Trabalhos aprovados 2024

Ficha do Proponente

Proponente

    Luiz Fernando Wlian (UNESP)

Minicurrículo

    Pesquisador em Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Mestre em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesquisa gênero musical no cinema e estéticas queer. Atualmente pesquisa estéticas queer no cinema brasileiro contemporâneo.

Ficha do Trabalho

Título

    “So much more than this provincial life”: um ensaio não-teleológico

Formato

    Presencial

Resumo

    Este trabalho busca tecer uma constelação fílmica (Souto, 2020) de um ponto de vista queer. Ao nos debruçarmos sobre um pequeno grupo de filmes, valorizamos momentos de encenação detida no presente, bem como o possível caráter disruptivo e não-teleológico destes. O que um modo de encenação queer, ou a leitura queer de uma encenação, podem nos dizer sobre os filmes? Tomamos as obras Beauty and the Beast (1991), Hedwig and the Angry Inch (2001), Tatuagem (2013) e Desaprender a Dormir (2021).

Resumo expandido

    “I want much more than this provincial life”. Na versão em português: “Eu quero mais que a vida do interior”. O verso cantado pela personagem Bela, em número musical da animação “Beauty and the Beast” (Gary Trousdale, Kirk Wise, 1991) é cintilante ponto de partida para uma constelação que, tal qual a personagem cantante, rodopia e gira no lugar, sem apontar um destino restrito. A wish-song do filme da Disney, que nos convida a desejar “algo mais”, algo nem sempre conhecido ou descritível, abre caminho para cantos e desejos ainda mais estranhos, que cintilam nos filmes “Hedwig and the Angry Inch” (John Cameron Mitchell, 2001), “Tatuagem” (Hilton Lacerda, 2013) e “Desaprender a Dormir” (Gustavo Vinagre, 2021).
    Neste trabalho, de cunho ensaístico, valho-me de uma constelação fílmica (Souto, 2020) inspirada por uma leitura queer (De Lauretis, 2011; Barbosa, 2017; Ahmed, 2006), alinhada com teorias sobre cinema e afeto (Del Río, 2008; Vieira Jr., 2018) que valorizam a performance e a materialidade das encenações fílmicas, além de compreender o corpo espectatorial – e o corpo do leitor – como importante chave da análise. Ao trazer uma sensibilidade dissidente e dispô-la diante dos filmes, intento tecer comentários sobre as encenações queer que propõem, bem como confabular sobre o que há de queer em suas imagens e sons. Afinal, o que liga um filme como a animação hollywoodiana “Beauty and the Beast” ao filme “Desaprender a Dormir”, do cineasta brasileiro queer Gustavo Vinagre? Como filmes separados pelo tempo, pela nacionalidade, pelo gênero, pela temática, pelo público etc., podem compartilhar uma mesma sensibilidade? Um olhar dissidente pode nos ajudar a desenhar os traços dessa constelação.
    A partir da inquietação diante de possíveis semelhanças entre os quatro filmes propostos, bem como do fato de que a conexão entre eles se dá, especialmente, pelo que eles têm de dissidente, valorizo momentos de encenação detida no presente e em seu possível caráter disruptivo e não-teleológico. De números musicais a cenas de performance sexual, observo momentos em que os corpos fílmicos estão suspensos no presente, fazem elogio ao presente ao nos manter sensorialmente ligados à cena e, no limite, intentam borrar qualquer possibilidade teleológica ou mecanismo de causa e efeito para além do experenciado no “aqui e agora” das imagens e sons, um “aqui e agora” intensamente afetivo que parece não se preocupar com o que virá depois, com o “telos” narrativo. Creio ver nesse viés não-teleológico mais do que uma ruptura para com modelos narrativos clássicos de causa e efeito, mas também um elogio à improdutividade, à inconsciência, à indiscernibilidade, termos que dialogam de modo profícuo com uma sensibilidade queer (De Lauretis, 2011; Barbosa, 2017).
    Ao fazer uma leitura dissidente dos filmes e entrelaçá-los justamente pelo que neles faz “elogio ao indiscernível” (Wlian, 2023); pelo seu estímulo à desmedida, ao estranho, ao que não pode ser contido e economizado, busco defender uma disputa sensível especificamente queer do cinema e audiovisual, uma disputa sensível que dê a ver e a ouvir sensibilidades dissidentes capazes de mobilizar novas imagens e sons, forjar resistências e modos diversos de vida frente ao contexto contemporâneo. Acredito que tal disputa possa ser substrato à apropriação do cinema e audiovisual para nele encarnar modos outros de ser, de sentir e de estar no mundo, modos esses que, longe de serem “antiestéticos” ou “antitecnológicos”, podem se valer largamente da estesia e da tecnologia – em especial, a audiovisual – para emprestar a ela seu caráter não-teleológico, indiscernível, queer.
    Desse modo, este trabalho, de cunho sobremaneira estético, intenta ver na experiência estética diante dos filmes modos de sensibilidade que possam trazer imbuídos em si uma ética e modo outro de ser na contemporaneidade.

Bibliografia

    AHMED, Sara. Queer phenomenology: orientations, objects, others. Durham: Duke University Press, 2006.

    BARBOSA, André A. Constelações da frivolidade no cinema brasileiro contemporâneo. Tese (Doutorado). Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.

    DE LAURETIS, Teresa. Queer texts, bad habits, and the issue of a future. GLQ: A Journal of Lesbian and Gay Studies, 17/2-3, 2011.

    DEL RÍO, Elena. Deleuze and the cinemas of performance: powers of affection. Edinburg: Edinburg University Press, 2008.

    SOUTO, Mariana. Constelações fílmicas: um método comparatista no cinema. Galáxia, n. 45, set-dez, 2020, p. 153-165.

    VIEIRA JR., Erly. “Sensorialidades queer no cinema contemporâneo: precariedade e intimidade como formas de resistência”. Contemporânea, Comunicação e Cultura, v.16, n. 01, jan-abr 2018.

    WLIAN, L. F. O gozo dos sonâmbulos e o elixir do sono: sensibilidades dissidentes no cinema queer contemporâneo. A Barca, v. 1, n. 1, p. 188-205, 25 ago. 2023.