Ficha do Proponente
Proponente
- Vinicius Augusto Carvalho (ESPM-Rio)
Minicurrículo
- Doutor em Cinema e Audiovisual pelo PPGCINE da UFF e jornalista formado pela UFSC, com mestrado em Economia Criativa (ESPM) e especialização em TV Digital, Radiodifusão e Novas Mídias de Comunicação Eletrônica (UFF). Professor na ESPM-Rio desde 2014 onde coordena o Portal de Jornalismo. Após 13 anos de TV Globo, editando e finalizando produtos audiovisuais jornalísticos e de entretenimento, dirigiu e montou curtas-metragens e hoje atua como editor em peças audiovisuais de comunicação da Netflix.
Ficha do Trabalho
Título
- Vorkapich: a “sequência de transição” na montagem brasileira de ficção
Formato
- Presencial
Resumo
- O cineasta Slavko Vorkapich (1894-1976) foi pioneiro na realização de “montage sequences”. A “sequência de transição”, como pode ser traduzida, explora o potencial visual e expressivo dos planos e efeitos de transição em busca de uma linguagem dinâmica. A partir de um levantamento em 235 longas-metragens brasileiros de ficção, esse estudo revela tendências e características estruturais e estéticas relacionadas ao uso desta técnica e propõe um debate sobre o uso deste recurso no cinema nacional.
Resumo expandido
- Desde os primeiros filmes, cineastas agenciam imagens e “recursos virtuais” (ARIJON, 1976) em busca de narrativas que sensibilizem o espectador. A escolha do estilo e da forma da junção entre segmentos como gesto de montagem pode estabelecer continuidades, saltos no tempo, deslocamentos espaciais. Esta investigação lança um olhar sobre a “sequência de transição” (montage sequence) – uma estratégia de edição utilizada para narrar e conectar segmentos – presente na história da cinematografia brasileira de longas-metragens de ficção. Bordwell (2008) define este recurso de narração como “gancho”, sinaliza que ele pode ser responsável pela coesão entre trechos e destaca que, como um dispositivo de contar histórias, afeta tanto a estrutura quanto a estética do enredo. Balàzs (1952) sublinha que, ao pontuar uma narrativa com uma “sequência de transição”, o narrador, autor e/ou cineasta estão falando com o espectador. O cineasta canadense Edward Dmytryk (1984) chama o arranjo de “Hollywood montage” (montagem de Hollywood, numa tradução literal) para diferenciar da versão desenvolvida pelos cineastas russos na década de 1920. Para Dmytryk, o recurso hollywoodiano de montagem estabelece, invariavelmente, uma transição. A “sequência de transição” pode ser uma série de planos costurados com fusões e costuma estar sempre destacada musicalmente. “É, na verdade, uma versão mais complicada, e frequentemente mais pretensiosa da fusão.” (DMYTRYK, 1984).
Uma pesquisa histórica sobre este gesto de montagem aponta para as teorias cinematográficas e produções audiovisuais de Slavko Vorkapich. O montador sérvio, nascido na antiga Iugoslávia em 1894, trabalhou como diretor e editor em Hollywood nas décadas de 1920, 1930 e 1940. A produção cinematográfica de Vorkapich foi bastante concentrada na elaboração de “sequências de transição” para filmes comerciais estadunidenses de alguns dos principais estúdios hollywoodianos (Columbia, Paramount, MGM). Reisz e Millar (1978) contam que a edição destas “peças” podia incrementar a montagem e que, muitas vezes, Vorkapich filmava e montava uma “sequência de transição” (montage sequence) de acordo com as especificações fornecidas pelo roteirista, e o resultado era em seguida inserido no filme como uma guloseima em meio a um jantar. “A ideia era dar ao espectador uma pausa visual para compensá-lo do excesso de diálogo.” (REISZ e MILLAR, 1978, p. 288).
Em seus textos sobre direção e montagem, Vorkapich defendia o cinema como uma forma de arte distinta. Ele criticava a apropriação de convenções estéticas de outras mídias (como literatura ou teatro) na técnica de filmagem porque, em sua opinião, essa prática restringia severamente a exploração criativa do potencial singular que envolvia a realização de um filme. Para Vorkapich, a essência da linguagem cinematográfica era o movimento e o cinema, ao descobrir seu potencial narrativo, buscou inspiração em linguagens não cinéticas, o que para ele era um equívoco. A “sequência de transição” chegou a ser chamada, simplesmente, de “Vorkapich” (BIESEN, 2015) por diretores da época, nos momentos em que o enredo pedia uma sinalização visual para apontar mudanças espaciais e/ou temporais, ou ainda quando requeriam que uma atmosfera fosse estabelecida rapidamente.
Para este estudo, foram investigados 235 longas-metragens brasileiros de ficção, uma amostra diacrônica que abrange gêneros, diretores e montadores diversos entre 1930 e 2019. Neles, foram encontradas 185 “sequências de transição”, número que representa 6% das pontuações visíveis detectadas na amostra e que aponta, portanto, uma preferência dos cineastas por fades, fusões e wipes isolados na ligação de segmentos imagético-sonoros. O levantamento e a análise dos “Vorkapichs” suscitam reflexões e promovem o debate acerca de atributos estéticos e sintáticos expressos na edição destas “peças” e apontam um aumento da influência rítmica e simbólica das “sequências de transição” na montagem nacional com o passar dos anos.
Bibliografia
- ARIJON, D. Film punctuation. In: Grammar of the film language. Los Angeles: Silman-James Press, 1976.
BALÁZS, B. Theory of the film: Character and growth of a new art. Londres: Dennis Dobson LTD, 1952. BIESEN, S. C. ‘Kinesthesis’ and Cinematic Montage: An Historical Examination of the Film Theories and Avant-Garde Mediation of Slavko Vorkapich in Hollywood. In: Studies in Visual Arts and Communication: an international journal Vol 2, Nº. 1, 2015.
BORDWELL, D. The Hook: Scene Transitions in Classical Cinema. David Bordwell’s website on cinema, 2008.
DMYTRYK, E. On film editing. Boston; London: Focal Press, 1984.
REISZ, K.; MILLAR, G. A técnica da montagem cinematográfica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
VORKAPICH, S. Cinematics: some principles underlying effective cinematography. In: Cinematographic Annual 1930. Hollywood, EUA: ASCA, 1930.
VORKAPICH, S. Toward True Cinema. In: MACCANN, R. D. Film: a montage of theories. Nova Iorque, EUA: E. P. Dutton, 1966.