Ficha do Proponente
Proponente
- Gustavo de Souza Araujo (UFF)
Minicurrículo
- Gustavo Araujo é mestrando no Programa de Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense, o PPGCine UFF. Estuda, desde a iniciação científica, questões relacionadas às temporalidades inscritas no roteiro cinematográfico e audiovisual, ligados a questões de ritmos e andamentos prévios, dentro da linha de pesquisa Narrativas e Estéticas.
Ficha do Trabalho
Título
- Tempo e temporalidade na escrita do roteiro audiovisual
Seminário
- Estudos de Roteiro e Escrita Audiovisual
Formato
- Presencial
Resumo
- Este estudo compara roteiros e filmes brasileiros contemporâneos para entender como a percepção de tempo ocorre na escrita audiovisual e como é traduzida para a tela. Embora o roteiro possa prever ritmo e duração, não há uma regra objetiva. O fator autoral também influencia o tempo, assim como o diálogo e o silêncio em cena podem ditar o ritmo. A proposta é analisar essas questões no o filme Unicórnio (2017) de Eduardo Nunes, que apresenta um tratamento sutil da temporalidade.
Resumo expandido
- Esta pesquisa tem como foco estudar as temporalidades presentes no roteiro audiovisual, através de comparação entre o roteiro e o filme, com foco em longas-metragens brasileiros dos anos 2010. A partir da constatação da falta de estudos nessa área, especialmente sobre aspectos como duração, ritmo, andamento e velocidade, busca-se encontrar, nas teorias cinematográficas e narrativas, fundamentos teóricos para analisar a construção do roteiro. De um lado, as convenções da escrita de roteiro estabelecem que uma página de texto corresponde a um minuto de filme (FIELD, 2001, p. 3). Por outro lado, sabe-se que, nos cinemas independentes, essa “regra” é frequentemente desconsiderada. O objetivo é entender como o roteiro dos longas analisados prevê (ou não) a sensação de lentidão ou fluidez embutida em algumas cenas.
Para De Luca (2017) e Monteiro (2017) a percepção de que um filme é lento ou possui uma longa duração é subjetiva e sujeita a elementos como o silêncio ou o quadro fixo. Já a cronometragem de um plano é um método objetivo para medir sua duração. Segundo Flanagan (2018), a escassez de movimentos de câmera, poucos diálogos e a presença de planos contemplativos também contribuem para a sensação de lentidão.
O tempo é um conceito amplo. Em relação à narrativa, Nunes (2013) categoriza a dualidade do tempo na literatura, que conecta o tempo imaginário da narrativa com o tempo do discurso e da leitura. Essa conexão permite que diferentes peças sejam unidas em uma única linha, correspondendo ao tempo linguístico e dos verbos (NUNES, p. 24, 2013). Portanto, ao considerar que o roteiro também é uma peça narrativa, textual e gramatical, ambos os conceitos de tempos são considerados nesta análise dos roteiros indicados.
O recorte deste estudo apresenta a análise do filme Unicórnio (2017), de Eduardo Nunes, baseado em contos de Hilda Hilst. O roteiro analisado é o terceiro tratamento, de outubro de 2016, com 62 páginas e 122 minutos de duração. As sequências têm em média 02min06s, com a maior de 08min54s e a menor de 16s.
Como instrumento de análise foi desenvolvida uma tabela para verificar a relação entre número de páginas e tempo em tela; quantidade de planos e marcas presentes na gramática do texto. No filme, destacam-se: os planos, o tempo na timeline do filme, a duração da cena e a presença de diálogo. E, no roteiro: a duração esperada por número de páginas, o espaço/tempo da cena, quantidade de parágrafos, frases e verbos de ação na rubrica, quantidade de caracteres, de linhas, e pontuações.
Durante a investigação textual, nota-se que as rubricas são mais proeminentes do que os diálogos; e no filme, os planos têm uma duração maior, com poucos cortes. Além disso, há uma sensação de atemporalidade; é difícil identificar a época em que o filme se passa, a não ser pelo figurino, com vestidos longos, e pela ausência de aparatos tecnológicos nas cenas. Somente na sequência 18 (00:57:58′) é possível notar uma passagem natural de tempo, entre dia e noite. A maioria das sequências de Unicórnio (2017) tem uma duração maior que a esperada. Isso pode ser explicado por descrições mais extensas no roteiro e planos mais longos, o que pode ser mais comum em filmes autorais. No clímax do filme, que é a parte final, as cenas são mais curtas e rápidas, criando uma sensação de urgência.
O roteiro estudado estabelece o andamento, ritmo e duração do filme, mas de uma forma subjetiva. Neste momento inicial, verificou-se que a quantidade de palavras ou espaço na folha não guardam relação direta com a duração ou o ritmo da cena. O fator autoral pode influenciar o tempo, de modo que cenas com maior quantidade de caracteres não resultam necessariamente em sequências mais longas. Com isso, observa-se que advérbios – em especial os de tempo – ou verbos de ação podem indicar a cadência para transformar frases da rubrica. Espera-se analisar o mesmo em filmes brasileiros de gêneros, como ação e comédia, escritos e dirigidos por pessoas diferentes.
Bibliografia
- DE LUCA, Tiago. “On Length: A Short History of Long Cinema”. Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 4, p. 335-352, 2017.
FIELD, Syd. Manual do roteiro. São Paulo: Editora Objetiva, 2001.
FLANAGAN, Matthew. “’Slow Cinema’: Temporality and Style in Contemporary Art and Experimental Film”. (Tese de doutorado). Exeter, Univesity of Exeter, 2012.
GONÇALO, Pablo. Quando filmes são palavras: uma introdução aos estudos de roteiro. Raído, v. 11, n. 28, p. 123-140, 2017.
MONTEIRO, Lúcia Ramos. “O cinema existe e resiste. Longa duração, análise fílmica e espectatorialidade nos filmes de Lav Diaz”. Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 4, p. 434-455, 2017.
MROZ, Matilda. Temporality and Film Analysis. Edimburgo: Edinburgh University Press, 2012.
NUNES, Benedito. O Tempo na Narrativa. São Paulo: Edições Loyola, 2013.
NUNES, Eduardo. Unicórnio, 2016.