Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Melina Mello Chagas Bomfim (UFRB)

Minicurrículo

    Melina Bomfim é baiana e brasiliense. Mãe, atua como realizadora, pesquisadora, curadora e produtora de mostras, festivais e espaços de formação cinematográficos. É formada em Comunicação Social (UCB), tem Especialização em Documentário Criativo no Observatorio del Cine (ARG) e é Mestranda em Comunicação (UFRB). É co-fundadora do Festival Internacional Kilombinho. Desde 2020, faz parte da coordenação do laboratório de desenvolvimento de projetos, Lab Negras Narrativas, realização da APAN.

Ficha do Trabalho

Título

    Audiovisual Negro: uma abordagem curatorial materna em desenvolvimento

Seminário

    Festivais e mostras de cinema e audiovisual

Formato

    Presencial

Resumo

    Este resumo descreve o desenvolvimento de uma metodologia de abordagem curatorial materna e sua dimensão performática (MARTINS, 2021) com cinemas negros. Na ampliação do conceito e dos diálogos de fronteira (BISPO, 2019) inspirada nos métodos de escuta e abordagem participativa de um festival brasileiro, um latinoamericano; e um sulafricano para propor, realizar e narrar a construção do Festival Internacional Kilombinho – audiovisual negro com crianças, crias e comunidades.

Resumo expandido

    Em janeiro de 2023 aconteceu o Fórum de Tiradentes, que propiciou o encontro entre agentes e entidades públicas do audiovisual. Entre as presenças, destaco a participação da ministra do STF, Cármem Lúcia, e da Secretária do Audiovisual, Joelma Gonzaga. Ambas convocaram em suas falas de abertura as relações entre o audiovisual e suas memórias de infância. A ministra Cármen Lúcia, rememora a primeira vez que foi ao cinema com menos de sete anos. Enfatiza os passeios que reverberavam “por dias e dias e nos sonhos”. A secretária Joelma Gonzaga, filha de uma família de quatorze filhos, assistia filmes nos vizinhos. Seu pai exigia um horário rígido de retorno, o que fazia com que ela e seus irmãos nunca assistissem aos finais dos filmes.
    Como mulher negra, irmã mais velha e mãe de menino negro, vivo a preocupação daquele pai. Conecto com as falas de abertura do fórum, recordando as minhas memórias imagéticas de menina negra e como mãe. Assisto cotidianamente o impacto que as imagens e sons têm nos comportamentos, ações, modos de falar, sotaques, e mundos de pesquisa domésticos ou infraordinários (CAMPT, 2017) que se abrem a partir dos conteúdos visionados e vividos por meu filho. Visíveis desdobramentos na formação da sua identidade.
    Numa dinâmica consciente da minha “função materna” que para Lélia Gonzalez “diz respeito à internalização de valores, ao ensino da língua materna e a uma série de outras coisas mais que vão fazer parte do imaginário da gente (GONZALEZ, 1979c). E da vivência que nos ensina desde muito cedo que “crianças negras não possuem infância, elas passam a ser “menores” ou qualquer outra classificação coisificante.” (Nogueira, 2020). Me coloco a pensar como usar as narrativas audiovisuais negras em suas dimensões fronteiriças (BISPO, 2019) para criar espaços de diálogos, inicialmente, em casa.
    A pesquisa relata os processos de mapeamento domésticos e a experiência de uso de obras audiovisuais a partir de uma “curadoria materna”. Em seguida, descreve o movimento de ampliação da abordagem conceitual com a proposição e realização da primeira edição do Festival Internacional Kilombinho – audiovisual negro com crianças, crias e comunidades. Ele nasce com o objetivo de visualizar e fabular infâncias e juventudes negras livres por meio de imagens. Aliando arte e cidadania, propõe uma “política de múltiplas negruras” (MARTINS, 2020).
    Um desdobramento possível da “curadoria materna” seria pensar a curadoria participativa, ou de impacto, que se propõe a fazer uma leitura das demandas das infâncias e dos territórios (a que se dedica) e dessa forma propor cinematografias. Orientada pela compreensão do ofício curatorial como um modo de “radiestesia” (CESAR, 2020). Daí nasce o segundo movimento que será o relatado a partir das abordagens de três festivais: o Festival Internacional de Cinema Comunitário Afro Kunta Kinte da Colômbia; o projeto “Cinema em Vizinhança” executado dentro do Festival de Documentários de Cachoeira, o Cachoeira Doc; e a experiência do Sunshine Cinema, rede de mídia movida a energia solar da África do Sul, multiplicada por curadorias de jovens negros sul-africanos.
    Solos de investigação que nascem no contexto dos cinemas negros que a pesquisadora Tatiana Carvalho Costa nomeará de QuilomboCinema. Um ambiente fértil de múltiplas reflexões a respeito da curadoria. Com o disparador pessoal em Curadoria em Cinema e Audiovisual À Partir da Perspectiva das Mulheres com Amaranta César e Janaína Oliveira no Valongo Festival (2018) e há dois anos participar da formação, idealizada, curada e mediada pela pesquisadora Janaína Oliveira: “Políticas do Olhar: Diálogos sobre Curadoria e Descolonização”.
    Assim como Joelma que voltava para casa imaginando os finais dos filmes que não pôde assistir, vislumbro “O giro do erê que é resistência a toda e qualquer prefiguração de papéis e representação estática de vida. No erê, e com ele, a vida é liberalidade plena.” (SOUZA; CARVALHO, 2021)

Bibliografia

    CARVALHO, Alexandre Filordi; SOUZA, Ellen Lima. O erê e o devir-criança negro: outros possíveis em tempos necropolíticos. chilhood & philosophy, rio de janeiro, v.7, 2021, pp 01-28.
    CAMPT, Tina. Listening to Images/ Tina M Campt. Durham: Duke University Press, 2017.
    CESAR, Amaranta, 2020. Desaguar em cinema: documentário, memória e ação com o
    CachoeiraDoc organizadores, Amaranta Cesar… [et. al.] – Salvador : EDUFBA.
    COSTA, Tatiana. “QuilomboCinema: ficções, fabulações, fissuras” In: Catálogo do 24º forumdoc.bh. Belo Horizonte: Forumdoc, 2020.
    SANTOS, Antônio Bispo. Colonização, quilombo: Modos e Significações. Brasília: AYÔ, 2019.
    HOOKS, Bell. Olhares negros: raça e representação. Rio de Janeiro: Elefante editora, 2019.
    MARTINS, Leda Maria. Performances do tempo espiralar, poéticas do corpo-tela. Rio de Janeiro: Editora Cobogó, v. 3, f. 128, 2021. 256 p.
    GONZALEZ, Lélia, Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. Diáspora Africana: Editora Filhos da África,