Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Dinaldo Sepúlveda Almendra Filho (UNILA)

Minicurrículo

    Doutor em Sociologia pelo IESP-UERJ. Professor do Curso de Cinema e Audiovisual e do Programa de Pós-graduação em Literatura Comparada da UNILA. Exerce atividades de ensino e pesquisa em teoria, história e estética do cinema e do audiovisual, com foco em estudos comparados, fenomenologia da imagem e imaginação política e moral. Autor do livro “Os mistérios do Carandiru: cárcere, massacre e cultura de massas” (Luminária/Multifoco, 2011). Foi Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-graduação da UNILA.

Ficha do Trabalho

Título

    O figural e o olhar comparativo na tradição teórica do cinema político

Formato

    Presencial

Resumo

    O texto debate a “questão figural” e a “abordagem comparada” nas tradições de pensamento do cinema político. Revisita algumas teorias na perspectiva de uma fenomenologia da imaginação interessada no tratamento poético dado às categorias da experiência política como, por exemplo, a justiça, encarnada no motivo visual da pena de morte em A tênue linha da morte (1998) e Não Matarás (1988). Conclui que a questão figural é um enclave teórico do cinema político a ser aberto pelo olhar comparatista.

Resumo expandido

    Este texto propõe um debate a respeito do lugar ocupado pela “questão figural” e pela “abordagem comparada” (Dubois, 2012; Guimarães, Veras, 2016; Souto, 2019) na tradição teórica e histórica do cinema político. Para isso, articula três eixos problematização das relações entre “cinema e política” (Wollen, 1998).

    Primeiro, revisita o cinema político e descreve suas principais linhagens teóricas, observando suas heranças conceituais. Depois, examina essas repercussões na perspectiva de uma fenomenologia da imaginação política (Filho, 2022), orientada para a compreensão figural dos tratamentos poéticos dados às “emoções” e aos “motivos visuais” políticos (Didi-Huberman, 2016; Balló, Bergala, 2016). Por fim, relaciona as análises figurais e os métodos comparados para olhar o cinema político como materialização da imaginação poética, isto é, como intervenção figurativa dos filmes nas mais diferentes categorias da experiência política como a justiça, a liberdade, a igualdade, a fraternidade e a paz. Como exemplo desta discussão, coloca em diálogo evidências visuais e sonoras de A tênue linha da morte (Errol Morris, 1998) e Não Matarás (Krzysztof Kieślowski, 1988), obras que elaboram a crítica sensível da pena de morte como motivo visual e experiência fenomenal da justiça, nos trânsitos figurais entre o documentário e a ficção.

    Quando se estuda o cinema político em perspectiva histórica, percebe-se na teoria o quanto ele é uma categoria de análise mutável, pois pode restringir-se a adjetivações de filmes ou adotar pontos de vista qualitativamente diversos como militância, função social, linguagem, ideologia, autoria, temática ou modo produção, dentre tantos outros capazes de modificar seus entendimentos. Contudo, numa visão de conjunto das tradições teóricas — por exemplo, desde Eisenstein na década de 1920, passando por Alea nos anos 1980, até chegar a Rancière nos tempos atuais, para antecipar aqui alguns autores perquiridos —, é possível reconhecer um aspecto comum. Perseverou, em diversas teorizações do cinema político, uma tendência analítica que permanece, em pequena ou grande medida, indexada a parâmetros de vinculação da obra à sociedade, aos quais a questão figural se submete e, muitas vezes, sucumbe, diminuindo a potencialidade da comparação dos valores poéticos da política.

    É evidente que para o cinema político é absolutamente fundamental compreender suas vinculações com os campos de poder e os conflitos do mundo histórico. Seria leviano abstrair tais relações, negar tais relevâncias e os benefícios dessas abordagens, tanto para as teorias quando para as próprias lutas democráticas. Mas, por semelhança com os temas estéticos, percebe-se nessa tendência analítica uma disposição duradoura, um consenso teórico tão perene quanto a fidelidade mimética em torno do realismo cinematográfico. Com efeito, afrouxar as relações entre os cinemas políticos e os contextos sócio-históricos que os vivificam ocasiona perdas na fatura final das análises fílmicas. Ao mesmo tempo, investigá-lo cogitando, fenomenológica e comparativamente, os impulsos da imaginação poética alimentados pelas emoções políticas permite buscar a livre circulação dos motivos visuais entre diferentes filmografias. Isso requer pensar a imagem deflagradora, isto é, a própria imaginação que potencializa o que está visível nos filmes, associada ao processo figural que trata poeticamente as categorias da experiência políticas como, por exemplo, a justiça, em A tênue linha da morte e Não Matarás. Ao mesmo tempo, abre-se o caminho para reconhecer a questão figural como enclave teórico do cinema político, um território a ser penetrado por um flanco, a abordagem comparada das dinâmicas imaginativas que impulsionam figurações do político.

Bibliografia

    BALLÓ, J; BERGALA, A. (Orgs.). Motivos visuales del cine. Barcelona: Galaxia Gutemberg, 2016.

    DIDI-HUBERMAN, G. Que emoção! Que emoção? São Paulo: Editora 34, 2016.

    DUBOIS, P. Plasticidade e cinema. A questão do figural. In: HUCHET, S. (Org.). Fragmentos de uma teoria da arte. São Paulo: USP, 2012.

    FILHO, D. (2022). A dignidade como figura de justiça em Filhos de Hiroshima (1952) e A batalha de Argel (1966). Revista FAMECOS, 29(1), e43010. https://doi.org/10.15448/1980-3729.2022.1.43010

    GUIMARÃES, V; VERAS, P. Invenção figurativa e pensamento fílmico. In: PENAFRIA, M; BAGGIO, E; GRAÇA, A; ARAÚJO, D. (Orgs.). Propostas para a teoria do cinema. Teorias dos cineastas: Vol. 2. Covilhã: UBI, 2016.

    SOUTO, M. Infiltrados e invasores. Uma perspectiva comparada sobre as relações de classe no cinema brasileiro contemporâneo. Salvador: EDUFBA, 2019.

    WOLLEN, P. Cinema e política. In: XAVIER, I. (Org.). O cinema no século. Rio de Janeiro: Imago, 1998.