Ficha do Proponente
Proponente
- Julia de Almeida Maciel Levy Tavares (UFF)
Minicurrículo
- Produtora, pesquisadora e crítica de cinema. Doutoranda em economia pela UFF. Bolsista CAPES. Integra o Grupo de Estudos e Pesquisas em Ontologia Crítica UFF e o Elviras – Coletivo de mulheres críticas de cinema.
Coautor
- Sávio Freitas Paulo (UFF)
Ficha do Trabalho
Título
- O cinema de Jia Zhangke e o retrato da destruição humana e ambiental
Formato
- Presencial
Resumo
- A partir do filme Um toque de pecado do diretor chinês Jia Zhangke, analisamos problemas sociais contemporâneos decorrentes do processo de acumulação de capital. Recorrendo à crítica da economia política, especialmente às contribuições maduras de Marx e de Lukács, e a referências estéticas audiovisuais, argumentamos que a escalada da violência, a vulnerabilidade socioeconômica e a degradação ambiental e humana retratadas, são resultado do contínuo e ampliado processo de produção de mercadorias.
Resumo expandido
- Conhecido por narrar por mais de duas décadas as transformações pelas quais tem passado a sociedade chinesa, colocando as modificações humanas, urbanas e ambientais como personagens de seus documentários e ficções, a obra de Jia Zhangke também se apresenta como um rico mosaico das transformações pelas quais o mundo tem sido afetado. Tian zgu ding (A touch of sin), em português, Um toque de pecado, foi premiado no Festival de Cannes de 2013 e após uma década do seu lançamento, continua despertando espanto e reflexões.
A partir da escolha de algumas histórias de violência que escandalizaram seu país, o cineasta se lançou a pesquisá-las de perto a fim de embasar o roteiro da obra. Algo pouco abordado entre os críticos da película é o fato de ser possível compreender a escalada da violência retratada na China contemporânea através de uma perspectiva alinhada com os fundamentos da crítica da economia política de Karl Marx. As expressões de violência que chocam os espectadores – as mesmas que não chocam em películas de super-heróis, distopias, terror, suspense etc. – possuem um fundamento em comum. Com György Lukács, é possível dizer que todas representam formas do estranhamento (Entfremdung), originadas, em última instância, do fato de as relações sociais naquela sociedade (e em praticamente todo o planeta) derivarem da subordinação dos seres humanos à expansão do valor, ao ímpeto expansivo da produção de mercadorias, evidenciado anteriormente por Marx, em O capital, sobretudo em sua original teoria do fetichismo da mercadoria e na formulação da lei geral da acumulação capitalista. Ademais, convém registrar que Lukács sustenta, citando trechos do capítulo de O capital e dos Grundrisse, a íntima relação entre violência e a base econômica.
Em nosso entendimento, é possível considerar que existe um movimento de renovação do pensamento marxista e que este tem se dado, dentre outras razões, através das contribuições críticas de alguns autores, como as do húngaro Lukács – cujas obras principais só começaram a ser publicadas integralmente em português há pouco mais de uma década –, intelectual que buscou sobretudo expurgar as visões maniqueístas e reducionistas que o marxismo se veste durante o século XX. Para além disso, destacamos o fato de que Lukács é provavelmente o autor marxista que mais tenha se debruçado sobre o estudo das artes, tendo, ainda na década de 1960, lançado sua monumental Estética. (Re)assistir ao filme a partir da perspectiva da crítica da economia política nos permitiu analisar essa cinematografia tão resenhada internacionalmente por outros novos ângulos. O que só reitera a ideia de que a referida obra possui grande complexidade e ainda merece atenção.
Nesse sentido, o objetivo do nosso trabalho é oferecer uma análise sobre o filme Um toque de pecado, de Jia Zhangke, que evidencie sua riqueza e contemporaneidade, justamente por ser possível relacionar a película com os fundamentos da crítica da economia política de Marx e da tradição que o sucede, com ênfase na teoria de seu contemporâneo Lukács. Assim, ao relacionar a película a esses autores, pretendemos atestar a sensibilidade do diretor em captar por meio de uma obra de arte – ou como diria o autor húngaro, através de uma “forma ideológica pura” – um retrato da fonte e das consequências da violência, em função da continuidade da reprodução da vida social baseada na produção de valor.
Bibliografia
- ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo, 2018.
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KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
FAUSTINO, D. M., LIPPOLD, W. Colonialismo Digital: por uma crítica hacker-fanoniana. 1. ed. São Paulo: Boitempo Editorial, 2023. v. 1. 208p
LUKÁCS, G. Para uma ontologia do ser social. Tomo II. São Paulo: Boitempo, 2013.
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MARX, K. O capital: crítica da economia política. Livro I. São Paulo: Boitempo, 2013.
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______. Manuscritos econômico-filosóficos de 1844. São Pa