Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Glauber Brito Matos Lacerda (Uesb)

Minicurrículo

    Doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas (PPGCOM/UFBA). Desde 2012, é professor de técnicas de sonorização e documentário no Curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. No doutorado, iniciou uma pesquisa sobre a poética sonora do Noticiero ICAIC, cinejornal cubano. Atualmente, coordena o projeto de pesquisa “A música no Noticiero ICAIC Latinoamericano (1968-1972)”, que mapeia e analisa os usos musicais no programa noticioso.

Ficha do Trabalho

Título

    A voz de Fidel Castro no Noticiero ICAIC Latinoamericano

Seminário

    Estilo e som no audiovisual

Formato

    Presencial

Resumo

    A presente comunicação trata dos usos da voz de Fidel Castro nas cinerreportagens Noticiero ICAIC Latinoamericano sobre o Vietnã. Ao analisar as edições 291 e 651, percebemos duas estratégias distintas. No primeiro exemplo, o Fidel “porta-voz”, imbuído de um ethos guerrilheiro, mobiliza as lideranças terceiro-mundistas nas lutas de libertação contra o Imperialismo. No segundo, o Castro “narrador” monumentaliza os logros dos vietnamitas como triunfos de todo Terceiro Mundo.

Resumo expandido

    O Noticiero ICAIC Latinoamericano (NIL) foi o cinejornal oficial da Revolução Cubana. Entre 1960 e 1990, circularam 1493 edições nos cinemas cubanos. Durante 30 anos, o Vietnã e os vietnamitas foram temas recorrentes nas cinerreportagens. Em meio a Segunda Guerra da Indochina, entre as décadas de 1960 e 1970, a denúncia da ingerência estadunidense e a exaltação da resistência das forças anti-imperialistas no Vietnã foram pautas constantes.
    Antes mesmo do triunfo revolucionário de 1 de janeiro de 1959, os rebeldes transmitiam, através da emissora clandestina Radio Rebelde (PASQUALINO, 2016), mensagens para todo país e a voz de Fidel Castro, que já era um personagem nacionalmente conhecido desde o princípio da década de 1950, passa a ser cada vez mais familiar para os cubanos. Após a ascensão ao poder, os discursos de Castro passam a ser constantes na TV, no rádio, nos alto-falantes das sedes dos Comitês de Defesa da Revolução, sendo que alguns momentos históricos das suas falas foram registrados em LP e distribuídos para reprodução doméstica.
    A hipótese central da tese de doutoramento da qual essa comunicação deriva é que o cinejornal representa os vietnamitas sob dois regimes poéticos que ora entrecruzam ora se justapõem, denominados aqui de mimetizante e monumentalizante. O primeiro modo é mais comum na década de 1960. Em meio à escalada de violência militar dos EUA no Vietnã e das profundas transformações sócio-políticas da sociedade cubana, o heroísmo, a frugalidade e a resiliência dos vietnamitas são apresentados como características dignas de serem imitadas pelos cubanos. Já na década de 1970, quando a Guerra caminhava para um desfecho e a vitória das forças anti-imperialistas do Vietnã se desenhava, as reportagens tendem a monumentalizar os triunfos do povo vietnamita como logros dos povos oprimidos do então Terceiro Mundo. Tais tendências são chaves para a análise da voz de Castro nas duas edições do NIL aqui escrutinadas.
    A edição 291, de 17 de janeiro de 1966, tem como espinha dorsal o discurso de encerramento da Conferência Tricontinental. O Evento foi uma iniciativa articulada a partir de Havana para se constituir uma via de posicionamento dos países do Terceiro Mundo independente dos dois grandes pólos da geopolítica mundial: Os EUA e a URSS. A voz de Fidel Castro se sobrepõe ao discurso de todos os líderes da América Latina, África e Ásia presentes, numa espécie de “Castrovococentrismo”. No seu discurso, marcado pelo ethos guerrilheiro das palavras e gestos do mandatário, Fidel declara solidariedade irrestrita aos vietnamitas, e exorta os cubanos a se engajarem na luta internacionalista contra o Imperialismo, sendo o povo do sudeste asiático sendo apresentado como exemplo a ser imitado.
    Já na edição 651, estreado em 4 de abril de 1974, em ocasião da visita do primeiro-ministro da República Democrática do Vietnã, Pham Van Dong, no Ato de Solidariedade e Amizade com o Povo Vietnamita, Castro narra a história de luta do passado recente dos vietnamitas e do seu líder maior, Ho Chi Minh. As imagens de arquivo e os registros da visita do político vietnamita em Cuba compõem uma espécie “monumento em celulose” (BERTHIER, 2022) das conquistas dos povos da periferia global como um farol que direciona para um futuro de libertação.

Bibliografia

    CANTÓ, P. Fidel em cifras: do discurso mais longo na ONU a aparições em ‘Os Simpsons’.El País, 27 nov. 2016. Disponível em: . Acesso em: 5 abr. 2021.
    CHION, M. A audiovisão. Lisboa: Texto & Grafia, 2011.
    LABRADA, J. Entrevista concedida a Glauber Lacerda. San Antonio de los Baños (Cuba), 15 de janeiro de 2020.
    LACERDA, Glauber Brito Matos. Ouço Cuba, vejo o Vietnã: monumento e mimeses da poética anti-imperialista do Noticiero Icaic Latinoamericano.  Tese (Doutorado) – Faculdade de Comunicação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2021. 
    PASQUALINO, B. A Radio Rebelde como arma de guerrilha. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, São Paulo, 2016.
    PEIGNER, S.; ZAPATA, P. Analysis of Fidel Castro Speeches Enhanced by Data Mining. Digital Humanities Benelux Journal, Amsterdã, v. 1, p. 1-35, 2019.