Ficha do Proponente
Proponente
- Luíza Beatriz Amorim Melo Alvim (USP)
Minicurrículo
- Doutora em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com período sanduíche na Universidade Paris 3, sob orientação de Michel Chion. Doutora em Música pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e pós-doutora em Música pela UFRJ. Autora do livro “A música no cinema de Robert Bresson”. Atualmente, faz pós-doutorado no Programa de Meios e Processos Audiovisuais da USP, com projeto sobre o uso da música clássica em diretores autorais contemporâneos.
Ficha do Trabalho
Título
- Estilo e música clássica em filmes de autor italianos dos anos 2010
Seminário
- Estilo e som no audiovisual
Formato
- Presencial
Resumo
- Analisamos características estéticas encontradas em filmes autorais italianos contemporâneos, mapeados nas mostras principais dos festivais de Berlim, Cannes e Veneza de 2011 a 2020. São elas: presença de música contemporânea, especialmente “neotonal” ou minimalista, com destaque para o compositor Arvo Pärt; quase ausência de música de Vivaldi, diferentemente do cinema contemporâneo em geral; uso do repertório operístico, porém, de modos distintos aos descritos por Dyer (2006) no cinema moderno.
Resumo expandido
- Este trabalho faz parte de uma pesquisa de pós-doutorado sobre o uso de música clássica em filmes autorais dos anos 2010. Como metodologia, foram mapeadas as mostras principais dos festivais de Cannes, Veneza e Berlim de 2011 a 2020. Os filmes encontrados foram colocados dentro de grupos separados por nacionalidade do/a diretor/a e destacamos o grupo de filmes italianos pelas seguintes características: grande presença de música contemporânea, com destaque para o compositor estoniano Arvo Pärt, quase ausência de música de Vivaldi e uso do repertório operístico. O objetivo deste trabalho é balizar cada uma dessas características junto à teoria e aos resultados da análise dos filmes. O corpus teve o número relativamente grande de 19 filmes, algo relacionado com o fato de que um dos festivais pesquisados ocorre na Itália, sendo que os festivais obedecem a lógicas curatoriais geo-políticas (DE VALCK, 2007).
Destacamos a “quase ausência de música de Vivaldi” porque a presença do Barroco é uma característica geral da música no cinema do pós-guerra, como observado por Greig (2021), e o autor indica um revival de Vivaldi a partir de então. Era de se esperar um uso tão insistente de suas Quatro Estações quanto observamos no cinema francês de autor do mesmo período, mas o único filme do corpus com elas é “Irmãos à italiana” (Claudio Noce, 2020), em que há arranjos do “Verão” ao longo do filme. Além deste filme, o Barroco só se faz presente em “Lazzaro Felice” (Alice Rorhwacher, 2018), mas são obras do barroco alemão J.S. Bach, e, num filme de fantasia de época, “Contos dos contos” (Matteo Garrone, 2015), com Monteverdi e Frescobaldi para ambientação diegética.
Quanto ao uso de música contemporânea, destacamos a presença do “efeito Arvo Pärt” observado por Michel Chion (2019) no cinema contemporâneo em geral. Músicas do compositor estão em “Habemus Papam” (2011) e “Mia Madre” (2015), de Nanni Moretti, em “This must be the place” (2011) e em “A grande beleza” (2013) de Paolo Sorrentino, e em “A espera” (2015), de Piero Messina (assistente de Sorrentino em “A grande beleza”). Greig engloba Pärt e outros compositores minimalistas como um “Novo Barroco”, aproximando características dos dois movimentos, como a associação de significados a religiosidade e a importância das texturas. Há no nosso corpus outros compositores minimalistas, como John Adams em “The bigger splash”(2015), de Luca Guadagnino, assim como Philip Glass em “Mia Madre”. Maimets-Volt (2013) observa uma utilização de obras de Pärt em filmes com personagens com problemas existenciais e de luto, aspectos comuns aos filmes citados. No caso específico de “A grande beleza”, Sorrentino age como um DJ, compilando uma série de obras (VALENTINI, 2020), sendo parte delas considerada música clássica contemporânea. Porém, elas têm características minimalistas ou são músicas “neo-tonais”, bem ao gosto do catálogo da gravadora ECM, o que as tornam mais palatáveis e emocionais para um grande público do que músicas atonais, tradicionalmente associadas a clichês de suspense.
Sobre a ópera, extremamente presente na cultura italiana, Dyer (2006) notava que, na época do Neo-Realismo, ela normalmente era diegética e, por vezes, com significados irônicos, como em filmes de Visconti. No corpus atual, observamos que há também uma busca para um uso além do óbvio, porém de modo distinto. Em “Lazzaro Felice”, árias famosas de La Traviata e Norma chamam a atenção por estarem em versões instrumentais e, por vezes, extradiegéticas. Em “O traidor” (Marco Bellocchio, 2019), o famoso coro de Nabucco de Verdi – quase um segundo hino nacional da Itália – está como música extradiegética na sequência crucial da condenação dos mafiosos, como se a música indicasse uma vitória da Itália, para além da Sicília (BELLOCCHIO, s/d). Em “Leopardi” (Mario Martone, 2014), filme de época, há muita música sacra de Rossini e somente dois momentos diegéticos de uma ópera pouco conhecida do compositor.
Bibliografia
- BELLOCCHIO, M. Tyed together by the moon (entrevista cedida a Anne-Katrin Tietze), s/d. Disponível em: https://bit.ly/4clu3LM Acesso em 17 mar. 2024.
CHION, M. La musique au cinéma: les chemins de la musique. 2. ed. rev. e aum. Paris: Fayard, 2019.
DE VALCK, M. Film Festivals: From European Geopolitics to Global Cinephilia. Amsterdam: Amsterdam University Press, 2007.
DYER, R. Music, people and reality: the case of Italian neo-realism. In: MERA, M.; BURNAND, D. (ed.). European Film Music. Hampshire: Ashgate, 2006.
GREIG, D. Baroque Music in Post-War Cinema: Performance Practice and Musical Style. Cambridge: Cambridge University Press, 2021.
MAIMETS-VOLT, K. Arvo Pärt’s Tintinnabuli Music in Film. Music and the Moving Image, v. 6, n. 1, p. 55-71, 2013.
VALENTINI, P. Un DJ set d’autore: pratiche compilative nel cinema di Paolo Sorrentino. Schermi: Storiee culture del cinema e dei media in Italia, v. 4, n. 7, 2020.