Ficha do Proponente
Proponente
- Geisa Rodrigues (UFF)
Minicurrículo
- Geisa Rodrigues é professora associada do departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense. Mestre em Comunicação e Imagem pela Universidade Federal Fluminense e Doutora em Letras pela PUC-Rio. Atualmente coordena o projeto de pesquisas “Laboratório de pesquisas em gênero e raça na mídia e nas artes”, na UFF.
Ficha do Trabalho
Título
- Poéticas e estéticas decoloniais em videoclipes latino-americanos
Seminário
- Cinemas pós-coloniais e periféricos
Formato
- Presencial
Resumo
- Este trabalho busca investigar videoclipes latino-americanos produzidos a partir da segunda década do século XXI que configuram experiências poéticas e estéticas decoloniais com potencial transformador. As estratégias de ocupação destes corpos se dão por meio do uso de diferentes referências estéticas, numa espécie de profanação multifatorial de referências, instaurando um “lócus fraturado” e uma experiência de fronteira em obras audiovisuais com grande capacidade de circulação e disseminação.
Resumo expandido
- Este trabalho busca investigar videoclipes latino-americanos produzidos a partir da segunda década do século XXI que configuram experiências de criação poéticas e estéticas decoloniais com potencial transformador. Para exemplificar alguns dos materiais a serem analisados, trabalhos como o videoclipe brasileiro “Africaniei”,( Majur 2018), o videoclipe convocatório para a Huelga feminista de 2021( Coordinadora Feminista 8M, Chile, 2021), e o videoclipe colombiano “Eso que tu haces” (Lido Pimienta, 2020) compõem o corpus de investigação. Tais obras expõem encontros e fusões em performances que envolvem corpos em cena evidenciados em sua textura e contrastes e que, se tocam, dançam, se pintam, se unem em caminhada, . As estratégias de ocupação destes corpos se dão por meio do uso de diferentes referências estéticas, que circulam da videoarte à linguagem do videoclipe e da propaganda, e às performances caseiras, numa espécie de profanação multifatorial de referências, trabalhando, dessa forma, numa fronteira entre linguagens e experiências que se fundem e se chocam ao mesmo tempo. Maria Lugones, em sua proposta de um pensamento marginal e feminismo decolonial, se baseia no exemplo da leitura de Walter Mignolo sobre a obra de Glória Anzaldúa, sugerindo que uma chave para descolonizar o poder seria buscarmos lócus fraturados de resistência, , “ onde a liminaridade da fronteira é um solo, um espaço, uma fronteira, para usar o temo de Gloria Anzaldúa, não apenas uma fenda, não uma repetição infinita de hierarquias dicotômicas entre espectros do humano desalmados” (LUGONES, 2014, p. 947). A mistura de referências, afetos e corpos nesses materiais visa carregar o espectador para a dimensão de um “lócus fraturado” que ao mesmo tempo desafia sistemas de representação (HALL, 2016) cristalizados. Estas experiências flertam também com o conceito de Amefricanidade, de Lélia Gonzalez, com vistas a unir os povos advindos da África e habitando as américas, para romper com a supremacia do pensamento branco e a ideia de uma superioridade europeia, ou melhor, um ponto de vista europeu, a partir do qual nossas nações (latino-americanas) teriam nascido, ainda que com o toque “apimentado e mestiço” de uma pretensa “democracia racial”, tese duramente criticada por Gonzalez. A amefricanidade pressupõe uma lógica de libertação e combate aos efeitos do imperialismo centrada na voz e na percepção dos oprimidos e não nos opressores. Entendendo que não se faz revolução de “fora pra dentro”, Gonzalez valoriza também saberes muitas vezes relegados a uma inferioridade, como a música, a ginga, a oralidade e os afetos advindos de África. Propõe refutar a exotização e a mitificação da experiência africana e indígena, que acaba distanciando descendentes de sua ancestralidade e amenizando a violência da experiência da escravidão. Partindo desses pressupostos, interpretamos a comunhão de personagens e performances de raças, povos, gêneros, estéticas e vivências periféricas nos vídeos em questão, em sua potência de criar conexões reforçadas, como pontes para uma cosmovisão de atuação política, em oposição a forças opressoras de matriz colonial. Tais experiências refletem efeitos também dos movimentos políticos contemporâneos que eclodiram a partir de 2011, em sua articulação com os espaços de reivindicação que se formaram nas redes e nas ruas. Judith Butler (2017) retoma o tema da performatividade de gênero e da representação ao considerar as articulações políticas e as reivindicações feitas em nome do gênero e do sexo atos performativos nas manifestações de rua contemporâneas (2017, p. 64). Trata-se, também, de uma forma de agir contra a precariedade que envolve os que não têm direitos. Neste sentido, nos vídeos em questão a própria vulnerabilidade colocada em cena pode fazer eclodir ressignificações e rupturas para as minorias sociais evidenciadas em sua potência criadora e transgressora.
Bibliografia
- BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: Notas sobre uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.
GONZALEZ, Lélia.A categoria político- cultural de de Amefricanidade. In Revista Tempo Brasileiro, n. 92/93, 1998.
HALL, Stuart. Cultura e representação. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio: Apicuri, 2016.
HOOKS, Bell. Olhares Negros: raça e representação. São Paulo: elefante, 2019.
LUGONES, María. Rumo a um feminismo descolonial. Trad. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, 22(3): setembro-dezembro/2014
MALDONALDO-TORRES, Nelson . Sobre la colonialidad del ser: contribuciones al desarrollo de un concepto. In: CASTRO-GÓMES, Santiago; GROSFOGUEL, Ramón. El giro decolonial. Refl exiones para una diversidad epistémica más allá del capitalismo global. Bogotá.
Siglo del Hombre Editores; Universidad Central; 2007.
SODRÉ. Muniz. Pensar Nagô. Petrópolis- RJ: Ed.Vozes, 2017.