Ficha do Proponente
Proponente
- Thalita Cruz Bastos (UVA/UNISUAM)
Minicurrículo
- Pós-doutoranda no PPGCINE/UFF. Professora na ECDD/INFNET nas graduações de Cinema e Audiovisual, Jogos Digitais, Publicidade e Propaganda e Produção Multimídia, professora na UNISUAM graduação de Comunicação Social. Professora na UVA na graduação de Cinema e Audiovisual. Coordenadora do MBA em Produção Audiovisual para Web: do roteiro ao marketing digital (INFNET). Professora na pós-graduação em Produção de Conteúdo Digital da UNISUAM, e na pós em Educação Criativa e Tecnologia no INFNET.
Ficha do Trabalho
Título
- O estatuto do heteropessimismo na cultura pop contemporânea
Seminário
- Tenda Cuir
Formato
- Presencial
Resumo
- Pode a mulher hétero sofrer? A relação entre tragédia da heterossexualidade, o paradoxo da misoginia e o heteropessimismo feminino são a chave de análise para obras audiovisuais da cultura pop contemporânea. Este trabalho propõe refletir sobre como o heteropessimismo não necessariamente produz uma solução para a crise da heterossexualidade, mas aponta seus pontos conflituosos e ensaia alternativas de existências dissidentes, fora da heterossexualidade.
Resumo expandido
- Toda mulher hetero cis já passou por situações de descontentamento com a heterossexualidade e se viu atravessada pelo questionamento: por que permanecer vinculada a heterossexualidade se ela claramente é uma das suas principais fontes de sofrimento? Dentro do contexto dos estudos de gênero e queer existem subdivisões que buscam endereçar não apenas as dissidências, mas aquilo que a sociedade ocidental tradicionalmente lê como norma. Olhar para a heterossexualidade de forma crítica é reproduzir o movimento dos estudos da branquitude e das masculinidades, ou seja, colocar sob a lente analítica um conjunto de comportamentos e práticas sócio-culturais.
A cultura pop audiovisual é o principal palco em que esses valores – patriarcais, racistas e colonialistas – se encontram para performar comportamentos, visões de mundo, angústias, viradas epistemológicas, normas e as próprias alternativas a essas normas. Relutâncias e resistências. Também dissidências. Obras da cultura pop como a série britânica Fleabag (2016-2019), a aclamada série The White Lotus (2021-2022), a adaptação Cenas de um Casamento, de Ingmar Bergman para uma série em 2021, e filmes como Promising Young Woman (2021) e Histórias de um Casamento (2019) trazem para o centro do debate não apenas as relações heterossexuais, mas os meandros dessas relações, os conflitos no contexto contemporâneo a partir das mudanças produzidas pela disseminação dos estudos queer e das terceira e quarta ondas do feminismo. Estou falando do paradoxo da misoginia, da tragédia da heterossexualidade (Jane Ward, 2020), da masculinidade hegemônica (Connel e Messerschmidt, 2013) e do heteropessimismo (Seresin, 2019).
A reflexão proposta por esse artigo se localiza na intercessão entre os campos de Estudos Críticos da Heterossexualidade, os Estudos Queer e os Estudos de Cinema e Audiovisual. É um exercício de olhar, a partir da cultura pop audiovisual, para as respostas produzidas sobre à crise da heterossexualidade e aos arroubos de sobrevivência de uma masculinidade hegemônica, tóxica, sexista e patriarcal. A heteronormatividade subjuga não apenas as identidades queer, como também as identidades heterossexuais. Nas performances do feminino, há uma “feminilidade enfatizada” (CONNELL e MESSERSCHMIDT, 2013), ou seja, um feminino que será o par dualista da masculinidade hegemônica. A masculinidade hegemônica, por sua vez, irá dizer da forma como os homens se posicionam através de práticas discursivas. É construída no discurso e performada nas práticas não-discursivas.
A partir das obras audiovisuais citadas neste texto, busca-se apontar as ambiguidades do discurso heteropessimista. Seria um processo de desidentificação com a heterossexualidade vivenciado majoritariamente por mulheres, que expressam para seus amigues queer sua insatisfação e seu desejo de sentir desejo pelo mesmo sexo, de serem lésbicas. Entretanto, a acomodação com o lugar seguro da heterossexualidade na sociedade patriarcal capitalista contemporânea é maior que o incômodo provocado por essa existência hétero. O heteropessimismo feminino se revela como um caminho cuja saída é se abrir para fora do universo heterossexual, algo que não é considerado pela maioria das mulheres, pois o desejo de pertencimento e o desejo pela própria heterossexualidade é maior que o descontentamento.
Tais configurações sinalizam para um questionamento constante e cada vez mais frequente sobre as diferentes performances da heterossexualidade e seus padrões. Como eles precisam ser pensados, problematizados não apenas por pessoas queer, mas pelos próprios heterossexuais. Essa reflexão, dentro do contexto dos estudos queer, é importante não apenas para desmistificar a aura de normalidade que historicamente ronda a heterossexualidade, mas também para pensar outras formas de existências hétero, não normativas, não hegemônicas. Arranjos que crescem em meio às fissuras da sociedade heteropatriarcal.
Bibliografia
- BLANK, Hanne. Straight: The surprisingly short history of heterosexuality. Beacon Press, 2012.
CONNELL, Robert; MESSERSCHMIDT, James. Masculinidade hegemônica: repensando o conceito. Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, v. 21, n. 1, p. 241-282, 2013.
DEAN, James; FISCHER, Nancy. Thinking straightness. An introduction to Critical Heterossexualities Studies. In: The Routledge International Handbook of Heterosexualities Studies, (pp.1 – 17), 2020.
MUÑOZ, José Esteban. Disidentifications. Queers of color and the performance of politics. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1999.
RICH, Adrienne. Heterossexualidade compulsória e existência lésbica. Bagoas: estudos gays, gêneros e sexualidades. Natal: v. 4, n. 5, jan./jun. 2010, p. 17-44.
SERESIN, Indiana. On Heteropessimism. The New Inquiry. October 9, 2019. Acessado 13 Fevereiro 2023. Disponível em https://thenewinquiry.com/on-heteropessimism/
WARD, Jane. The Tragedy of Heterosexuality. New York: NYU Press, 2020.