Trabalhos aprovados 2023

Ficha do Proponente

Proponente

    Gustavo de Souza Araujo (UFF)

Minicurrículo

    Gustavo Araujo é mestrando no Programa de Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense, o PPGCine UFF. Estuda, desde a iniciação científica, questões relacionadas às temporalidades inscritas no roteiro cinematográfico e audiovisual, ligados a questões de ritmos e andamentos prévios, dentro da linha de pesquisa Narrativas e Estéticas.

Ficha do Trabalho

Título

    Tempo e temporalidade na escrita do roteiro audiovisual

Seminário

    Estudos de Roteiro e Escrita Audiovisual

Formato

    Presencial

Resumo

    Este estudo compara roteiros e filmes brasileiros contemporâneos para entender como a percepção de tempo ocorre na escrita audiovisual e como é traduzida para a tela. Embora o roteiro possa prever ritmo e duração, não há uma regra objetiva. O fator autoral também influencia o tempo, assim como o diálogo e o silêncio em cena podem ditar o ritmo. A proposta é analisar essas questões no o filme Unicórnio (2017) de Eduardo Nunes, que apresenta um tratamento sutil da temporalidade.

Resumo expandido

    Esta pesquisa tem como foco estudar as temporalidades presentes no roteiro audiovisual, através de comparação entre o roteiro e o filme, com foco em longas-metragens brasileiros dos anos 2010. A partir da constatação da falta de estudos nessa área, especialmente sobre aspectos como duração, ritmo, andamento e velocidade, busca-se encontrar, nas teorias cinematográficas e narrativas, fundamentos teóricos para analisar a construção do roteiro. De um lado, as convenções da escrita de roteiro estabelecem que uma página de texto corresponde a um minuto de filme (FIELD, 2001, p. 3). Por outro lado, sabe-se que, nos cinemas independentes, essa “regra” é frequentemente desconsiderada. O objetivo é entender como o roteiro dos longas analisados prevê (ou não) a sensação de lentidão ou fluidez embutida em algumas cenas.
    Para De Luca (2017) e Monteiro (2017) a percepção de que um filme é lento ou possui uma longa duração é subjetiva e sujeita a elementos como o silêncio ou o quadro fixo. Já a cronometragem de um plano é um método objetivo para medir sua duração. Segundo Flanagan (2018), a escassez de movimentos de câmera, poucos diálogos e a presença de planos contemplativos também contribuem para a sensação de lentidão.
    O tempo é um conceito amplo. Em relação à narrativa, Nunes (2013) categoriza a dualidade do tempo na literatura, que conecta o tempo imaginário da narrativa com o tempo do discurso e da leitura. Essa conexão permite que diferentes peças sejam unidas em uma única linha, correspondendo ao tempo linguístico e dos verbos (NUNES, p. 24, 2013). Portanto, ao considerar que o roteiro também é uma peça narrativa, textual e gramatical, ambos os conceitos de tempos são considerados nesta análise dos roteiros indicados.
    O recorte deste estudo apresenta a análise do filme Unicórnio (2017), de Eduardo Nunes, baseado em contos de Hilda Hilst. O roteiro analisado é o terceiro tratamento, de outubro de 2016, com 62 páginas e 122 minutos de duração. As sequências têm em média 02min06s, com a maior de 08min54s e a menor de 16s.
    Como instrumento de análise foi desenvolvida uma tabela para verificar a relação entre número de páginas e tempo em tela; quantidade de planos e marcas presentes na gramática do texto. No filme, destacam-se: os planos, o tempo na timeline do filme, a duração da cena e a presença de diálogo. E, no roteiro: a duração esperada por número de páginas, o espaço/tempo da cena, quantidade de parágrafos, frases e verbos de ação na rubrica, quantidade de caracteres, de linhas, e pontuações.
    Durante a investigação textual, nota-se que as rubricas são mais proeminentes do que os diálogos; e no filme, os planos têm uma duração maior, com poucos cortes. Além disso, há uma sensação de atemporalidade; é difícil identificar a época em que o filme se passa, a não ser pelo figurino, com vestidos longos, e pela ausência de aparatos tecnológicos nas cenas. Somente na sequência 18 (00:57:58′) é possível notar uma passagem natural de tempo, entre dia e noite. A maioria das sequências de Unicórnio (2017) tem uma duração maior que a esperada. Isso pode ser explicado por descrições mais extensas no roteiro e planos mais longos, o que pode ser mais comum em filmes autorais. No clímax do filme, que é a parte final, as cenas são mais curtas e rápidas, criando uma sensação de urgência.
    O roteiro estudado estabelece o andamento, ritmo e duração do filme, mas de uma forma subjetiva. Neste momento inicial, verificou-se que a quantidade de palavras ou espaço na folha não guardam relação direta com a duração ou o ritmo da cena. O fator autoral pode influenciar o tempo, de modo que cenas com maior quantidade de caracteres não resultam necessariamente em sequências mais longas. Com isso, observa-se que advérbios – em especial os de tempo – ou verbos de ação podem indicar a cadência para transformar frases da rubrica. Espera-se analisar o mesmo em filmes brasileiros de gêneros, como ação e comédia, escritos e dirigidos por pessoas diferentes.

Bibliografia

    DE LUCA, Tiago. “On Length: A Short History of Long Cinema”. Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 4, p. 335-352, 2017.
    FIELD, Syd. Manual do roteiro. São Paulo: Editora Objetiva, 2001.
    FLANAGAN, Matthew. “’Slow Cinema’: Temporality and Style in Contemporary Art and Experimental Film”. (Tese de doutorado). Exeter, Univesity of Exeter, 2012.
    GONÇALO, Pablo. Quando filmes são palavras: uma introdução aos estudos de roteiro. Raído, v. 11, n. 28, p. 123-140, 2017.
    MONTEIRO, Lúcia Ramos. “O cinema existe e resiste. Longa duração, análise fílmica e espectatorialidade nos filmes de Lav Diaz”. Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento, v. 4, p. 434-455, 2017.
    MROZ, Matilda. Temporality and Film Analysis. Edimburgo: Edinburgh University Press, 2012.
    NUNES, Benedito. O Tempo na Narrativa. São Paulo: Edições Loyola, 2013.
    NUNES, Eduardo. Unicórnio, 2016.