Ficha do Proponente
Proponente
- Marina Soler Jorge (UNIFESP)
Minicurrículo
- Marina Soler Jorge é professora associada do Departamento de História da Arte da UNIFESP e do PPG em História da Arte da UNIFESP. Tem pesquisas na área de cinema e audiovisual brasileiro e latino-americano, feminismo na cultura de massas e tem se dedicado à pesquisa de produções audiovisuais chinesas contemporâneas. Coordena junto com a professora Michiko Okano o Grupo de Estudos de Arte Sino-Japonesa da UNIFESP. Professora visitante na Nanjing Normal University.
Ficha do Trabalho
Título
- Tempo, Espaço e História nas Adaptações de O Problema dos Três Corpos
Mesa
- Do “espaço negativo” ao “espaço sideral”
Formato
- Presencial
Resumo
- Em 2006 o escritor chinês Liu Cixin publica, na China, O Problema dos Três Corpos, romance de ficção científica. A boa recepção de público e crítica do primeiro livro garante a publicação do segundo e do terceiro volumes, respectivamente denominados A Floresta Sombria e O Fim da Morte. Nesta comunicação, cotejaremos aspectos relativos ao tempo, espaço e história presentes na trilogia e em suas duas adaptações audiovisuais (Tencent Vídeo e Netflix).
Resumo expandido
- “Lembrança do Passado na Terra”, mais conhecida pelo nome do primeiro livro, “O Problema dos Três Corpos”, é uma trilogia literária de ficção científica (FC) escrita por Liu Cixin, engenheiro e escritor nascido em Pequim em 1963. Ganhadora de diversos prêmio na China e fora dela, a trilogia foi calorosamente recebida pelo governo chinês, uma vez que demonstrava que os escritores do país podiam se destacar em um gênero literário pouco usual no país.
Como o próprio nome da trilogia sugere – “Lembrança do Passado na Terra” – a dimensão temporal ocupa um lugar importante na narrativa. Diversos exemplos podem ser dados nesse sentido. No primeiro livro, “O Problema dos Três Corpos”, a Terra descobre que sofrerá uma invasão alienígena de uma civilização muito mais avançada tecnologicamente, mas isso só ocorrerá daqui a 421 anos. Refletir sobre como a humanidade deve se preparar para um evento tão distante no tempo enseja interessantes especulações sociológicas, filosóficas e políticas na obra. O segundo livro, “A Floresta Sombria”, se passa 200 anos depois, quando a humanidade, surpreendentemente, não caiu na depressão coletiva e, ao contrário, está sofrendo de um perigoso otimismo a respeito de suas capacidades de combater os trisolarianos. Aqui, também, Liu Cixin especula sociologicamente sobre o efeito da passagem de tempo em uma Terra agora modificada tecnológica e geopoliticamente pela ameaça de invasão alienígena. O terceiro livro, “O Fim da Morte”, se passa em centenas, milhares e milhões de anos após nosso tempo atual, quando não apenas o Sistema Solar mas todo o universo sofreu as consequências da passagem do tempo e da compressão do espaço em duas dimensões.
Ainda que muitos comentadores – especialmente os não-acadêmicos – se refiram comumente à obra como sendo uma FC “hard”, trata-se em realidade de uma combinação de “hard” e “soft” FC. Por um lado, os livros oferecem descrições científicas e tecnológicas bastante detalhadas, mas as consequências sociais, políticas, filosóficas e militares da invasão alienígena rendem alguns dos momentos mais interessantes da narrativa.
Nesta comunicação, abordaremos questões relativas ao tempo, ao espaço e à história presentes sobretudo no primeiro livro e em suas adaptações audiovisuais. Tempo e espaço, aqui, estarão referidos aos conceitos usualmente trabalhados pelo gênero FC, mas também à história da China e seu espaço geográfico.
Nesse sentido, as adaptações audiovisuais divergem entre si. A produção chinesa explora aquilo que há de nacional no livro, selecionando temas de interesse do público do país e diminuindo assuntos mais sensíveis ao governo. Já a Netflix, ao procurar dar um caráter “transnacional” e etnicamente “diverso” a sua produção, eliminou da narrativa alguns elementos tipicamente chineses da obra original, ao mesmo tempo em que selecionou aquilo da história da China que melhor apela aos desejos exotizantes do público internacional.
Nesse sentido, discutiremos o modo através do qual as adaptações audiovisuais representam as sucessões das dinastias na China antiga, que no livro funcionam como reflexão sobre a evolução e destruição de civilizações, bem como uma forma da humanidade entender os problemas enfrentados pelos alienígenas.
Também procuraremos entender as temporalidades para além da questão histórica, ou seja, naquilo que ela sugere de reflexão filosófica no livro e suas adaptações. Aqui, será interessante pensar a efemeridade da vida humana, bem como refletir sobre o fato de que a humanidade é um evento absolutamente recente quando consideramos o tempo do universo.
Por fim, refletiremos sobre como a narrativa lida com o fato de a humanidade ter de se preparar para um evento que só ocorrerá daqui a quatro séculos, e o quanto isso está relacionado à longevidade da China enquanto nação e a sua paciência histórica para lidar com mudanças a longo prazo.
Bibliografia
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