Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Patricia Furtado Mendes Machado (PUC-Rio)

Minicurrículo

    Patrícia Machado é professora da graduação em Estudos de Mídia e do PPGCOM/ PUC-Rio. É Jovem Cientista do Nosso Estado, Faperj, e coordena o grupo de pesquisa Práticas do contra-arquivo- mapeamento e análise de imagens da ditadura militar.

Ficha do Trabalho

Título

    O CINEMA COMO ARQUIVO: a visibilidade de vivências femininas

Mesa

    Retomar e remontar: arquivos de maternidade na obra de Coutinho

Formato

    Presencial

Resumo

    Diante da escassez dos arquivos quando tratamos da trajetória de Elizabeth Teixeira, e dos registros realizados por Eduardo Coutinho sobre a camponesa, nosso objetivo é indagar como os filmes podem ser pensados como um arquivo audiovisual que colabore para a construção da história de mulheres que não tiveram direito à memória. Mobilizaremos diferentes modalidades de arquivo – sensível, privado, institucional, performático – para pensar no arquivo fílmico como lugar de impressão de vivências.

Resumo expandido

    O protagonismo de Elizabeth Teixeira no cinema e nas lutas por direitos e pela liberdade no campo se inscreve no documentário de Eduardo Coutinho, como bem ressalta Cláudia Mesquita (2023). No encontro com Elizabeth em Cabra Marcado para Morrer, Coutinho registrou a experiência de uma mulher perseguida que não consta nos arquivos institucionais da ditadura militar. A partir de uma investigação minuciosa nos documentos da “máquina que produziu suplícios, torturas, sofrimentos, desaparecimento e mortes” (Thiersen, 2019), localizamos poucas pistas sobre a trajetória de Elizabeth: um prontuário sem fotografia, um bilhete sobre a vigilância de um agente secreto, um informe que caracteriza a camponesa como uma “grande agitadora de linguagem violenta em seu discurso”, panfletos da campanha política sobre a candidatura como deputada estadual.
    Se os “arquivos sensíveis” (Thirsen, 2019) da ditadura oferecem poucas pistas que desvelem fatos, experiências e circunstâncias da vida de Elizabeth, a mobilização dos objetos do cotidiano feminino – como cartas, diários, fotografias pessoais – não poderiam tão pouco colaborar para essa tarefa. A historiadora Michelle Perrot enfatiza a importância fundamental dos arquivos privados para a escrita de uma história das mulheres, cujas presenças foram apagadas ao longo de séculos por conta destruição de seus vestígios. Contudo, ao contrário de outras mulheres que foram diretamente atingidas pela ditadura, (como Iramaya, a mãe coragem que constituiu um arquivo privado da luta pela libertação dos filhos e de outros presos políticos do Brasil, como mostra o filme da neta Carol Benjamin- Fico te devendo uma carta sobre o Brasil), Elizabeth Teixeira deixou poucos rastros da sua vida pessoal. Com o golpe militar, ela teve que fugir, trocar de nome e entrar para a vida clandestina. Além disso, teve a casa queimada e os objetos pessoais destruídos pela polícia.
    Diante da escassez de diferentes modalidades de arquivo quando tratamos da trajetória de Elizabeth Teixeira, nosso objetivo é discutir como os filmes podem ser usados para constituir um arquivo audiovisual que colabore para a construção da história de mulheres que não tiveram direito à memória. Seguimos a premissa de Tina Campt que, ao analisar filmes de artistas negros contemporâneos, propõe pensar na recriação de um arquivo visual da precariedade negra, um arquivo que não seja saturado de imagens de violência e morte mas que incentive novos modos de olhar para as imagens, e que obrigue “o espectador a compreender o ataque violento a pessoas negras” (2019). Se para Ariella Azoulay o poder, a autoridade e a neutralidade dos arquivos são celebrados “depois que outras modalidades de arquivo são obliteradas” (Azoulay, 2013, p.79), não traria o arquivo constituído a partir dos filmes novas formas de dar visibilidade e inscrever experiências que foram apagadas da história?

Bibliografia

    AZOULAY, Ariella. Desaprendendo as origens da fotografia.Revista Zum, São Paulo, n. 17, 2019.
    CAMPT, Tina.The Visual Frequency of Black Life. Social Text 140 • Vol. 37, No. 3 • September 2019
    MESQUITA, Claudia. A ferida que começou a abrir para nunca mais fechar. Elizabeth Teixeira, militância e maternidade no redemoinho da história. IN: Cabra Marcado para Morrer, 2023.
    PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo: Editora Contexto, 2007.
    THIERSEN, Icléia. Reflexões sobre documentos sensíveis, informação e memória no contexto do regime de exceção no Brasil (1964-1985). Perspectivas em Ciência da Informação, v.24, número especial, p.06-22, jan./mar.2019