Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Hermano Arraes Callou (UFRJ)

Minicurrículo

    Hermano Callou é doutor em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Atualmente, é pesquisador de pós-doutorado pela Faperj/UFRJ

Ficha do Trabalho

Título

    O automatismo fotográfico em André Bazin e Stanley Cavell

Seminário

    Cinema Comparado

Formato

    Presencial

Resumo

    Esta comunicação pretende comparar a problematização do automatismo fotográfico em André Bazin e Stanley Cavell. A sugestão de Bazin de que a originalidade do cinema deve ser procurada na gênese automática do suporte fotográfico é seguida por Cavell, que reconstrói a questão de maneira teórica e metodologicamente distinta, revisando em nova chave temas bazinianos: a identidade ontológica entre imagem e modelo, a fantasia de ver o mundo de fora da subjetividade e a ausência do humano no cinema.

Resumo expandido

    Esta comunicação pretende comparar as teorias do cinema de André Bazin e Stanley Cavell tomando como ponto de referência a noção de automatismo fotográfico. A hipótese de Bazin de que a originalidade do cinema residia na gênese automática de sua base fotográfica é retomada por Cavell em The World Viewed, obtendo um lugar central em seu livro, em que a problemática baziniana recebe, pelo menos, três inflexões importantes.

    1) A obra de Cavell reconstrói em novos termos uma intuição fundamental e obscura de Bazin a respeito das consequências do automatismo fotográfico: a identidade ontológica entre imagem e modelo – “a imagem(…) é o modelo” (Bazin, 2018a, p.33). A questão é deslocada por Cavell da psicologia da fotografia de Bazin para uma abordagem orientada pela filosofia da linguagem ordinária, que permite o autor americano descrever o “desassossego ontológico” provocado pela experiência fotográfica: “uma fotografia não nos apresenta a aparência das coisas; ela nos apresenta, temos vontade de dizer, as coisas elas mesmas” (Cavell, 1979, p.17). A descrição do modo como falamos ordinariamente da percepção, de inspiração austiniana (Austin, 2021), permite Cavell oferecer uma melhor inteligibilidade da ideia paradoxal de que a fotografia nos mostra as coisas elas mesmas.

    2) A fotografia nos mostra a realidade, para Bazin, porque ela é “objetiva” (“todas as artes se fundam sobre a presença do homem, unicamente na fotografia é que fruímos de sua ausência” [Bazin, 2018a, p.32]). A fantasia prometida pela imagem automática de ver pela “impassibilidade da objetiva” o mundo despojado de “toda ganga espiritual com que minha percepção o revestia” (Bazin, 2018a, p.34), de ver o mundo do exterior de nós mesmos, é situada por Cavell dentro de um diagnóstico histórico-filosófico da modernidade, cujo centro é a experiência do ceticismo moderno e a noção de sujeito e de representação que ele deu origem. O cinema ofereceria uma “neutralização miraculosa da necessidade de se conectar com a realidade pela representação” (Cavell, 1979, p. 195), que define a experiência cética. Se a fotografia satisfaz um desejo, diz Cavell, é o desejo (moderno) de “escapar da subjetividade” (Cavell, 1979, p.32), alcançando o mundo ele mesmo.

    3) O automatismo do cinema diz respeito em Cavell tanto à “ausência da mão humana na formação desses objetos”, quanto à “ausência de suas criaturas na sua exibição” (Cavell, 1979, p.73), acrescentando uma dimensão ao problema que não havia sido central para Bazin. O cinema garante, automaticamente, para Cavell, a presença de um mundo sem que estejamos presentes para ele. Ele “permite a audiência estar mecanicamente ausente” (Cavell, 1979, p.25). A condição de “ver sem ser visto” do espectador do cinema permite estabelecer a conexão com a realidade às custas de nossa “absoluta distância e isolamento” (Cavell, 1979, p.195). O tema Baziniano da ausência do homem é recolocado por Cavell, portanto, como um problema da relação entre espectador e tela.

Bibliografia

    AUSTIN, J.L. Sentido e Percepção. São Paulo: Martins Fontes, 2021.
    BAZIN, André. O que é cinema? São Paulo: Ubu, 2018a.
    ______. Écrits Complets I. Paris: Macula Editions, 2018b.
    ______. Écrits Complets II. Paris: Macula Editions, 2018c.
    CAVELL, Stanley. The World Viewed. Cambridge: Havard University Press, 1979.
    ______. Must we mean what we say?. Cambridge: Cambridge University Press, 2015.
    ______. The claim of reason. Oxford: Oxford University Press, 1999.
    MARRATI, Paula. Imagem e ceticismo: sobre o vínculo entre cinema e realidade na obra de Stanley Cavell. Educação e Realidade, vol.33, jan/jun de 2008.
    MORGAN, Daniel. Rethinking Bazin: Ontology and Realist Aesthetics. Critical Inquiry, Vol. 32, n.3, Spring, 2006.
    MULHALL, Stephen. Stanley Cavell: philosophy’s recounting of the ordinary. Oxford : Clarendon Press, 1999.
    ROTHMAN, William (Ed.). Cavell on Film. New York: SUNY Press, 2005.
    ______. Bazin as a cavellian realist. Film International, Vol 5, Issue 30, 2007.