Ficha do Proponente
Proponente
- Rodrigo Almeida Ferreira (UFRN)
Minicurrículo
- Coordenador do curso de Comunicação Social – Audiovisual da UFRN, Rodrigo é um dos criadores e administradores da página Saquinho de Lixo e membro-fundador do coletivo Surto & Deslumbramento. Rodrigo é diretor dos premiados curtas “Casa Forte” (2013), “Como era gostoso meu cafuçu” (2015) e “O nascimento de Helena” (2021), além de ter desenvolvido coletivamente algumas videoinstalações. Atua de forma independente como curador, pesquisador, escritor, cineasta e fotógrafo.
Ficha do Trabalho
Título
- Filmando sonhos & desejos: uma conversa com o Surto & Deslumbramento
Mesa
- Filmando sonhos & desejos: uma conversa com o Surto & Deslumbramento
Formato
- Presencial
Resumo
- Em 2022, o coletivo Surto & Deslumbramento completa 10 anos com três filmes novos: os médias “Sonhos”, de Chico Lacerda e “Vênus de Nyke”, de André Antônio e o curta “O Nascimento de Helena”, de Rodrigo Almeida. Propomos compartilhar os processos estéticos e técnicos das produções, suas especificidades, diálogos e diferenças, retomando temas já presentes em outras obras do coletivo: o interesse por experiências fora do realismo, por uma sexualidade perversa e pela ressignificação de imagens.
Resumo expandido
- A finalidade desta sessão livre é partir da discussão de processos específicos de criação audiovisual do coletivo Surto & Deslumbramento para propor reflexões sobre as sexualidades desviantes/perversas no cinema (DE LAURETIS, 2011; EDELMAN, 2004), a ressignificação e apropriação de materiais audiovisuais como operações de composição das obras (RAMALHO, 2020) e, ainda, o artifício como aspecto que atravessa as escolhas estéticas dos diferentes membros do coletivo. Interessam-nos também as diferenças que marcam os distintos formatos de produção e circulação das obras, e mesmo as diferentes materialidades nelas implicadas (BRUNO, 2014).
“Sonhos” (2022), de Chico Lacerda, foi estruturado a partir de uma narração em primeira pessoa que descreve vários locais e situações que o diretor recorrentemente visitava desde criança, durante o sono. Adicionou-se a isso uma narrativa-moldura ficcional que abre o filme mostrando um documentarista indo dormir com sua câmera e, ao final, o personagem acordando e revisando o material filmado.
Entre as cenas ficcionais inicial e final, temos a maior parte do filme, com a narração guiando as imagens dos sonhos que o personagem supostamente filmou durante a noite. Para caracterizar a “oniricidade”, foi utilizada a textura e cores sui generis da película em 16mm. As características plásticas da película constroem universos que, ainda que utilizem locações reais, remetem a paisagens mentais, simbólicas e/ou oníricas.
Por sua vez, no filme de André Antônio, o desafio foi criar um roteiro extremamente barato, que desse para ser filmado em uma única locação e com equipe mínima, garantindo a segurança dos envolvidos em meio à pandemia da COVID-19. Como este filme é sobre um tesão por pés, meias e tênis, seu título é “Vênus de Nyke” (2021). “A Vênus das Peles” é um livro de 1870 (SACHER-MASOCH, 2015), deu origem ao termo “masoquismo” e conta a história de um homem que sente tesão por mulheres que se vestem com peles. Entre o fim do século XIX e o começo do XXI, a figura dominadora se transformou: ao invés de peles, usa roupas esportivas.
O filme foi mais pensado para espectadores que porventura viessem a compartilhar daquele erotismo do que para espectadores baunilha. Tentamos evitar um filme higienizado que quisesse provar que o fetichismo masoquista gay é algo “normal” (SONTAG, 2001). Também é um filme que se quer divertido, engraçado. Tentamos investigar como o BDSM tem transitado do universo das peças de couro para o mundo das roupas esportivas e suas marcas. É outra fantasia de masculinidade, onde a figura do motociclista (cap, jaqueta, botas) dá lugar à figura do bad boy moldada ao longo da década de 1990 (boné, tênis, calça adidas).
Por fim, “O nascimento de Helena” (2021), de Rodrigo Almeida, é um experimento que dialoga com iniciativas do “vertical cinema”, a partir do uso do celular como dispositivo de criação obsessiva de material audiovisual e experimentação artística. Tal produção faz vasto uso dos “filtros”, popularizados em diversos aplicativos, reforçando certa fascinação pela facilidade de deformar rostos, corpos, mas também a realidade como um todo. Dessa forma, praticamente todo material bruto de “O nascimento de Helena” foi antes um conjunto de Stories do Instagram, que posteriormente, rearticulado, se tornou um filme.
Vale destacar ainda dois outros pontos. O primeiro é trazer uma experiência de ser gay e levar seu desejo até as últimas consequências, sem culpa ou sofrimento, expondo uma certa pulsão pelo perigo como forma de prazer. A aventura e a perversão como sonhos realizados. O segundo ponto é a vontade de discutir a proteção pela família, que move polos ideológicos antagônicos numa disputa pelo “conceito de família”, sobre o que constituiria uma família. Vemos pouco, no entanto, um debate crítico e provocativo sobre a família como uma instituição em si.
Bibliografia
- BRUNO, Giuliana. Surface: matters of aesthetics, materiality, and media. Chicago London: University of Chicago Press, 2014.
DE LAURETIS, Teresa. “Queer texts, bad habits, and the issue of a future”. GLQ: A Journal of Lesbian and Gay Studies, 17/2-3, 2011.
EDELMAN, Lee. No future: Queer theory and the Death drive. Durham: Duke University, 2004.
O NASCIMENTO DE HELENA. Direção: Rodrigo Almeida. Natal, Recife: Surto & Deslumbramento, 2021 (11 min).
RAMALHO, Fábio A. M. Repertórios audiovisuais e imaginação midiática no cinema contemporâneo. Significação – Revista de Cultura Audiovisual, v. 47, p. 130-146, 2020.
SACHER-MASOCH, Leopold. A Vênus das Peles. São Paulo: Hedra, 2015.
SONHOS. Direção: Chico Lacerda. Recife: Surto & Deslumbramento, 2022 (39 min).
SONTAG, Susan. “The pornographic imagination”. In: BATAILLE, Georges. Story of the Eye. London: Pinguin, 2001.
VÊNUS DE NYKE. Direção: André Antônio. Recife: Surto & Deslumbramento, 2021 (41 min).