Ficha do Proponente
Proponente
- Ana Caroline Fogaça Barbosa (ESPM)
Minicurrículo
- Mestranda em Comunicação e Práticas de Consumo pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM, bolsista PROSUP-CAPES integral. Desenvolve a pesquisa “O Feminino como monstruoso no cinema” em seu trabalho de mestrado. Integrante do grupo de pesquisa Sense – Comunicação, consumo, imagem e experiência (CNPq/ESPM). Especialista em Semiótica Psicanalítica – Clínica da Cultura – PUC-SP (2021). Graduada em Design de Produto – IED – SP (2015).
Ficha do Trabalho
Título
- A PELE QUE HABITO: MORADA MONSTRUOSA E OBJETO DE DESEJO
Formato
- Presencial
Resumo
- O presente trabalho pretende discutir aspectos sob os quais o feminino pode estar relacionado ao monstruoso no filme La piel que habito (2011), de Pedro Almodóvar. Partindo da construção histórica ocidental do conceito de monstro e sua relação com o feminino, será feita uma análise do filme demonstrando elementos estéticos que resgatam tais heranças históricas. O objetivo é apresentar tal correlação, questionar valores tidos como femininos e o quanto eles se modificam no decorrer do tempo.
Resumo expandido
- O filme espanhol “A pele que habito”, de 2011, foi dirigido por Pedro Almodóvar e inspirado no romance francês Mygale, de 1995, escrito por Thierry Jonquet. Nesta obra, o corpo feminino é representado paradoxalmente como prisão e prisioneiro da ordem masculina. Além de ser um filme do gênero de terror e suspense também aborda a questão de gênero sexual.
Tal obra usa da linguagem cinematográfica para transmitir a atmosfera aterrorizante que, segundo Noel Carrol (1999, p.76), é construída através do estado cognitivo de horror e repulsa em relação à ideia de monstro. Neste trabalho, será apresentado de que modo tais estados são manifestos através da linguagem cinematográfica em relação à ideia ocidental de monstruosidade.
A definição de monstruoso adotada é a do ser que possui “proporções descomunais que, com os mais variados aspectos e formas, tem sua origem em mitos ou na fantasia, geralmente trazendo consigo um comportamento violento e ameaçador” (MONSTRO, 2019). Segundo Felinto e Santaella (2012, p.84) a origem do conceito surgiu a partir da mitologia, folclore, contos populares e relatos de viajantes que foram a terras inexploradas. De acordo com Leite Júnior (2007, s/p.): “[…] monstros estão fora dos pré-supostos de ordem, do que é natural ou conhecido e que, frequentemente o conceito é entendido como uma transgressão das leis estabelecidas, inspirando temor, dúvida, punição contra infrações, mas também fascínio, encanto, curiosidade e algo da ordem do desejo”.
De acordo com Maldonado Torrres (2019, p. 37), a chegada dos europeus às Américas foi um acontecimento importante para a consolidação cultural do conceito de humanidade e alteridade. Segundo o autor, as diferenças radicais entre indivíduos passaram a ser mais acentuadas pela ideia monoteísta de um Deus criador de tudo, difundida por textos da antiguidade que não contemplavam a descoberta de tais terras. Deste modo, passa a haver uma necessidade de apropriação, classificação e hierarquização com relação a tudo que era novo e desconhecido proveniente dessas terras.
Isso se relaciona ao conceito de monstro pois nesse período tudo o que fugia dos preceitos cristãos passou a ser classificado como maligno, a exemplo das práticas pagãs. Tais práticas, muitas vezes, eram realizadas por mulheres cujos respeitados saberes ancestrais relacionados ao corpo e à natureza passaram a ser vistos como ameaças à ideologia cristã.
Desde o período da Idade Média, no entanto, se fizeram vigentes modelos que caracterizavam certas condutas e concepções de feminino como boas e ruins. Com elas, se cristalizou o modelo de positivação feminina da imagem de Maria que, segundo Denovac (2016, p.176): “[…] pode ter reforçado ainda mais a visão negativa do feminino e seu corpo, pois somente aquelas que se enquadravam no modelo Mariano, de pureza e castidade e portanto da negação do seu corpo e de seus prazeres eram vistas socialmente como ‘boas mulheres’.”
O filme manifesta tais ideais consolidados na cultura e o horror acontece em relação à falta de domínio sobre as intervenções no corpo da protagonista que, na narrativa, se torna cada vez mais possível quanto mais feminino o corpo se torna. Tais intervenções são feitas em função do desejo masculino e uma série de elementos culturalmente atrelados ao feminino são impostos, mas ressignificados como instrumentos de criação artística e libertação. O paralelo entre artista e obra é feito visualmente por todo o filme com planos de objetos artísticos, como quadros, desenhos e esculturas intercalados entre cenas visualmente similares do corpo da protagonista como uma obra a ser modelada contra sua própria vontade pelo cirurgião Robert.
O artigo pretende discorrer tais acontecimentos históricos, apontar em maior detalhe elementos da linguagem fílmica que manifestam lapsos reminiscentes do feminino monstruoso na história do ocidente a fim de refletir sobre como estas ideias podem ser articuladas de modo a questionar valores tidos como femininos.
Bibliografia
- CARROL, Noël. A filosofia do horror ou paradoxos do coração. Campinas: Papirus, 1999.
DENOVAC, Adriano. “A natureza é a igreja de Satã”: e o feminino que nos olha por entre no filme Anticristo de Lars Von Trier. In: Cinema e Corpo. Soraia Chung Saura & Ana Cristina Zimmermann (orgs.). São Paulo: Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária – USP / Editora Laços, 2016.
FELINTO, Erick; SANTAELLA, Lucia. O explorador de abismos: Vilem Flusser e o pos-humanismo. 1. ed. Sao Paulo: Paulus, 2012.
LEITE JÚNIOR, José. Monstruosa humanidade. ComCiência, Revista eletrônica de jornalismo científico, n. 92. 2007.
MALDONADO-TORRES, Nelson. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: BERNARDINO-COSTA, Joaze, TORRES-MALDONADO, Nelson, GROSFOGUEL, Ramón (orgs.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica, 2019, p. 27-53.
MONSTRO. In: DICIO, Dicionário Online de Português. Porto: 7Graus, 2019.