Ficha do Proponente
Proponente
- Márcio Zanetti Negrini (PUCRS)
Minicurrículo
- Realiza pós-doutorado com bolsa do CNPq no Programa de Pós-graduação em Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Doutor e mestre pelo PPGCOM/PUCRS com bolsas da CAPES. Integra o Grupo de Pesquisa Cinema e Audiovisual: Comunicação, Estética e Política (Kinepoliticom/CNPq). Tem experiência de pesquisa em comunicação e estudos socioculturais com ênfase em cinema e audiovisual dedicando-se aos seguintes temas: política, história e memória.
Ficha do Trabalho
Título
- Lula e as imagens da “Operação Lava Jato” em documentários brasileiros
Formato
- Presencial
Resumo
- Elencamos os documentários “Democracia em Vertigem” (Petra Costa, 2019) e “Amigo Secreto” (Maria Augusta Ramos, 2022) para análise de como as imagens de arquivo da “Operação Lava Jato”, que registraram depoimento de Lula a Sérgio Moro, são reconfiguradas pela montagem dos filmes. Imagens que outrora serviram à perseguição jurídica, política e midiática de Lula ganham novos sentidos pela escritura imagética da história realizada pelos documentários, expressando sentidos de resistência política.
Resumo expandido
- O cinema produz agenciamentos visuais que promovem a “legibilidade crítica da história” (KRACAUER, 2001; BENJAMIN, 2018). A potencialidade poética das formas fílmicas sensibiliza, comunica e articula saberes sobre acontecimentos políticos e sociais, assim reafirma e ao mesmo tempo cria imaginários além de elaborar a memória social diante de processos históricos (GUTFREIND, 2023). Nessa perspectiva, o cinema documentário ocupa lugar preponderante na medida em que os filmes sobressaem seus contextos de enunciação, apresentando fatos e contextualizações a fim de atribuir sentidos reflexivos sobre os acontecimentos (NINEY, 2015).
Diante dos sobressaltos da democracia brasileira nos últimos anos, observamos uma tendência de documentários a abordar o “golpe institucional” (MIGUEL, 2022; NOBRE, 2022) de 2016 e suas consequências. Trata-se de longas-metragens que apresentam diferentes estratégias narrativas, para abarcar aspectos da complexidade de um processo histórico em curso. Em parte dos filmes, notamos a recorrência em sobressair o revigorar da extrema direita brasileira, articulando narrativamente o semblante antipolítico e antipetista das grandes manifestações ocorridas em junho de 2013 com a atuação jurídica, política e midiática da “Operação Lava Jato”.
Esses documentários chamam atenção para como o simulacro institucional do impeachment, que derrubou o governo da presidenta Dilma Rousseff, atribuiu ao Partido dos Trabalhadores a centralidade da corrupção, exposta como escândalo político-midiático, diante de uma suposta imparcialidade jurídica. Os filmes sugerem atentarmos ao personagem do então ex-presidente Lula, liderança histórica do PT com amplo apoio social, a fim de compreendermos como a criminalização do petista e sua inelegibilidade nas eleições presidenciais de 2018 compõem as condições para consolidação do golpe, e ascensão de um governante de extrema direita como Jair Bolsonaro.
Nesse sentido, elencamos “Democracia em Vertigem” (Petra Costa, 2019) e “Amigo Secreto” (Maria Augusta Ramos, 2022) como representativos para análise de como as imagens jurídicas, políticas e midiáticas da “Operação Lava Jato”, produzidas especialmente em relação a Lula, são reconfiguradas pela montagem fílmica. Analisaremos de que maneira os documentários produzem novos sentidos para imagens oficiais, amplamente divulgadas nas mídias, do depoimento de Lula ao ex-juiz Sério Moro, em 10 de maio de 2017. Nos filmes, o trabalho com as imagens de arquivo produz o movimento de desmontar e remontar a história (DIDI-HUBERMAN, 2017), reinscrevendo historicamente os acontecimentos. Dos arquivos visuais da “Operação Lava Jato” presentes nos documentários advém novas inscrições discursivas, descontruindo sentidos predeterminados e agenciando outras visibilidades na história (DERRIDA, 2001). Isso acontece devido à particularidade tecnológica e artística do cinema e sua vocação, para expressar imagens que interrompem a repetição de sentidos hegemônicos que emanam das mídias (NINEY, 2005).
A partir de relações visuais, que sugerem “imagens em disputa” (GUTFREIND, 2023), os documentários sobressaem a encenação midiática do golpismo e o recrudescimento do autoritarismo histórico. Desconstroem, assim, imagens que serviram à legitimação da “Operação Lava Jato” para expressiva parcela da sociedade. Imagens que outrora serviram à perseguição jurídica, política e midiática de Lula e seus correligionários são reconfiguradas pela escritura imagética da história criada pelos filmes, que ao revés das imagens do autoritarismo lavajatista e seus prepostos expressam sentidos de resistência política e porvir democrático.
Bibliografia
- BENJAMIN, W. Passagens. v. 2. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2018.
DERRIDA, J. Mal de arquivo: uma impressão freudiana. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001.
DIDI-HUBERMAN, G. Quando as imagens tomam posição: o olho da história, I. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2017.
GUTFREIND, C. F. O filme político-militante no Brasil contemporâneo. In: Redes de pesquisa: comunicação em perspectiva. GUTFREIND, C. F. et al. (org.). Porto Alegre: Editora Sulina, 2022.
KRACAUER, S. Teoria del cine. Barcelona: Paidós Ibérica, 2001.
MIGUEL, L. F. Democracia na Periferia Capitalista. Belo Horizonte: Autêntica, 2022.
NOBRE, M. Limites da Democracia: de junho de 2013 ao governo Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2022.
NINEY, F. La prueba de lo real en la pantalla: ensayo sobre el principio de realidad documental. Ciudad de México: Universidad Nacional Autónoma de México, 2009.