Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Tiago Vieira da Silva (CEAA)

Minicurrículo

    Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade do Minho, é docente no curso de Cinema e Audiovisual na Escola Superior Artística do Porto. Investigador integrado no Centro de Estudos Arnaldo Araújo (CEAA/ESAP), e investigador colaborador no Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS/UMinho). Tem investigado e publicado artigos científicos que incidem na relação entre os média, a memória e as identidades, integrando projetos que se debruçam sobre as mesmas questões.

Coautor

    Isabel Moreira Macedo (CECS/UM)

Ficha do Trabalho

Título

    Os estudos de receção em contexto escolar: cinema, migrações e memória

Formato

    Presencial

Resumo

    O cinema tem um papel relevante na transformação de perceções sobre as dinâmicas sociais. Esta proposta propõe discutir as possibilidades do cinema no âmbito dos estudos de receção em contexto escolar, nomeadamente no que concerne ao debate sobre os fenómenos migratórios e o impacto da memória coletiva. Na discussão, incidiremos na relevância dos grupos focais, convocando dados recolhidos em contexto escolar, já que esta é uma técnica deveras relevante no contexto da investigação-ação.

Resumo expandido

    Apesar de a migração ser um fenómeno global, não pode ser entendida fora do seu contexto sociopolítico (Halbwachs, 1994). À luz do caso português, esta premissa obriga-nos a evocar o legado do passado colonial, aspeto indissociável deste debate – porquanto está diretamente relacionado, por um lado, com a persistência de mitos sobre a gesta dos ‘Descobrimentos’ e, por outro, com a perpetuação de discursos sobre grupos sociais minoritários.
    O lugar da alteridade no contexto português é ocupado, em grande parte, por pessoas migrantes originárias dos países outrora colonizados por Portugal e seus descendentes, muitos dos quais cidadãos e cidadãs portugueses que não veem a sua nacionalidade reconhecida pela sociedade e são, deste modo, alvo de discriminação quotidiana.
    Esta proposta, dando continuidade a um trabalho que vem sendo desenvolvido por ambos os investigadores em contextos distintos, assinala a sua urgência face à proliferação destas perceções em Portugal, cujo viés discriminatório passou também a contaminar o discurso político – fenómeno diretamente relacionado com a ascensão, desde 2019, de um partido político que tem vindo a usar a posição anti-imigração como um dos seus fundamentos ideológicos.
    A presente proposta propõe discutir as possibilidades do cinema no âmbito dos estudos de receção em contexto escolar, nomeadamente no que concerne os fenómenos migratórios. Assim, atentamos ao papel da memória como forma de ativismo, no sentido em que a discussão estratégica do passado através de imagens e narrativas de alteridade é uma forma de pugnar contra o esquecimento de histórias e experiências que acabam invisibilizadas no seio dos discursos hegemónicos.
    Neste âmbito, consideramos os grupos focais uma técnica deveras relevante, nomeadamente no contexto da investigação-ação: os participantes não apenas revelam qual a sua perceção ante determinado tópico, como também interagem e são confrontados com as perceções de outros. Convocaremos, na nossa discussão, dados recolhidos em grupos focais desenvolvidos em contexto escolar, nos quais participaram 62 estudantes: a maioria possuía nacionalidade portuguesa (90.3%), seguidos pela nacionalidade brasileira (4.8%), com idades entre 14 e 19 anos (M=16; SD=1.0), sendo que a maioria dos participantes (65.6%) se identificou como pertencendo ao género feminino.
    Durante os grupos focais, os estudantes visionaram a curta-metragem Nha Sunhu (José Magro, 2021), que segue o dia-a-dia de Issa, um jogador de futebol guineense que joga em Portugal. Trata-se de um faux documentaire que se centra nas dificuldades enfrentadas pelas pessoas que se encontram na mesma condição do protagonista, sobretudo o sentimento de não pertença. Por outro lado, a forma como a obra representa o personagem pretende ser uma metáfora para os modos de representação estereotipados sobre o “Outro”, porquanto o realizador interfere permanentemente ao longo do filme, condicionando o discurso e as decisões de Issa. É este o aspeto que, a nosso ver, justifica a escolha do formato do falso documentário, levantando questões que remetem tanto para os debates sobre a ontologia deste género como para os debates sobre os lugares de fala.
    Após o visionamento, os estudantes foram divididos em grupos de seis elementos, discutindo tópicos múltiplos: hábitos de cinefilia, perceções sobre o filme visionado e, por fim, perceções sobre os fenómenos da migração e o peso do passado. Cremos que o cinema tem um papel incontornável neste âmbito; assim, através dos estudos de receção, auscultamos de que forma é que o cinema pode influir na perceção de tópicos tão prementes como os previamente referidos. Ao envolverem-se com outras histórias, outras experiências, outros/as sujeitos/as, jovens estudantes podem participar também da reformulação da memória – transformando a própria sociedade.

Bibliografia

    – Adichie, C.N. (2009). The danger of a single story.Companhia das Letras.
    – Cabecinhas, R.(2022).Outras histórias.Ativismos mnemónicos,género e interseccionalidades. In M. Ledo-Andión, M.P. Pereiro, S.R. Baamonde & M.S. Barreiro(Eds.), CO(M)XÉNERO. Cadernos de Comunicación e Xénero,2(pp. 15-35). Via Láctea.
    – Mbembe, A. (2015). Decolonizing Knowledge and the Question of the Archive(spoken texto), contributed by Angela Okune,Platform for Experimental Collaborative Ethnography.
    – Macedo, I., Lins, L., Vieira da Silva, T., & Cabecinhas, R (2023). Exploring images of otherness through cinema. Analysis of counter-visualities in Portuguese films. Papers on Social Representations, 32(2), 1.1-1.27.
    – Pereira, A. C., Sales, M. & Cabecinhas, R. (2020). (In)visibilidades: imagem e racismo. Vista, 6, 9-19
    – Vala, J., Brito, R. & Lopes, D. (2015). Expressões dos racismos em Portugal(2ndedition). Imprensa de Ciências Sociais.