Ficha do Proponente
Proponente
- Rogério Luiz Silva de Oliveira (UESB)
Minicurrículo
- Realizador Audiovisual, pesquisador e professor do Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Diretor e fotógrafo de documentários, dentre eles: “J.C. D’ Almeida – uma foto-síntese” (2015), “Os porcos e a reza” (2020) e Sucata Esperança (2023). Autor do livro “Fotografia e Memória: a criação de passados” (2014) e um dos organizadores da coletânea “Cinematografia, Expressão e Pensamento” (2019). Sócio da Associação Brasileira de Cinematografia – ABC.
Ficha do Trabalho
Título
- El botón de Nácar: a cinematografia e a memória da água
Seminário
- Estética e plasticidade da direção de fotografia
Formato
- Presencial
Resumo
- O estudo é dedicado à direção de fotografia do documentário “El botón de Nácar” (2015), dirigido pelo chileno Patricio Guzmán. A intenção é verificar como as tomadas da câmera plasmam um anseio de reunir, nas imagens em movimento, diferenciais de tempo em torno de um mesmo elemento: a água. Baseando-nos no fenômeno de anacronismo manifestado na cinematografia, objetiva-se identificar as diferentes frentes abertas pelas imagens criadas pela direção de fotografia sinalada por Katell Djian.
Resumo expandido
- “Disseram que a água tem memória”. Esta frase é dita pelo próprio diretor Patricio Guzmán nos minutos finais de “El botón de Nácar” (2015) e aponta o horizonte que se quer alcançar nos 80 minutos que seguem no longa-metragem. O documentário é dirigido por ele e tem o trabalho de cinematografia assinado pela fotógrafa Katell Djian. A construção da narrativa do filme está toda ela alicerçada na assertiva que abre este texto. É em torno desse princípio que imagens e sons (principalmente vozes) constituem e perseguem o objetivo de traduzir em forma de linguagem cinematográfica alguns entendimentos possíveis sobre como a Ditadura Militar chilena assassinou pessoas. Como não bastasse o extermínio, praticou crimes de ocultação de corpos. A água, nesse contexto, cumpre um papel doloroso, pois o argumento do filme é desenvolvido em torno do modo como o Oceano Pacífico, em sua parcela chilena, abriga um cemitério de vítimas das investidas assassinas lideradas por Augusto Pinochet. Para as suas famílias, décadas depois -, essas pessoas seguem como desaparecido(a)s político(a)s. Essa tentativa de síntese da produção dirigida por Guzmán, suscita, por essas e outras razões, inúmeras perguntas. Elaboramos algumas ao assumir a direção de fotografia como perspectiva para observar o filme: de que modo a direção de fotografia do documentário materializa a pergunta norteadora do filme? Em outras palavras: quais recursos e estratégias de cinematografia são mobilizados no sentido de plasmar a memória da água? Como é possível sistematizar os recursos de câmera a partir de um exercício teórico?
A área de estudos em direção de fotografia tem fornecido horizontes reflexivos sobre as imagens em movimento, no sentido de amparar incursões como essas que aqui se propõe. A pesquisadora Ana Carolina Roure Malta de Sá é um exemplo disso. Ao construir sua reflexão sobre o processo de criação do diretor de fotografia Walter Carvalho, sugere de forma inspiradora a pensarmos na cinematografia como espaço de manifestação de anacronismo (2021). Ampliando o conceito a partir de uma leitura profícua da obra de Georges Didi-Huberman, a pesquisadora sugere considerar o quanto a direção de fotografia – em seu ato criador -, promove uma “montagem de tempos heterogêneos” (Didi-Huberman, 2015, p. 23). O arranjo teórico aqui evidenciado é aproximado de uma investigação imagética em que os planos dedicados à filmagem da água ganham atenção especial. Interessa notar, nesse exercício teórico, a maneira como diferentes mecanismos são mobilizados pela equipe de cinematografia a fim de transmutar memórias em metáforas visuais. Uma observação do conjunto de blocos narrativos do filme aponta para um repertório amplo. A incursão da câmera no documentário vai de planos gerais em tomadas aéreas a planos-detalhes de um bloco de quartzo. No meio do caminho, encontra planos filmados de cima de embarcações e mergulha em sequências subaquáticas que embrenham a narrativa numa rica variedade de possibilidades de expressão da memória. Em torno das imagens integrantes de “El Botón de Nácar” é possível dedicar atenção às especificidades plásticas obtidas pela direção de fotografia e a maneira como os recursos de cinematografia traduzem diferenciais de tempo. Mais que isso, a proposta aqui apresentada busca refletir, tomando as palavras de Didi-Huberman de empréstimo, acerca da ideia de que “a visualidade exige é que seja vista sob o ângulo de sua memória, de suas manipulações do tempo” (Didi-Huberman, 2015, p. 27). A intenção, com esse exercício teórico sobre a plasticidade imagética/cinematográfica, é justamente perceber as nuances dos planos que servem à direção de fotografia do documentário aqui analisado e verificar como tais tomadas plasmam um anseio de reunir, nas imagens em movimento, uma sobredeterminação temporal em torno de um mesmo elemento: a água. Objetiva-se identificar as diferentes frentes abertas pelas imagens criadas pela direção de fotografia sinalada por Katell Djian.
Bibliografia
- DIDI-HUBERMAN, Georges. Diante do tempo: história da arte e anacronismo das imagens. Belo Horizonte: UFMG, 2015.
GUZMÁN, Patricio. Filmar o que não se vê: um modo de fazer documentários. São Paulo: Edições Sesc São Paulo, 2017.
OLIVEIRA, Rogério Luiz Silva de. Memória e Criação na Direção de Fotografia. Tese de Doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Memória: Lingugaem e Sociedade da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. Fevereiro de 2016.
SÁ, Ana Carolina Roure Malta de. Walter Carvalho entre luzes e sombras: intermidialidade, anacronismo e a estética da estranheza na direção de fotografia. Tese de Doutorado defendida no Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Universidade de Brasília – UnB. Junho de 2021.