Ficha do Proponente
Proponente
- Andreson Silva de Carvalho (ESPM Rio)
Minicurrículo
- Atual professor de captação e edição de som do curso de cinema da ESPM Rio (2014-). Doutor em som para cinema e audiovisual pelo PPGCOM-UFF (2016). Ministrou aulas como professor substituto na graduação do curso de Cinema e Audiovisual da UFF (2004-2006). Foi professor de edição de som e desenho sonoro na Escola de Cinema Darcy Ribeiro (2005-2014). Trabalhou em alguns curtas e longas-metragens nas áreas de desenho sonoro e edição de som.
Ficha do Trabalho
Título
- O interesse pelo ambiente sonoro em Zona de Interesse
Formato
- Presencial
Resumo
- O ambiente sonoro tem sido uma das estruturas mais relegada pelo cinema contemporâneo, principalmente, o hegemônico hollywoodiano. Aumenta a cada ano o número de filmes que cria suas narrativas em espaços sonoros totalmente neutros e silenciosos, que não interferem na percepção espacial dos espectadores, nem contribuem com a narrativa a ser contada. Nesta contramão, surge o filme vencedor do Oscar de Melhor Som em 2024, tirando o ambiente de segundo plano e concedendo-o protagonismo narrativo.
Resumo expandido
- O ambiente sonoro de um filme é uma das camadas sonoras que compõem o todo de uma sonorização audiovisual. Muitas são as etapas na qual se divide o processo de finalização sonora e cada autor apresenta essa estrutura de forma diferente. Débora Opolski, em Introdução ao Desenho de Som, uma sistematização aplicada na análise do longa-metragem Ensaio Sobre a Cegueira, apresenta uma divisão no qual o som ambiente é tido como uma subdivisão dos efeitos.
[…] todo som que não é música, nem diálogo é efeito sonoro. […] Os efeitos são divididos em três categorias, de acordo com a função desempenhada: 1) backgrounds, os sons que compõem os ambientes, 2) hard-effects, efeitos que são vistos pelo espectador, relativos a uma fonte sonora on frame, e 3) sound effects, que são os efeitos não-literais, não-indiciais e que não devem ser submetidos a escutas causais, pois não são representativos. (2013: 38)
Virginia Flôres, no livro O Cinema, uma arte sonora, reconhece que diversos teóricos e críticos do cinema dividem a sonorização audiovisual em: diálogos, ruídos e músicas, colocando os ambientes sonoros dentro dos ruídos. Porém, também nos apresenta uma classificação diferente, baseada nos procedimentos técnicos que foram difundidos no Brasil, pela editora de som francesa, Emmanuelle Castro, que veio editar o som do filme Amor Bandido (Bruno Barreto, 1978), repassando sua metodologia através da prática que realizava.
O trabalho do editor de som está dividido em quatro elementos ou o que se denomina tipos de sons: diálogos, ambientes, ruídos e músicas. Historicamente, essa divisão é efetuada para facilitar e dar flexibilidade ao trabalho de mixagem, pois nesta etapa, quando termina a edição de som, acumula-se grande número de pistas com diferentes sons tocados simultaneamente. (2013: 119)
A inclusão do ambiente sonoro na categoria de efeitos faz sentido quando entendemos que estas sonoridades podem se complementar, e que um mesmo som pode ser considerado ambiente ou efeito em situações específicas, dependendo da narrativa, como, por exemplo, o som de ventilador ou uma TV ligada. No entanto, enquanto os efeitos são sons pontuais, que acontecem para destacar uma ação ou acontecimento, os ambientes são sons contínuos, que preenchem toda uma cena, servindo para criar imersão e situar o espectador espacialmente. Ao se pensar desta forma, torna-se um pouco estranho que sejam colocados juntos durante o processo de sonorização, pois, mesmo que sejam complementares, cumprem funções distintas.
Para os profissionais que trabalham na captação sonora, um dos principais desafios, desde seu advento, sempre foi o de registrar a voz da forma mais limpa possível, com a menor presença de ruídos e ambiente da locação. Com o avanço da tecnologia digital, microfones cada vez mais sensíveis e um posicionamento mais próximo da boca dos atores, ficou cada vez mais fácil obter um resultado satisfatório na relação entre voz e fundo. Se por um lado, o progresso obtido permite maior liberdade e criatividade durante a edição de som, por outro, é perceptível que muitas das produções modernas têm se aproveitado de ter uma voz mais limpa para criar espaço sonoros cada vez mais silenciosos e ocos.
É neste sentido que Zona de Interesse (Jonathan Glazer, 2024) surge como um divisor de águas, onde o ambiente é tão bem trabalhado e desenvolvido que se torna um dos personagens principais da narrativa. O espaço sonoro criado para o filme nos apresenta a realidade do maior campo de concentração e extermínio da Alemanha nazista durante a Segunda Guerra Mundial. Enquanto de um lado nos são apresentadas famílias, que vivem uma vida normal e até mesmo bucólica, do outro, separado por um imenso muro, o que se ouve são tiros, explosões, gritos e gemidos, estabelecendo um clima de horror, que, através de seu contraste com as imagens, prova o quanto o ambiente sonoro pode acrescentar valor a uma história de forma criativa, evitando o óbvio.
Bibliografia
- CHION, Michel. A Audiovisão – som e imagem no cinema. Lisboa, Texto e Grafia, 2011.
FLORES, Virginia. O Cinema: uma arte sonora. Annablume, São Paulo, 2013.
OPOLSKI, Débora. Introdução ao desenho de som: uma sistematização aplicada na análise do longa-metragem Ensaio sobre a Cegueira. João Pessoa, Editora da UFPB, 2013.
SCHAFER, R. Murray. A Afinação do mundo: Uma exploração pioneira pela história passada e pelo atual estado negligenciado aspecto do nosso ambiente: a paisagem sonora. São Paulo, Editora UNESP, 2011.