Ficha do Proponente
Proponente
- Victor Cardozo Barbosa (UNICAMP)
Minicurrículo
- Victor Cardozo Barbosa é mestrando do Programa de Pós-Graduação em Multimeios, no Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Formado em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal de Sergipe em 2019 com a monografia intitulada “A Ironia Sacramental nos Melodramas de Douglas Sirk”.
Ficha do Trabalho
Título
- Os padrões de intenção incorporados ao ensaístico em Welles
Formato
- Presencial
Resumo
- Este trabalho propõe uma análise comparativa entre os filmes ensaísticos de Orson Welles, F for Fake (1972) e Filming Othello (1978), tendo como ponto de partida domínio do filme-ensaio (Teixeira, 2015) e a incorporação dos padrões de intenção (Baxandall, 2006) para compreender como ele se vale das possibilidades e fragmentos de sua própria obra anterior para reconfigurá-la no domínio ensaístico.
Resumo expandido
- O filme-ensaio constrói suas fundações sobre terreno pantanoso, perenemente privado de uma forma fixa e unívoca. O problema da expressão do pensamento, anunciado como vocação no horizonte do cinema por Astruc em seu célebre libelo pela caméra stylo (2012), é possivelmente sua força-motriz, mas não seu limite: não se trata apenas de que o pensamento do autor meramente encontre sua expressão pela forma mas que esse pensamento seja também desenvolvido através dela, atendendo à máxima godardiana de ser “uma forma que pensa”.
Dentro da errática obra de Orson Welles, não é preciso ir muito longe para justificar o pertencimento de seus filmes mais inclinados à expressão de um pensamento pela forma, F for Fake (1973) e Filming Othello (1978), dentro da linhagem ensaística no cinema. Certamente não há dúvida de que ambos se dediquem a tal expressão com a coordenação de todos os recursos à disposição da forma cinematográfica, sobretudo a montagem. São ademais obras que não poderiam caber em outro lugar, uma vez que não se limitam a serem filmes de ficção, documentais ou experimentais embora incorporem fragmentos desses três domínios “clássicos” do cinema que antecedem o domínio do filme-ensaio (Teixeira, 2015). Sobretudo, ambos os filmes, ainda que cada um o faça de maneira distinta, caminham sob a estrela da “lei mais profunda” do ensaio (Adorno, 2012): a heresia. Cada um impõe para si mesmo regras que são prontamente descumpridas e cada domínio dado como reconhecível de início sofre a intrusão de um outro, tendo o raciocínio do autor como único fio de unidade.
Pretende-se aqui uma análise comparativa de F for Fake e Filming Othello, tendo como ponto de partida a maneira como os padrões de intenção presentes no processo de criação de maneira geral (Baxandall, 2006) são incorporados dentro do percurso ensaístico que os constitui.
No corpo a corpo com a obra fílmica, mesmo que se possa atribuir unidade dentro dessa pressuposta predominância do raciocínio do cineasta, o caminho no filme ensaio permanece, por definição errático: a digressão é uma recorrência fundamental. Mas suas duas maiores incursões sobre o domínio ensaístico não se contentam em transitar pelos temas que são escolhidos como mote e ponto de partida de cada um. São também oportunidades para retomar e refazer obras passadas (fragmentos de filmes inacabados e mesmo projetos nunca iniciados em F for Fake; o Othello de 51 e as incontáveis versões interditadas do mesmo em Filming Othello).
A proposta de Welles é de não apenas explorar os temas, expressar o pensamento pela forma fílmica, mas oferecer também as metamorfoses desse pensamento pela forma, os rascunhos do ensaísta: trazer à tona os padrões de intenção de um processo de criação perene que pensa a si mesmo através da forma. Eles são dispostos como um trajeto em paralelo com o pensamento ensaístico que perpassa o filme. O cineasta ensaísta radicaliza a lógica da “forma que pensa” fazendo-a voltar-se para si mesma incessantemente ao mesmo tempo em que desenvolve a expressão de um pensamento. Em ambos os casos, Welles examina sua própria obra com um olhar de arqueólogo das contingências de seu processo de criação e dos caminhos não tomados, vendo as diversas camadas de tempo sobrepostas em sua vida e obra. No entanto, sua preocupação está muito mais em continuar se valendo de tais “camadas” como matéria prima para transfigurar efetivamente as obras e os tempos passados numa nova obra que faz coincidir o tempo presente do ato de criar com o tempo presente do olhar do espectador no seu momento de imersão no filme.
Bibliografia
- ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. in ADORNO, Theodor W. Notas de literatura I. 2ª edição. São Paulo: Editora 34, 2012.
ASTRUC, Alexandre. Nascimento de uma vanguarda: a caméra stylo. In ANDRADE, Bruno. BAPTISTA, Lucas, CARTAXO, Matheus, (eds). Foco – Revista de Cinema. Ed. #4. Julho 2012. Disponível em http://www.focorevistadecinema.com.br/FOCO4/stylo.htm Acesso em: 29 mai. 2022.
BAXANDALL, Michael. Padrões de intenção: a explicação histórica dos quadros. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
CORRIGAN, Timothy. The Essay Film: From Montaigne, After Marker. [s.l.]: Oxford University Press, USA, 2011.
TEIXEIRA, Francisco Elinaldo. O Ensaio no Cinema: Formação de um quarto domínio das imagens na cultura audiovisual contemporânea. 1ª edição. São Paulo: Hucitec, 2015.