Ficha do Proponente
Proponente
- Roberta Veiga (UFMG)
Minicurrículo
- Doutora em Comunicação pela UFMG, professora do Dep. Comunicação e do PPGCOM-UFMG. Editora da Devires; coordenadora do Poéticas Femininas, Políticas Feminista (UFMG-Cnpq); do GT Estudos de Cinema, Fotografia e Audiovisual (COMPÓS) e ST Cinemas mundiais entre mulheres (SOCINE). Introduziu disciplinas de Cinema e Feminismo na UFMG. Tradutora de Nothing Happens: Chantal Akerman’s Hyperrealist Everyday, de Ivone Margulies; autora em Feminismo e Plural; Mulheres de cinema brasileiro; etc.
Ficha do Trabalho
Título
- Ser filha pelo cinema: o que se nomeará feminismo em Daughter Rite
Seminário
- Cinemas mundiais entre mulheres: feminismos contemporâneos em perspectiva
Formato
- Presencial
Resumo
- Indagamos o filme Daughter Rite, de Michelle Citron, em suas escolhas formais – uso de arquivos caseiros, entrevistas, off, e montagem -, buscando, de saída, nomear feminismo a relação mãe e filha. A hipótese é de que o cinema doméstico, na auto-inscrição da diretora que coloca a mãe em cena, elabora essa relação, e, assim, faz pensar o que pouco se enfrentou: que a feminilidade faz questão na experiência com a primeira mulher – a mãe – que vai se instaurar entre identificação-desidentificação.
Resumo expandido
- Ainda no caminho de reflexão de minha pesquisa sobre Formas de insubordinação Materna no Cinema, entendendo que a maternidade é um veio do feminismo de extrema relevância, que cobre uma extensa cinematografia de filmes dirigidos por mulheres e dirigidos a mulheres, pretendo explorar, diferente de meu último trabalho endereçado à SOCINE em 2021 – Filmar a mãe: exercícios-fílmicos no confinamento do ensino remoto -, a lida com um filme em específico: Daughter Rite, de Michelle Citron (1980). Nesse, documentário ensaístico, a filha “filma” – entre muitas aspas, porque na verdade monta arquivos de filmagem, textos e depoimentos – a mãe. Volto então as minhas últimas comunicações, me debruçando sobre o cinema em que filhas que filmam suas mães, como trabalhos em primeira pessoa, de experiencia pessoal e familiar, lançando a hipótese de que esses são menos representações do maternar, como nos filmes ficcionais (por mais complexos que sejam) do que uma reelaboração e uma reinstituição do laço que a filha fez/faz, teve/tem, ou entende ter com a mãe. A partir dessa experiência íntima, subjetiva, e que aposta no cinema como lugar estético portanto político de elaboração e reinvenção da relação mãe e filha, como apontado no título, pretendemos depreender um pensamento sobre o feminismo. Dizer não apenas que feminismo é esse que o filme formula em seus processos formais e em sua fatura, mas como nomeá-lo junto à investigação sobre a relação mãe-filha.
Em busca dessa nomeação, chamamos a psicanálise – junto com autoras como Luce Iragary, Nancy Chdorow, Malvine Zalcberg, entre outras, mas também a antropologia familiar – com a intenção de discutir porque o vínculo mãe-filha é instituinte do pensamento feminista. Ao analisar o feminismo a partir do cinema, indaga-se porque filmes em que filhas filmam as mães fazem desse um lugar privilegiado e complexo de pensar a experiencia entre mulheres (de vida e cinematográfica).
Meu desejo é destacar o modo como a cineasta filha mesmo que represente suas vivencias em imagens pré-fabricadas, que traga um a priori da relação com a mãe para o filme, vai sempre, na lida com o fazer fílmico, a partir do aparato cinema, ensejar um processo de elaboração da relação. Tal processo ocorre na medida em que a busca do real só pode se dar pela ficcionalização/imaginação, seja por conta do caráter fugidio do presente, ou da impossibilidade de restituição inteira da memória, ou da artificialidade da linguagem cinematográfica – isto é naquilo que a filha precisa arquitetar em termos de mise-en-scène e montagem – ao mesmo tempo em que nunca deixar de partir e/ou mirar o real.
Difícil e controverso, Daugther Rite traz uma publicização da intimidade da relação de Michelle Citron, a cineasta, com sua mãe, de modo a revelar uma posição extremamente ambígua e dura da filha, que ao mesmo tempo em que se vê mimetizando a mãe, e incapaz de escapar de seu decalque, afirma seu desgosto por se parecer com ela. Nessa medida, pretendemos questionar de que maneira as formas fílmicas e as escolhas procedimentais, bem como o método de aproximação e abordagem da mãe e das relações familiares, no filme, apontam um paradoxo muitas vezes apaziguado pelos dispositivos machistas: de que o amor de mãe é inquestionável e inato. Pretendemos, ainda, aprofundar o questionamento desse lugar fixo da mãe inequívoca, buscando entrever, no mecanismo construído pela diretora, em que medida a forma de maternar constitui um processo de aprendizado de como enfrentar os dispositivos de controle biopolíticos machistas – e a angústia e culpa por eles gerada – talvez menos para mãe do que para filha. Menos justamente porque a mãe está no lugar, muitas vezes irrefletido, de cumprir seu destino biológico, enquanto a filha, por isso mesmo, vivencia sua primeira e mais conturbada experiencia de se constituir mulher, na medida em que ser filha desponta como sua primeira relação entre mulheres.
Bibliografia
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