Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Lara Damiane de Oliveira Estevão (UFG)

Minicurrículo

    Bacharela em Cinema e Audiovisual pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás (IFG), atualmente mestranda no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Goiás (UFG), pesquisando a história do cinema goiano na década de 1960.

Ficha do Trabalho

Título

    Cinema amador e Ditadura militar: jovens imaginários goianos

Formato

    Presencial

Resumo

    Em 1968, jovens estudantes filmam em Goiás “A Fraude”, um curta-metragem ficcional para o IV Festival de Cinema Amador do Jornal do Brasil. Este trabalho investiga como, diferentemente do que supões a historiografia do cinema goiano até o momento de que o filme retraria um caso real, “A fraude”, como outros filmes do período, catalisa a experiência e o imaginário de uma juventude goiana nos primeiros anos da ditadura militar, expondo as complexidades e contradições presentes no regime.

Resumo expandido

    O ano de 1968, além de emblemático para a conjuntura brasileira, marca também a produção cinematográfica em Goiás. Ao todo, o estado que contava com uma produção ainda incipiente, lançou três filmes de ficção, que circularam no IV Festival de Cinema Amador do Jornal do Brasil e em salas de cinema por todo o país. Um dos filmes exibido pelo Festival, A fraude, foi dirigido por Jocelan Melquíades de Jesus, estudante da Escola Superior de Cinema de São Luiz. O filme narra a história de Luiz, um jovem estudante que presta o vestibular para o curso de medicina na Universidade Federal de Goiás (UFG), mas é considerado um excedente. Segundo historiadores do cinema goiano, o curta teria se inspirado em acontecimentos reais: após o vestibular de 1968 da UFG, os estudantes goianos denunciaram haver uma fraude no processo seletivo. Para uma história do cinema é fundamental ampliar o escopo da investigação para além do filme: é necessário ir de encontro com a própria História.
    O Festival de Cinema Amador funcionou como um catalisador da experiência que parte da juventude brasileira vivia frente aos desdobramentos da Ditadura militar. O cinema amador incentivado pelo Jornal do Brasil, “foi um locus privilegiado para a expressão do novo lugar dado ao cinema na cultura brasileira e do imaginário em torno de uma juventude que, com a facilidade propiciada pela produção de filmes em pequenos formatos, passava a ter o cinema como forma de expressão” (FOSTER, 2021, p. 35).
    Esses filmes são documentos da juventude de uma época, invenções sobre a realidade histórica que não podem ser compreendidas distante dela, seguindo o pressuposto de Ferro de que “aquilo que não se realizou, as crenças, as intenções, o imaginário do homem, é tanto a História quanto a História” (1974, p. 203). As articulações entre Cinema e História podem apontar para ricas chaves de leitura para o trabalho com os filmes na historiografia de cinema. O filme, como fonte e testemunho de um passado, reflete as disputas e contradições inerentes ao mundo que pretende representar. Como afirma Barros, nos filmes há uma sobreposição de diversas vozes sociais: “não apenas as que invadem a cena através dos seus discursos como também as que nela penetram através da imagem” (2007, p. 24). Logo, ao trabalhar com a análise fílmica é necessário ir além de uma leitura única do filme que o reduza às intenções dos seus realizadores.
    A própria Ditadura Militar foi um lócus de embates e contradições que o cinema produzido no período, pela polifonia de discursos que capta, pode ajudar a desvendar. Dentre os estudos sobre o cinema goiano, os livros Goiás no século do cinema de Beto Leão e Eduardo Benfica e a dissertação Cinema em Goiás: quando tudo começou… (1960-1970), de Túlio Henrique Queiroz e Silva, explicam A fraude, entendendo que o filme retrata um caso de fraude no vestibular de medicina em que estudantes subversivos haviam sido excluídos do processo seletivo, sendo considerados excedentes.
    É necessário que a história do cinema alinhe-se com a historiografia pertinente para a realidade histórica na qual os filmes inserem-se. A Fraude é inundado com a imagem das contradições inerentes ao regime militar, revelando camadas da mobilização estudantil, da prática cinematográfica e da relação da ditadura militar com as universidades que vão além da tipologia binária de resistência versus cooperação, como Motta (2014) propõe superar.
    Neste trabalho, interrogamos A fraude no intuito de entender como o filme perpassa um imaginário sobre a mobilização dos estudantes goianos. A hipótese é de que o filme não se reduz a retratar o ocorrido e pouco diz sobre a realidade dos fatos, mas sim que os realizadores do filme utilizaram-se da fraude para tomar um posicionamento sobre os conflitos que, durante os primeiros anos do regime militar, colocaram-se como motor da revolta estudantil, apreendendo a complexidade do momento histórico através do cinema.

Bibliografia

    BARROS, José D’Assunção. CINEMA E HISTÓRIA – as funções do Cinema como agente, fonte e representação da História. Ler História Lisboa: 2007. n° 52, p.127-159
    FOSTER, LILA . Matizes da cultura jovem: imagens e imaginários em torno do Festival de Cinema Amador JB/Mesbla. ESTUDOS HISTORICOS (RIO DE JANEIRO) , v. 34, p. 30-53, 2021.
    FERRO, Marc. O filme, uma contra-análise da sociedade? In: Cinema e História. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. p.79-115.
    LEÃO, Beto; BENFICA, Eduardo. Goiás no século do cinema. Goiânia: Kelpes, 1995.
    MOTTA, Rodrigo Patto Sá. As universidades e o regime militar. 1ª Edição. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
    SILVA, T.H.Q. Cinema em Goiás: quando tudo começou… (1960-1970). 2018. 128 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 2018.