sexual e aos posicionamentos políticos dos indivíduos. Este cenário, consolidou o bolsonarismo, como fenômeno político de extrema-direita (Nobre, 2022 e Miguel, 2022). O período histórico ditatorial passou a ser enaltecido, incluindo a referência a torturadores, mas, sobretudo, incitando manifestações que demandam pela instauração de um regime autocrático, implementado com apoio das forças armadas, que deflagrou uma tentativa de golpe no dia 8 de janeiro de 2023 com graves ataques às instituições nacionais na capital do país após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para exercer o seu terceiro mandato. Refletir sobre documentários como O que resta de Junho (Carlos Leal, Diego Felipe, Vladimir Santafé, 2016), Alvorada (Anna Muylaert e Lô Politi, 2021) e Domingo no Golpe (Giselle Beiguelman e Lucas Bambozzi (2023), permite-nos pensar sobre a maneira de fazer, assistir e falar sobre essas narrativas para entender as configurações do conflito político na imagem atual. Esta proposta pretende analisar, como os diversos registros imagéticos, as estratégias estéticas e de estilo dos documentários contemporâneos inferem na questão política e histórica. A análise fílmica nos interessa, pois pensa sobre uma época, um estilo e um modo de produção como realidades mutáveis, jamais estáveis e, associada ao conceito de figura como instrumento metodológico, permite-nos entender a ação da lógica do visual como algo que vem de dentro da própria imagem e diz respeito ao sensível. Enfim, esta proposta pretende ser uma contribuição para a compreensão de uma parte importante da história do país, que vem inspirando um número representativo de filmes.

Bibliografia

    GENETTE, Gerard. Figures III. Paris: Klincksieck, 1972.
    MIGUEL, Luis Felipe. Democracia na Periferia Capitalista: impasses do Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2022.
    MOUFFE, Chantal. Sobre o Político. São Paulo: Martins Fontes, 2015.
    NINEY, François. L’épreuve du réel à l’écran. Essai sur le príncipe de réalité documentaire. Paris: De Boeck, 2002.
    NOBRE, Marcos. Limites da Democracia: de Junho de 2013 ao governo Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2022.
    SIMMEL, Georg. Le Conflit. Paris: Circé, 1998.