Ficha do Proponente
Proponente
- LINA CIRINO ARAUJO OLIVEIRA DOS SANTOS (USP)
Minicurrículo
- Doutoranda em Meios e Processos Audiovisuais (USP), mestra em Comunicação (UFRB), bacharel em Direito, graduanda em Cinema e Audiovisual (UFRB); integrante do GEEECA (UFRB), Sonatório (UFRB) e Poéticas no Audiovisual (USP); realizadora no audiovisual.
Ficha do Trabalho
Título
- Cartas para um Mundo Implicado: Rotas de fuga do Mundo Ordenado
Seminário
- Cinemas decoloniais, periféricos e das naturezas
Formato
- Presencial
Resumo
- Denise Ferreira da Silva, na fala-performance Corpus Infinitum, utiliza o tarô como metodologia performática para ativar a criatividade radical da imaginação. Para Silva, as imagens são fractais que podem reproduzir, mas também romper com as modalidades de sujeição racial, colonial e cis-hetero-patriarcal. A leitura de tarô em Corpus Infinitum é uma prática de fugitividade dos cativeiros do Mundo Ordenado para atravessar abismos rumo ao Mundo Implicado.
Resumo expandido
- Feche os olhos, elabore uma pergunta, embaralhe as cartas e leia suas respostas em imagens. Na fala-performance Corpus Infinitum, evento de abertura do IX Cachoeiradoc, Denise Ferreira da Silva (2020) faz uma pergunta às cartas de tarot: “Como o documentário pode enfrentar as questões postas pelo fato de que muitas de nossas imagens, porque limitadas pelo imaginável, podem contribuir para a continuação das modalidades de sujeição racial, colonial e cis-hetero-patricarcal que desejamos eliminar?”. A construção dessa pergunta em torno das imagens implica o “pensamento fractal, poético e composicional” de Silva (2020, p. 213) em direção a “holomovimentos” (BOHM, 2002) que nos convida a imagear o global como parte de um todo cósmico: “O pensamento poético, aplicado como um imageamento criativo (fractal) para tratar da subjugação colonial e racial, intenciona interromper a repetição características de padrões fractais” (SILVA, 2020, p. 2013). Ao mesmo tempo em que as imagens foram utilizadas para sustentar o pensamento moderno pós-iluminista que molda representações estereotipadas, distorcidas e exotificadas que perpetuam sujeições raciais, coloniais e cis-hetero-patriarcais, também podem perturbar estruturas discursivas extrativistas do capital global que limitam a nossa imaginação e, por extensão, a produção de novas imagens. Para criar imagens subversivas que rompam com as modalidades de sujeição que desejamos combater é preciso reivindicar a radical capacidade criativa da imaginação para transcender as restrições impostas pela forma como conhecemos o mundo (SILVA, 2019). Quando Silva menciona que nossas imagens são limitadas pelo imaginável na sua pergunta, ela se refere ao programa kantiano (2001) e hegeliano (1992) limitador da imaginação que influenciou o pensamento pós- iluminista que ainda opera na atualidade global. A separabilidade, no tarô, tem relação imediata com a unidade. Em Corpus Infinitum, Silva usa o tarô Rider-Waite-Smith: uma unidade fragmentada em 78 cartas, incluindo os Arcanos Maiores e Menores. Embora haja essa divisão entre os Arcanos, com seus arquétipos, números e naipes, é a interação entre as cartas que conduz a leitura do jogo (POLLACK, 1997). Uma carta está sempre inserida em um contexto de relação: seja com a pergunta do leitor, com a posição em que ela está inserida no jogo ou com as cartas que estão ao redor. A leitura de uma carta ou das relações possíveis com as outras cartas não produz significados engessados, isto é, não é determinada. E a depender dos métodos e escolhas intuitivas do leitor, não há uma sequência rígida para fazer estas conexões, ou seja, não há uma relação obrigatória de sequencialidade entre as cartas. A separabilidade, a determinabilidade e a sequencialidade (brevemente aludidos com o acontecimento da leitura do tarô) são pilares ontoepistemológicos que constituem a ideia de “Mundo Ordenado” combatido por Silva em seus textos filosóficos, livros, filmes e experimentações artísticas, incluindo a fala-performance. O “Mundo Implicado” a que se refere Silva em Corpus Infinitum é uma realidade em constante movimento e transformação, que conecta tudo o que existe, existiu e existirá, em “dobras” (MOTEN, 2003) quadrimencionais, de maneira emaranhada e interdependente, como um “Plenum”. Para incorporar a metodologia performática do tarô como uma prática de “fugitividade” (MOTEN, 2003), que possibilita expandir a imaginação e contribuir com outras epistemologias que considerem a multiplicidade e coexistência entre humanos, não-humanos e mais-que-humanos, é preciso escapar do cativeiro do “Mundo Ordenado” e atravessar abismos rumo ao “Mundo Implicado”. No rascunho deste plano de fuga, fecho os olhos e pergunto: Como o tarô pode ampliar nossa compreensão das interações entre diversas formas de existência, oferecendo abordagens holísticas para sabotar os pilares de separabilidade, sequencialidade e determinabilidade que moldaram a forma como conhecemos o mundo?
Bibliografia
- BOHM, D. A Totalidade e a Ordem Implicada. São Paulo: Madras, 2002.
HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do Espírito. Ed. Vozes: Petrópolis, RJ, 1992.
KANT, I. Crítica da faculdade do juízo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
MOTEN, F. In the Break: The Aesthetics of the Black Radical Tradition. Minneapolis: U of Minnesota Press, 2003.
POLLACK, R. 78 Graus de Sabedoria: O Livro do Tarô. São Paulo: Pensamento, 1997.
SILVA, D. A Dívida Impagável. São Paulo, 2019.
SILVA, D. Corpus Infinitum. Fala-performance no IX Cachoeiradoc, Cachoeira, 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2ljrPkbkCEM&t=686s
SILVA, D. Pensamento fractal. Revista PLURAL, São Paulo, v.27.1, jan./jul., 2020, p.206-214
SILVA, D. Um fim para “este” mundo. Disponível em: https://revistadr.com.br/posts/um-fim-para-este-mundo-entrevista-de-denise-ferreira-da-silva-na-revista-texte-zur-kunst/