Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    LUCIANA BUARQUE (UFRJ)

Minicurrículo

    Mestranda ECO-UFRJ. Bacharel em História (UFMG,1986). Parceria com Gabriel Villela, Luiz Fernando Carvalho e Eduardo Nunes – entre outros – como figurinista e diretora de arte, em projetos para teatro, audiovisual, shows e editoriais de moda. Trabalhos em exposições (Figurino – 2007). Premiações nacionais e internacionais: Triga de Ouro, Quadrienal de Praga (2011), Candango (2021). Oficinas e palestras sobre processo de criação de figurino (UEL – 2008), (Cine Design -2010) e escolas de cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    CARÁTER TRANSGRESSIVO DE SUDOESTE: PERFORMATIVIDADE DE SEUS FOTOGRAMAS

Formato

    Presencial

Resumo

    A proposta é destacar o caráter transgressivo da gramática visual de Sudoeste, de Eduardo Nunes. O filme tangencia a região limítrofe entre cinema, fotografia e pintura, rompendo com as formas de criar e as formas de percepção visual consolidadas. Pretende-se expor a ideia analisando o caráter performativo de seus fotogramas, entendido aqui em um lugar de transição, entre fotografia e cinema, não mais como recorte de um tempo cronológico, simétrico, destituído de duração.

Resumo expandido

    A proposta dessa apresentação é destacar o caráter transgressivo da gramática visual de Sudoeste, de Eduardo Nunes. O filme tangencia a região limítrofe entre cinema, fotografia e pintura rompendo com o modelo clássico hegemônico de criação e apreciação artística, no contexto da produção audiovisual contemporânea.
    Pretende-se expor essa ideia através da análise do caráter performativo de seus fotogramas. Isso exige que se entenda a imagem como acontecimento, não mais como um objeto. Essa ruptura com a ideia de objetividade da imagem técnica, defendida por Bazin (BAZIN, 1991), insere-se em um complexo contexto de transformações tecno-artísticas e da consequente emergência de dispositivos múltiplos de comunicação. As fronteiras entre diferentes linguagens e mídias são derrubadas, identificando-se o surgimento de formatos imagéticos inéditos, híbridos, de temporalidades compostas, resultando em uma diversificação das gramáticas audiovisuais preexistentes. O processo de construção da imagem se reinventa, passando a revelar, entre seu pensamento e sua materialização, as marcas dos procedimentos técnicos e criativos que envolvem a ação artística.
    O conceito de performatividade na imagem dita fixa emerge nesse ambiente de disponibilização de novos recursos tecnológicos digitais de captação de imagem. As configurações de temporalização e mobilidade do instantâneo fotográfico são revistas, flexibilizando-se a suposta estagnação e imediatez da imagem estática. O instante e a duração, a imobilidade e o movimento não são mais opostos. A distensão do tempo fotográfico, assim como a utilização de imagens estáticas no cinema, coloca o fotograma em um lugar de transição, não mais como mero recorte de um tempo cronológico, simétrico, destituído de duração. Nesse sentido ele se estabelece em uma região vicinal, designada por Dubois como “imobilidade móvel” ou “mobilidade imóvel” (DUBOIS, 2012), no “entretempo da imagem fixa e da imagem-movimento” (BELLOUR, 1997. p.12). A dicotomia entre fotografia e cinema pode, portanto, ser questionada, permitindo que se entenda o fotograma como unidade mínima de significação visual da gramática cinematográfica, facilitando sua análise.
    As conformações de visualização e percepção, por sua vez, se alteram. Diante desse cruzamento e explosão de novas linguagens e da crescente pluralidade técnica, a relação entre o observador e a imagem transforma-se em experiência. O olhar se remodela, ressignificando as formas de ver e perceber, até então submetidas, quase que exclusivamente, a um conceito de cinema ficcional de representação, fundado no discurso narrativo literário, em disposições temporais homogêneas e na sucessão encadeada e regular de passagem de uma imagem a outra.
    No caso de Sudoeste, seus fotogramas têm valor próprio, buscando na própria imagem o que ela tem a contar, se oferecendo aos sentidos, independentemente da história narrada. Experiências cotidianas banais – como cozinhar, caminhar, chorar –, além dos silêncios, dos planos longos e dos movimentos lentos da câmera, conduzem o espectador a uma experiência sensorial, para além do conhecimento inteligível. A duplicidade e sobreposição temporais – um único dia, para os moradores de uma vila, e o transcorrer de uma vida inteira de sua protagonista – interagem de forma descontínua, desequilibrando o conceito de causa-efeito. Dois passados, dois presentes e dois futuros avançam simultaneamente, destituídos de hierarquia, explorando durações e intensidades, em contraposição ao tipo de narrativa linear, progressiva. Por fim, o filme em preto e branco rompe com a imposição cromática, distorcendo a percepção da representação do real.
    A transgressão em Sudoeste se revela em sua estruturação temporal, em seus enquadramentos, em suas composições visuais e em suas camadas narrativas, desafinando as formas de criar e as formas de percepção visual consolidadas, colaborando com a discussão sobre os novos rumos do audiovisual contemporâneo.

Bibliografia

    AUMONT, Jacques. A imagem. Campinas: Papirus, 1993.
    BAIO, Cesar. “Da ilusão especular à performatividade das imagens”. Revista Significação. v. 49, n. 57. São Paulo,. 2022.
    BAZIN. André. O cinema (ensaios). São Paulo: Brasiliense, 1991
    BELLOUR, Raymond. Entre-imagens: Foto, cinema, vídeo. São Paulo: Papirus, 1997
    DUBOIS, Philippe. A matéria-tempo e seus paradoxos perceptivos na obra de David Claerbout. In: Revista ECO- PÓS UFRJ. v.15, n. 01. Rio de Janeiro, 2012.
    FATORELLI, Antonio. “Elaboraciones del tempo”. Revista Arkadin – Estudos sobre Cine Y Artes Audiovisuales, Faculdade de Artes, Universidad Nacional de La Plata. nº 9, 2020.
    GONÇALVES, Osmar (org.) Narrativas Sensoriais. Rio de Janeiro: Circuito, 2014
    MANOVICH, Lev. The Language of New Media. Cambridge: MIT Press, 2001
    VIRMOND JUK, Rayman Aluy. Espaços temporais: paisagem, fotografia e duração em Sudoeste (Eduardo Nunes, 2011) e Drvo: A Árvore (André Gil Mata, 2018). Universidade Beira Interior, 2020.