Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Pedro Henrique Cândido da Silva (UFPE)

Minicurrículo

    Mestre em Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação, na linha de Fotografia e Audiovisual (2016) da Universidade Federal do Ceará(UFC). Doutorando em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) com pesquisa ligada à poética dos rastros no cinema contemporâneo. Atua também no campo da escrita criativa, desenvolvimento de projetos e roteiros para cinema.

Ficha do Trabalho

Título

    Poética dos rastros e da desaparição no cinema contemporâneo

Formato

    Presencial

Resumo

    O presente trabalho pretende tecer a relação entre rastro, paisagem e tempo no cinema contemporâneo, a partir de uma análise comparada entre os filmes A vida após a vida (Hanyi Zhang, 2016) e O que arde (Oliver Laxe, 2019). Com esse intuito, busco inspiração no percurso feito por Didi-Huberman (2011), descrito em seu texto Cascas, no qual conta de sua visita ao campo Auschwitz-Birkenau e compartilha seu olhar arqueológico a respeito dos resquícios do passado impressos na paisagem.

Resumo expandido

    Nos primeiros planos do filme O que arde (2019), filme de Oliver Laxe, nos deparamos com imagens de uma floresta escura e silenciosa, quase sobrenatural. De repente, as árvores começam a se agitar de maneira inexplicável e perturbadora. Não demora até entendermos que há um trator pondo tudo abaixo e limpando o terreno. Em meio a essa paisagem nebulosa Amador, que acaba de sair da prisão, tenta encontrar de volta o seu lugar no mundo. Já em Life after life (Zi fan ye mao) (2016), longa de estreia do cineasta chinês Zhang Hanyi, pai e filho parecem minúsculos diante de uma árvore monumental e com mais de mil anos de existência. A criança afirma que aquela árvore não os conhece e não se importa com a vida deles, já que viveu muitos anos e viu tantas pessoas importantes aparecerem e desaparecerem ali.

    Nesses dois filmes a paisagem natural é testemunha da passagem do tempo, da vida e da morte dos homens que viverem sob sua sombra, do risco de seu desaparecimento. Partindo da figura da árvore, tida por muitas culturas como guardiã do tempo e testemunha de sua passagem, pretendo aqui investigar a relação entre tempo e paisagem no cinema contemporâneo, mais precisamente nos dois filmes citados. Este trabalho busca inspiração no percurso feito por Didi-Huberman (2011), descrito em seu texto Cascas, no qual conta de sua visita ao campo Auschwitz-Birkenau e compartilha seu olhar arqueológico e dolorido diante das frondosas bétulas, árvores que testemunharam os horrores vividos pelos judeus torturados e mortos ali durante o holocausto. É também sob a contribuição de Didi-Huberman (2010) que se pretende fazer uma análise comparativa entre esses dois filmes, investigando de que forma o cinema dá a ver o vazio, o invisível e a ausência, chaves importantes para a compreensão do que chamo de estética dos rastros no cinema contemporâneo.

    A partir do conceito benjaminiano de rastro e vestígio, penso sobre a figura da ausência e do desaparecimento, que operam como uma espécie de força invisível que está presente na duração dos planos, nos movimentos da câmera, nos ângulos, nos diálogos, na forma como os personagens se movimentam pela paisagem fílmica, como se fugissem de algo que está a espreita ou como se buscassem por um mundo do qual possam fazer parte. Para Nicholas Zufferey(2007), o desaparecimento precisa ser entendido não como uma aniquilação, um fim absoluto, mas como aquilo que é impedido de aparecer, numa espécie de alternância entre visível e invisível, entre presença e ausência. O que está afinal em vias de desaparecimento?

    Uma figura central do pensamento de Walter Benjamin (2006) é o homem burguês europeu e a crise que se apresentava no horizonte do pensamento moderno na passagem do século XIX para o XX. Minha intenção aqui será pensar o conceito benjaminiano de rastro como possibilidade de investigação da crise do homem na contemporaneidade, diante da falência das promessas modernas de futuro. Nos dois filmes, os personagens caminham perdidos pelas paisagens naturais, por vezes desoladoras, não como o flanêur de Benjamin (2006), perdido em devaneios enquanto caminha pelas passagens parisienses, mas como um sujeito asfixiado e que precisa se deslocar constantemente para que não seja aniquilado.

    Se o outrora encontra o passado como um lampejo (BENJAMIN, 1985), penso, a partir das cascas e rastros presentes nesses dois filmes, de que forma também o presente lança possibilidades de construção do futuro. Nesse sentido, busco em Déborah Danowski e Eduardo Viveiros de Castro (2014) formas de pensar esse cinema no qual a desaparição e medo do fim são forças que operariam sobre a produção de pensamento e também sobre a forma fílmica.

Bibliografia

    BENJAMIN, Walter. Obras Escolhidas I: Magia, técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Editora Brasiliense, 1985.
    ________________. Passagens. Editora UFMG, 2006.
    DANOWSKI, Déborah; VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Há mundo por vir? Ensaio sobre os medos e os fins. Desterro. Florianópolis: Cultura e Barbárie e Instituto Socioambiental. 2015.
    DIDI-HUBERMAN, Georges. Cascas. São Paulo: Editora 34, 2017.
    ________________________. Diante da imagem. Rio de Janeiro: Editora 34, 2013.
    ________________________. O que vemos, o que nos olha. Ed. 34, 2010.
    MARKS, Laura U. The Skin of the Film: Intercultural Cinema, Embodiment, and the Senses. Durham: Duke University Press, 2000.
    MICHAUD, Philippe-Alain. Filme: por uma teoria expandida do cinema. Rio de Janeiro: Contraponto 2014.
    ZUFFEREY, Nicholas. Aspects philosophiques de la disparition. In.: Intermédialités, n. 10. Montréal: Centre de recherche sur l’intermédialité, 2007