Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Rafael de Campos (UFRGS)

Minicurrículo

    Bacharel em realização audiovisual pela UNISINOS (2020) e mestre em comunicação pela UFRGS (2024). Atualmente, é doutorando em comunicação na UFRGS, com bolsa CAPES. É membro do grupo de pesquisa GPESC e do núcleo de pesquisa Corporalidades. Como roteirista e diretor, realizou os curtas Três Cores e Outras Mais (2018, co-dirigido com Frederico Franco), Dinossaurite (2019) e Ruídos da Ágora (2023).

Ficha do Trabalho

Título

    Atravessamentos ensaísticos em filmes de Joseph Cornell e Ken Jacobs

Formato

    Presencial

Resumo

    Este estudo explora os atravessamentos ensaísticos em Rose Hobart (1936), de Joseph Cornell e em Tom, Tom, the Piper’s Son (1969), de Ken Jacobs. A partir de uma aproximação entre o found footage (Wees, 1993) e o vídeo-ensaio (Grant, 2014), propõe-se uma análise dos elementos ensaísticos contidos nestes filmes a fim de entrever novas compreensões acerca de suas configurações formais, estéticas e contextuais, bem como um possível diálogo com as práticas de reapropriação audiovisual contemporâneas

Resumo expandido

    “Todo ensaio é experimental, mas nem todo experimental é ensaístico” (Teixeira, 2022, p. 64). Com esta frase, Teixeira tenta delinear a nebulosa fronteira entre o cinema experimental e o ensaístico. Para o autor, todo filme-ensaio possuiria um atravessamento experimental intrínseco, e é baseado nesta premissa que ele propõe a noção de “passagens” entre o ensaio e o experimental. De modo similar, autoras como Rascaroli (2017) e Almeida (2018) vem propondo que seria mais frutífero entender o ensaísmo como um conjunto de manifestações que se apresentam de diferentes maneiras em diferentes formas fílmicas, ao invés de um gênero fechado em si.

    Entre essas manifestações ensaísticas, os principais elementos, dos quais boa parte derivam da teoria do ensaio literário, seriam: a articulação entre uma experiência pública e uma experiência privada (Corrigan, 2015), uma tendência à digressão e a recusa à construção de argumentos fechados, tendendo à abertura do discurso (Lukács, 1974), além de um caráter de “radicalismo não-radical” (Adorno, 2003, p. 25), buscando explorar as potencialidades do cinema em representar pensamentos complexos (Astruc, 2017).

    Para além dos filme-ensaios, as últimas décadas trouxeram a proliferação de outra forma: os vídeo-ensaios. Mas as diferenças aqui não dizem respeito apenas à uma mídia analógica e outra digital, mas referem-se ao fenômeno de produção de vídeos com o intuito de comentar, analisar, ressignificar ou colocar em suspenso determinado filme ou outro produto audiovisual. Entre esses vídeos, os que nos interessam aqui são aqueles nos quais a experimentação formal sobrepõe-se ao uso de texto, como nos trabalhos de Kogonada, Kevin B. Lee, Cristina López e principalmente Catherine Grant, que além de produzir diversos vídeo-ensaios, é umas das fundadoras da revista [in]Transition, publicação acadêmica dedicada a vídeo-ensaios.

    Esses autores e autoras apropriam-se de material fílmico pré-existente na intenção de construir algo novo, o que parece similar às definições do experimental de found footage, como a de Wees (1993), ou aquilo que Brenez (2002) fala sobre as reapropriações audiovisuais. Embora nos vídeo-ensaios possa prevalecer uma intencionalidade voltada mais à crítica e análise cinematográfica do que em gerar uma nova obra, é inegável que, por outro lado, filmes de autores como Martin Arnold, Ken Jacobs, Bruce Conner, entre outros, também nos fazem refletir acerca dos filmes sobre os quais eles se apropriam. E enquanto alguns estudiosos têm apontado os extras de Dvd’s (Grant, 2014) ou os laser-discs (Vale, 2018) como os precursores da prática vídeo-ensaística recente, parece oportuno um olhar a certos filmes experimentais de found footage, atento a possíveis manifestações embrionárias que hoje são retomadas pela prática vídeo- ensaísta.

    Dois exemplos representativos disso são Rose Hobart (1936), de Joseph Cornell, e Tom, Tom, the Piper’s Son (1969), de Ken Jacobs. Enquanto o primeiro poderia estar próximo daquilo que Bateman (2016) define como supercut, o filme de Jacobs, com seus reenquadramentos, mudanças de velocidade e cor parece ser relembrado por trabalhos de inúmeros vídeo-ensaístas recentes. Portanto, a proposta do presente trabalho centra-se em uma análise desses dois filmes a partir de um olhar atento a seus potenciais elementos ensaísticos. No entanto, não se quer aqui propor as obras de Cornell e Jacobs como as “verdadeiras precursoras” do vídeo-ensaísmo; o intuito é, partindo da noção de que estas obras apresentam elementos ensaísticos, buscar uma nova compreensão acerca de suas configurações formais, estéticas e contextuais, além de entender aquilo que esses filmes podem contribuir e nos ensinar acerca da prática ensaística. Para além disso, objetiva-se, neste diálogo entre o experimental found footage do século passado e o vídeo-ensaísmo dos anos 2010, explorar o papel e as reconfigurações do cinema experimental na contemporaneidade.

Bibliografia

    ADRONO, T. O Ensaio Como Forma. Em: Notas de Literatura I, p. 15-46. São Paulo: Ed. 34, 2003
    ALMEIDA, G. Ensaio fílmico, eterno devir. DOC online, n. 24, p. 91-111, 2018.
    ASTRUC, A. The Future Of Cinema. In: Essays on the essay Film, p. 93-101. Nova Iorque: Columbia University Press, 2017.
    BRENEZ, N. Montage intertextuel et formes contemporaines du remploi Dans le cinema experimental. Revue d’études cinématographiques, vol. 13, p. 49-67, 2002.
    CORRIGAN, T. O Filme Ensaio: Desde Montaigne e Depois de Marker. Campinas: Papirus, 2015.
    GRANT, C. The Shudder of a Cinephiliac Idea? Aniki vol. 1, nº 1, p. 49-62, 2014.
    LUKÁCS, G. On the nature and form of the essay. In: Soul and Form, p. 01-18. Cambridge: MIT Press, 1974.
    RASCAROLI, L. How the essay film thinks. Oxford University Press, 2017.
    TEIXEIRA, F. Arqueologia do ensaio no cinema brasileiro. São Paulo: Hucitec, 2022.
    WEES, W. Recycled Images: The Art and Politics of Found Footage Films. Nova Iorque:‎ Anthology Film Archives, 1993.