Ficha do Proponente
Proponente
- Roberto Robalinho Lima (UFRJ)
Minicurrículo
- Pós Doutorando em Comunicação no Programa de Pós Graduação em Comunicação da Escola de Comunicação da UFRJ onde desenvolve a pesquisa “Imagem Naturezas: contra-visualidades no Antropoceno”. Foi pós doutor na Universidade de Tübingen com a pesquisa “Imagem insuportável: território e ação política no Sul Global”. Participou do programa de pós doutorado de excelência Teach@Tübingen na Universidade de Tübingen em 2018 como professor visitante. Doutor em Comunicação pelo PPGCOM – UFF em 2017.
Ficha do Trabalho
Título
- “Não consigo respirar”: o olhar oposicional e a restituição do corpo à
Seminário
- Cinemas decoloniais, periféricos e das naturezas
Formato
- Presencial
Resumo
- Propomos uma remontagem das peças do assassinato de George Floyd e dos protestos do Black Live Matters na primavera / verão de 2020 nos EUA. Como, a adolescente Darlene Frasier, ao gravar o assassinato de Floyd, desarranja uma visualidade hegemônica, racial e colonial? De que forma, atomiza uma experiência sensível, restituindo o corpo à palavra? Mais do que expor a violência racial, propomos que a imagem de Floyd, atualiza um devir negro reivindicando o “direito universal em respirar”.
Resumo expandido
- No dia 25 de maio de 2020, na cidade de Minneapolis, George Floyd, 46 anos, homem negro, que tinha acabado de perder seu emprego de segurança por conta da Pandemia do Corona vírus, entrou em uma loja para comprar cigarros. Logo depois, o funcionário da loja liga para polícia e diz que um homem comprou cigarros com uma nota falsa de 20 dólares, ele também afirma que o homem está bêbado e fora de controle. Quatro policiais abordam Floyd que se recusa a entrar no carro da polícia, os policiais o algemam e o imobilizam no chão. Apesar dos apelos de Floyd, dizendo que não consegue respirar (16 vezes), um dos policiais continua pressionando seu joelho contra seu pescoço até que Floyd morre sufocado. Próximo da cena, a adolescente negra, Darlene Frazier, grava os últimos minutos de vida de George Floyd e compartilha as imagens nas redes sociais.
A circulação nas redes sociais da imagem de Floyd, onde é possível escutar quando diz que não consegue respirar, provocaram uma série de protestos durante a primavera e o verão de 2020 nos Estados Unidos. Os protestos foram intensos e se estenderam por várias cidades americanas. Uma série de propostas e invenções políticas surgiram das multidões, propostas tão radicais como a extinção das forças policiais de Minneapolis.
Mas esta, não foi a primeira vez que imagens de um homem negro sendo assassinado por forças policiais circularam pela mídia ou pelas redes sociais. Basta lembrar da morte de Michael Brown em Fergusson (2016) e Eric Garner em Nova Iorque (2014) que, não por acaso, também foi sufocado mesmo após dizer que não conseguia respirar. E é impossível esquecer do caso icônico de Rodney King em 1992, que foi filmado por um cinegrafista amador em VHS quando era espancado por policiais em Los Angeles. Neste caso, como aponta Bill Nichols (1994), os advogados de defesa utilizaram as imagens para argumentar contra King. Na corte, em uma análise quadro a quadro das imagens, defendiam que King era uma ameaça e resistia à prisão. Foi o resultado favorável aos policiais no processo 14 meses após o espancamento que provocou às riots de Los Angeles.
No caso de Floyd, foi diferente, as imagens, postadas imediatamente no momento da morte, produziram não apenas um verão de protestos intensos, mas foram fundamentais na condenação dos policiais. O que mudou, para que estas imagens se tornassem disruptivas? Uma pista está na fala de Darlene Frazier um ano após a morte de Floyd após o julgamento. Ao ser perguntada porque ela gravou as imagens ela respondeu: “quando olho para George Floyd, olho para meu pai, olho para meus irmãos, olho para meus primos, meus tios.”. O fato dela ressaltar o gesto de olhar não é mera coincidência, há um claro enfrentamento subversivo no ato de olhar que se conecta com o que diz Bell Hooks em seu célebre ensaio Olhar oposicional – “Não irei olhar apenas. Eu quero que meu olhar mude a realidade” (1992, p.116).
A proposta desta fala é remontar as peças da morte de George Floyd para compreender como o olhar oposicional de Darlene é capaz de atualizar em um determinado contexto um devir negro (Mbembe, 2017) que contagia a todos e produz a faísca da sublevação nas ruas. De que forma, a produção e circulação daquela imagem, a partir de uma série de atores, tensiona uma visualidade hegemônica racializada e uma estrutura colonial de poder? Como o gesto atomiza uma experiência sensível da pandemia (e do capitalismo contemporâneo) restituindo a palavra ao corpo – ao ecoar por todo o mundo o sufocamento de George Floyd e sua última frase “não consigo respirar”? Afinal, mais do que expor a brutalidade da violência racial americana, o vídeo de Darlene, também atravessa a todos, humanos e não humanos, no mais elementar dos direitos, naquilo que Mbembe chamou de “direito universal em respirar” (2021).
Bibliografia
- HOOKS, Bell. Race and representation. South End Press, Boston, 1992.
NICHOLS, Bill. Blurred boundaries. Indiana University Press, 1994.
MBEMBE, Achille. Critique of black reason. Duke University Press, London, 2017.
_________________. The universal right to breathe. Critical Inquiry 47, Chicago, Inverno 2021.