Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    ANA PAULA VERAS CAMURÇA VIEIRA (UFC)

Minicurrículo

    Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação Social da UFC (PPGCom | UFC), na linha Fotografia e Audiovisual. Mestre em Artes (PPGArtes ICA | UFC), na linha Arte e Pensamento, e graduada em Cinema e Audiovisual (UFC). Integrante do Laboratório de Estudos e Experimentação em Audiovisual (LEEA-UFC). Atualmente, coordena o projeto Cinema no Brejo – Laboratório Rural de Formação e Experimentação Audiovisual.

Ficha do Trabalho

Título

    Disputar os espaços, (re)imaginar o tempo: notas para um emaranhado

Formato

    Presencial

Resumo

    Os filmes Boca de Loba (2018) e Espavento (2019) criam narrativas de tempos e espaços outros para interrogar conflitos políticos do presente, colaborando com o enfrentamento aos projetos hegemônicos de cidade e desestabilizando uma certa noção de tempo. Junto às cenas de resistência que habitam essa matéria fílmica, analisaremos, a partir do conceito de emaranhamento (FERREIRA DA SILVA, 2019), alguns acontecimentos imagéticos e as relações que se criam entre os sujeitos, as imagens e o mundo.

Resumo expandido

    Diante de uma constante reestruturação do espaço urbano orientada por imaginários e modos de vida funcionais a uma racionalidade tecnicista, positivista e linear, alguns filmes recentes do cinema brasileiro surgem da necessidade de se imaginar alternativas que escapem a um modelo de desenvolvimento atrelado à noção de progresso. Para a pesquisadora Ana Caroline de Almeida (2020), que vem se debruçando sobre algumas dessas produções em seus trabalhos, é a partir da proposição de tempos não-lineares que os filmes elaboram sobre as disputas que se inscrevem em pleno tecido urbano. Partimos aqui do encontro entre os filmes Boca de Loba (2018) e Espavento (2019), ambos realizados e protagonizados por mulheres na cidade de Fortaleza (CE). São filmes que elaboram sobre o real interrogando uma série de conflitos políticos do presente, a partir da criação de narrativas que se apropriam do artifício (PHRYSTON, 2015) para criar outras configurações de tempos e espaços.

    Na medida em que acompanhamos a ocupação da cidade por corpos desobedientes de gênero (MOMBAÇA, 2018) que desordenam espaços em movimentos de resistência a suas formas hegemônicas, percebemos que cada filme, à sua maneira, para além de uma recusa do imperativo do progresso, parece contribuir para o borramento de todo um modelo temporal cronológico. Em Espavento (2019), acompanhamos a saga de Enya, que junto aos seus aliades, implanta uma bomba em uma grande empresa de construção civil responsável pela contaminação de uma patologia que prejudica o sistema respiratório. Já em Boca de Loba (2018), acompanhamos um grupo de mulheres que se reúnem no subsolo, movimentam-se em bando e reconfiguram a paisagem urbana ao atacarem os bustos. Se para uma noção de tempo pautada pela sucessividade, o futuro é tido como o lugar das remodelações constantes, das promessas de grandes empreendimentos e de todo um repertório de práticas de exploração e expansão das desigualdades e o passado é representado por símbolos que caracterizam episódios de violência para comunidades inteiras, o que os filmes passam a propor são modos de reescrever radicalmente nossa relação com o tempo através das imagens.

    Penso, como um gesto primeiro de aproximação às questões que as imagens suscitam, em proposições já formuladas por autoras que apostam em uma concepção de tempo que já não é mais marcada pela sucessividade, com direção e sentidos progressivos. Denise Ferreira da Silva (2016) sugere que abandonemos as delimitações de um Mundo Ordenado, uma proposição que nos interessa por oferecer outros descritores poéticos capazes de romper com os limites que são constantemente impostos à nossa imaginação através da linearidade e por apontar caminhos rumo à constituição do que seria um Mundo Implicado. Ao abraçar a implicação como posicionamento fundamental, seguimos as pistas de um Cinema Implicado (DOS SANTOS, 2020), rompendo com a possibilidade de pensar as imagens como expressões singulares de formas separadas e propondo uma atenção ao emaranhado profundo que se constitui nesse gesto para além da representação.

    Sem perder de vista o debate sobre a falência dos projetos hegemônicos de cidade e rompimento com um tempo linear, partiremos das cenas de resistência presentes nos filmes, onde os corpos estão implicados em práticas de reordenamento do espaço urbano, para analisar alguns acontecimentos imagéticos e a forma como eles tecem relações entre os sujeitos, as imagens e o mundo. Nesse sentido, nossa proposta é traçar um emaranhado composto não só por cenas da matéria fílmica em questão, mas também por outras imagens que a excedem, articulando-as enquanto forças que inventam paisagens e reivindicam outras concepções de tempo e outros modos de fazer cidade.

Bibliografia

    ALMEIDA, A. C. Ruínas Futuristas do Cinema Brasileiro Contemporâneo. Revista Logos: Comunicação e Universidade, 2020, v. 27, n. 3

    FERREIRA da SILVA, Denise. Sobre diferença sem separabilidade. In: BIENAL DE SÃO PAULO. Incerteza viva: catálogo. São Paulo, 2016. Catálogo da exposição Incerteza Viva da Bienal de São Paulo, de 7 de setembro a 11 de dezembro de 2016, pp. 57 – 63.

    MOMBAÇA, Jota. Rumo a uma redistribuição desobediente de gênero e anticolonial da violência! In: PEDROSA, Adriano; MESQUITA, André. Histórias da sexualidade: antologia. São Paulo: MASP, 2017b. (301-310).

    PRYSTHON, A.. Furiosas frivolidades: artifício, heterotopias e temporalidades estranhas no cinema brasileiro contemporâneo. Revista Eco-Pós, 2015, 18(3), 66–74.

    SANTOS, Matheus Araujo dos. “Atravessando abismos em direção a um Cinema Implicado: negridade, imagem e desordem”. In: Revista Logos, 52, vol27, n.01. UERJ, 2020.