Ficha do Proponente
Proponente
- Beatriz Avila Vasconcelos (Unespar)
Minicurrículo
- Doutora em Letras Clássicas (Universidade Humboldt de Berlim). Professora do Bacharelado em Cinema e Audiovisual e do Mestrado em Cinema e Artes do Vídeo da Universidade Estadual do Paraná. Pesquisa sobre funcionamentos da linguagem no cinema, abordando as relações entre imagem cinematográfica e história da cultura e da arte e as conexões entre cinema, atenção e linguagem poética, com especial interesse por experimentalismos no cinema. Escreve poesia e dramaturgia.
Ficha do Trabalho
Título
- A verdade poética de Maya Deren
Formato
- Presencial
Resumo
- O objetivo deste estudo é contribuir para uma compreensão das ideias de Maya Deren acerca da poesia cinematográfica, em busca de acercar a verdade desta artista que, sendo poeta, compreendeu as potencialidades do cinema para expandir a linguagem da poesia. Para tanto, reúno algumas teorizações de Deren sobre o cinema poético, por ela chamado cinema vertical, partindo de alguns de seus pronunciamentos, entre eles os contidos no Simpósio Poetry and the Film, realizado em outubro de 1953
Resumo expandido
- A relação entre cinema e poesia esteve sempre, para Maya Deren, na base de sua constituição como cineasta. Em Cinematography: The Creative Use of Reality, Deren afirma: “Meus filmes podem ser chamados poéticos, coreográficos, experimentais. Não estou me dirigindo a nenhum grupo em particular, mas a uma área especial e a uma faculdade determinada existente em qualquer ser humano: para a parte dele que cria mitos, inventa divindades e medita, sem um propósito prático, sobre a natureza das coisas. A verdade importante é a poética.” (DEREN 2015, p. 24). De fato, Deren inicia sua carreira artística como poeta e o olhar poético irá marcar profundamente toda sua trajetória como cineasta, estando na base de muitas de suas ideias sobre cinema e de seus processos criativos. O objetivo deste estudo é justamente contribuir para uma compreensão das ideias de Maya Deren acerca da poesia cinematográfica, em busca de acercar a verdade desta artista que, sendo poeta, compreendeu as potencialidades do cinema para expandir a linguagem da poesia. Para tanto, reúno algumas teorizações de Deren sobre o cinema poético, por ela chamado cinema vertical, partindo de alguns de seus pronunciamentos, entre eles os contidos no Simpósio Poetry and the Film, realizado em outubro de 1953, pela sociedade Cinema 16. Neste debate, Deren, como única mulher entre os debatedores e diante da atitude visivelmente escarnecedora da parte de seus interlocutores homens (Parker Tyler, Arthur Miller e especialmente do poeta Dylan Thomas), busca estabelecer uma consistente teoria do cinema vertical, na qual ela expõe uma concepção de montagem fundada na associação de imagens não por meio do encadeamento narrativo – o que seria característico do que Deren nomeou de cinema horizontal – mas por meio de uma montagem que se estrutura a partir de um núcleo comum, fundado em uma sensação, tal como nos sonhos, o que permite relações entre os planos que não avançam, como na narrativa, mas aprofundam, em um mergulho vertical. Deren defende haver uma relação intrínseca entre as imagens nos sonhos, na montagem do cinema vertical e na poesia. Nestes três contextos, as imagens, segundo ela “estão relacionadas porque são mantidas juntas por uma emoção ou um significado que têm em comum, e não pela ação lógica” (DEREN, 1953/1963). Assim, na lógica vertical, imagens até mesmo díspares podem ser associadas, encadeadas, pois o que as atrai não é a lógica sequencial da narrativa, mas o núcleo emocional que tais imagens têm em comum: esta é, para Deren, a estrutura da poesia, que é a mesma dos sonhos e a mesma do cinema, tomado então não como uma plataforma narrativa, mas como um dispositivo para o mergulho vertical em sensações e emoções não capturáveis por um logos ordenador. Tais ideias de Maya Deren, mesmo que muito bem fundamentadas, não foram bem recebidas no contexto do debate promovido pelo Cinema 16 e chama a atenção a firmeza de Deren neste ambiente hostil: o modo como ela avança inabalável, em meio a piadas de seus colegas e a gargalhadas do público (audíveis, pois o registro audiofônico do debate foi preservado), no aprofundamento de sua argumentação mostra, de maneira muito concreta, o quanto ela realmente esteve orientada por uma verdade interna. Não se trata de uma verdade-dogma, mas de uma verdade de si, fundada em uma profunda experiência poética, que corresponde muito bem ao que Octavio Paz descreve: “o poeta faz mais do que dizer a verdade; cria realidades que possuem uma verdade: a de sua própria existência. As imagens poéticas têm a sua própria lógica e ninguém se escandaliza que o poeta diga que a água é cristal…” (2009, p.45). Assim, mais que explicitar, desejo aqui criar uma possibilidade de escuta dessa verdade de Deren acerca do cinema poético, que foi tão brutalmente silenciada no contexto de sua enunciação, uma verdade que deu sustento e profundidade à prática e à existência desta poeta do cinema.
Bibliografia
- POETRY and the Film: A Symposium. Transcription by Willard Maas. Film Culture, 29, 1963, pp. 55-63.
DEREN, Maya. El universo Dereniano. Textos fundamentales de la cineasta Maya Deren. Traducción de Carolina Martínez López. Cuenca. Ediciones de La Universidad de Castilla – La Mancha, 2015
DEREN, Maya. Essential Deren: collected writings on film. Edited with a preface by Bruce R. McPherson. . Kingston, New York: McPherson & Company, 2005
DEREN, Maya. Cinema: o uso criativo da realidade. Tradução José Gatti e Maria Cristina Mendes. Devires, Belo Horizonte, Fafich-UFMG, v. 9, n. 1, p. 128-149, 2012.
PAZ, Octavio. O arco e a lira. São Paulo: Cossac Naïf, 2012