Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Juliano Gomes (Sem vínculo)

Minicurrículo

    Crítico e professor. Co-editor da Revista Cinética, onde escreve desde 2010. Publicou na Film Quarterly, Filme&Cultura, Folha, Piauí e diversos catálogos de mostras e festivais. Foi júri do DocLisboa, Mostra Tiradentes, Cachoeira Doc e Fronteira. Foi do comitê de seleção do Sheffield Doc Fest. Lecionou na AIC-Rio. Escreve também sobre teatro, música e artes visuais. Mestre em Comunicação (UFRJ). Dirigiu com Léo Bittencourt os curtas “As Ondas”(2016) e “…”(2007)

Ficha do Trabalho

Título

    Medida Provisória: cinema negro de mercado como produção de hegemonias

Seminário

    Cinemas negros: estéticas, narrativas e políticas audiovisuais na África e nas afrodiásporas.

Formato

    Presencial

Resumo

    A proposta deste trabalho consiste em analisar o exemplo do filme Medida Provisória (Lázaro Ramos, 2022) como elemento chave de uma movimentação política e estética em direção a consolidação de um cinema negro “de mercado”, que enfatiza sua face de mercadoria. Nos interessa aqui tanto o filme como forma expressiva quanto como produto cultural e acontecimento social.

Resumo expandido

    A proposta deste trabalho consiste em analisar o exemplo do filme Medida Provisória (Lázaro Ramos, 2022) como elemento chave de uma movimentação política e estética em direção a consolidação de um cinema negro “de mercado”, que enfatiza sua face de mercadoria. Nos interessa aqui tanto o filme como forma expressiva quanto como produto cultural e acontecimento social.

    O filme alcançou expressiva bilheteria, visibilidade, contando com uma boa campanha de divulgação, em mídias variadas – fato provavelmente inédito em se tratando de um diretor negro. Assim, nos pareceu um exemplo interessante para discutir como os embates políticos e estéticos se dão nessa arena nos dias de hoje. É esse o horizonte que se deseja para essa produção que se adensou nas últimas décadas?

    O que observamos portanto, no cenário atual é uma disputa invisível entre um cinema de negro “de mercado” que funciona pela afirmação de uma linguagem de um antirracismo das redes sociais, adequado para a venda, e um outro, que investe em direções disruptivas e desafiantes, que quer desmantelar a lógica do produto adequado para consumo, e que não fomenta o mito de um “capitalismo negro”. Estas duas tendências podem ser observadas se olhamos para o exemplo recente do longa metragem Ilha (Ary Rosa e Glenda Nicácio, 2019).

    Para analisar este embate, observaremos as contribuições dos teóricos Fred Moten, Denise Ferreira da Silva e bell hooks, para melhor entendermos como esta tensão entre expressão negra e capitalismo se dá. Pois a questão de fundo é a relação entre racialidade e capitalismo hoje, e como que nos tempos atuais observamos esforços variados em torno da produção de um imaginário de inserção e inclusão dos negros e sua produção cultural numa lógica de mercadoria, de produtos adequados para o consumo.

    Nos interessa em especial como as movimentações em torno de um cinema negro de mercado faz intercessões com o pensamento e as práticas de representação. O capitalismo da informação de interessa por “representações positivas” e por um certa cartilha de previsibilidade da expressão que permita controlar e domesticar as estratégias inventivas e desobedientes De certa forma, por outro lado, há um conjunto de filmes feitos por artistas negras que não trabalha pela via da representação, nem da “imagem positiva” e que apresenta uma resistência em se encaixar como um produto adequado nas prateleiras contemporâneas.

    Importante notar que esta disputa acontece em um momento de ruptura com os modelos de apoio estatal ao cinema brasileira brasileiro e emergência dos players internacionais como alternativa de produção no Brasil. Ou seja, no âmbito das disputas políticas e institucionais há também um embate entre as forças do capitalismo contemporâneo e os mecanismos estatais de promoção e produção de cultura.

    A hipótese é que a existência deste primeiro longa dirigido por Lázaro Ramos é uma fértil oportunidade de pensarmos que tipo tensão compõe hoje nosso campo de estudos no Brasil e também as discussões sobre políticas públicas. Na medida em que os grandes players e grandes produtoras precisam expressar institucionalmente algum nível de consciência política e racial, vai se fomentando as bases de um cinema negro de mercado como forma de manter hegemonias, politica, econômica e esteticamente.

    Portanto, escolhemos aqui um filme recente para tentar contribuir para a discussão dos paradoxos que se relacionam com este campo de produção hoje, e pensar que ideias podem fomentar um debate fértil que esteja atento aos cruzamentos entre estética, política, capitalismo e mercado, consumo e invenção.

Bibliografia

    GOMES, Juliano. The Impossible Embrace: Ilha, Travessia, and Black Brazilian Cinema Now. Film Quarterly, 2020, 72(2)

    GOMES, Juliano & ROCHA, Lorenna. Crítica de Medida Provisória. Plataforma Indeterminações. Maio, 2022

    GILLESPIE, M.B. Film Blackness. American Cinema and the Idea of Black Film. Duham/Londres: Duke University Press, 2016.

    MOTEN, Fred; HARNEY, Stefano. Pretitude e governança. Arte & Ensaios, n. 37, março de 2019.

    OLIVEIRA, Acauã. Medida Provisória: é possível um antirracismo sem luta de classes?. Revista Lavra Palavra. Maio, 2022

    SILVA, D. F. A DÍvida Impagável; tradução: AmIlcar Packer e Pedro Daher. São Paulo: Oficina de Imaginação Política e Living Commons, 2019.

    RAMOS, Lázaro. Medida provisória: Diário do diretor. Rio de Janeiro: Editora Cobogó, 2022.