Ficha do Proponente
Proponente
- Daniel Velasco Leão (UFSC/CNPq)
Minicurrículo
- Professor, pesquisador, cineasta. Possui graduação em Cinema pela UFF (2009), mestrado em Comunicação pela UFF (2013) e doutorado em Artes Visuais pela UDESC com período sanduíche na New York University (2020). Entre 2016 e 2018, atuou como professor do curso de Cinema do Departamento de Artes da Universidade Federal de Santa Catarina. Atualmente, é pós-doutorando em Literatura na UFSC sob supervisão de Alessandra Brandão, onde pesquisa a produção e a estética dos filmes do golpe contra Dilma.
Ficha do Trabalho
Título
- O Cinema Documentário e o Golpe: Estética, gênero e tecnologia
Formato
- Presencial
Resumo
- Ao contrário dos eventos políticos dos anos 90, a eleição de Lula, o golpe sofrido por Dilma Rousseff e o governo de Jair Bolsonaro foram tematizados em filmes documentários relativamente contemporâneos a estes eventos. Buscamos investigar os fatores que possibilitaram e explicam essa mudança e formular asserções a respeito da estética e modo de produção do cinema documentário contemporâneo a partir do numeroso conjunto de filmes que os aborda. O cerne de nossa pesquisa são os filmes do golpe.
Resumo expandido
- O golpe sofrido por Dilma Rousseff propiciou algo inaudito na história do documentário: nunca tantos filmes foram realizados em tão pouco tempo sobre um mesmo tema. Além de 12 documentários longa-metragens que têm o evento como seu epicentro, ao menos outros cinco o abordam dentro de um quadro narrativo ou lógico-argumentativo mais amplo. Em seu conjunto, estes filmes abarcam uma multiplicidade de manifestações estéticas (filme de entrevistas, de observação, com narradores oniscientes etc.), distintas formas de produção (desde obras realizadas de forma inteiramente independente até financiadas por editais de cultura ou coproduzidas internacionalmente) e variadas formas de exibição e engajamento social.
Argumentamos que cinco fatores são essenciais para a compreensão deste fenômeno:
(1) a narrativa intrínseca ao processo de impeachment, narrativa no sentido primordial de uma sucessão de eventos motivados uns pelos outros com um início e um fim senão claramente delimitados, ao menos passíveis de serem representados por cenas/acontecimentos emblemáticos. Em processos desta natureza, há certa previsibilidade a respeito dos fatos que ocorrerão e de seu encadeamento narrativo no filme cujos início e fim tendem a coincidir com eventos tomados como marcos iniciais e finais dos processos que retratam.
(2) O desejo de repercussão das obras, incluindo diversos e muitas vezes difusos desejos de participação em festivais, retorno econômico, capacidade de mobilizar discussões. Como era esperado, uma parcela dessas obras repercutiu imensamente nos jornais, conversas e meios culturais e acadêmicos: alguns dos filmes participaram de festivais e prêmios entre os mais prestigiados do mundo e da América Latina, foram exibidos em salas de cinema de todo o país, e são passíveis de serem assistidos por meio das mais populares plataformas de vídeo sob demanda e plataformas de compartilhamento como YouTube e Vimeo.
(3) A intensidade da própria atividade cinematográfica. Se durante o impeachment de Collor o número de filmes lançados por ano era ínfimo (entre 1992 e 1995 foram menos de 30 filmes), no período que abrange a maior parte de nosso recorte são lançadas mais de cem longas-metragens por ano — totalizando, entre 2016 e 2019, 654 filmes. Este crescimento pode ser atribuído tanto à transformação da cadeia produtiva da indústria audiovisual, dos aparatos tecnológicos de registro e do sistema de exibição quanto às políticas públicas de estímulo à produção audiovisual.
(4) A polarização social a respeito de um dilema que permeou conversas cotidianas, as redes sociais e a pauta jornalística por um período de tempo muito superior ao do próprio impeachment, e que colocado em sua forma simples se resumiria à seguinte formulação: o processo de impeachment foi legítimo ou foi um golpe? O que motivou a maioria absoluta destas obras foi o desejo de responder a esta formulação. Este fator só pode ser compreendido de forma adequada se conjugado ao anterior, já que 2/3 do filmes produzidos contaram com aportes por meio de incentivo cultural, enquanto o terço restante foi realizado sem leis de incentivo e sem grande investimento, só sendo possível, portanto, graças ao barateamento e disseminação de câmeras digitais de alta resolução e ilhas de edição caseiras. A conjugação deste fatores é perceptível em outra esfera social da comunicação: as redes sociais que apresentam, em certo sentido, a exposição de um ponto de vista individual em plataformas de comunicação que, potencialmente, poderá alcançar, mobilizar e ser conhecida por milhões de pessoas.
(5) Por fim, a reação solidária à misoginia que caracterizou grande parte das campanhas contra Dilma — o que explica que 40% dos filmes sobre este evento tenham sido realizados por mulheres enquanto, no ano que o processo foi instaurado, essa proporção fosse de apenas 14,7% no geral.
Além de expor estes motivos, nos propomos investigar o que esta produção nos dá a ver sobre o documentário brasileiro contemporâneo.
Bibliografia
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