Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Carolina Alves Pacheco (UFSC)

Minicurrículo

    Graduada em Cinema pela Universidade Federal de Santa Catarina (2020), é mestranda no Programa de Pós-Graduação de Literatura pela mesma instituição na linha Crítica Feminista e Estudos de Gênero. Participa do grupo de estudos Queererrâncias sob a coordenação de Alessandra Brandão.

Ficha do Trabalho

Título

    O lar queer em News From Home e No Home Movie de Chantal Akerman

Seminário

    Cinemas mundiais entre mulheres: feminismos contemporâneos em perspectiva

Formato

    Presencial

Resumo

    O que podemos chamar de lar no cinema de Chantal Akerman? Para isso, a pesquisa busca queerizar a noção de lar e maternidade nos filmes News From Home (1977) e No Home Movie (2015) da diretora. A hipótese de análise se baseia no atravessamento da figura da mãe como um possível lar perscrutado em ambas as obras. Para isso, a fundamentação teórica se direciona por dois eixos: o espaço da casa em que se encontra o pessoal e o político; e o relacionamento com a mãe atribuído no discurso dos filmes.

Resumo expandido

    É possível afirmar que a mãe de Chantal é a força motriz que atravessa toda sua filmografia. Não por acaso, em 1977, Chantal realizou o documentário News From Home, na cidade de Nova York. Nesse trabalho, ela evidencia o relacionamento com sua mãe, através da ventríloqua monocórdica das cartas que Natalia enviava da Bélgica. Em planos abertos e rígidos que nos remetem aos tableaux vivants, é possível examinar este filme com as fortes influências do cinema estruturalista estadunidense que emergiram no período. Em contramão ao que o título sugere, Chantal não busca o interior, a proximidade, intimidade da casa ou das cartas, mas nos entrega imagens que se exteriorizam, se perdem nos transeuntes e partem para a metrópole impenetrável. É encarando o coletivo, o público e a cidade que emoldura a sua casa. Com a mãe trazendo palavras de afeto e Chantal procurando se apagar em anonimato, este relacionamento de mãe-filha é composto por uma evidente distância.
    Quase 40 anos depois, diálogos e despedida são feitos. Chantal realizou No Home Movie (2015), filmado, principalmente, na casa de sua mãe em Bruxelas. Neste filme, novamente, assistimos os deslocamentos de afetos entre mãe e filha que dividem o cotidiano e as passagens do tempo. Diferentemente de News From Home, em que o relacionamento de mãe-filha é marcado pela distância escancarada, a diretora parece buscar apaziguar este vazio em No Home Movie. Todavia, se em determinado momento Chantal pergunta sobre o passado e as memórias da guerra, o que recebe como resposta é o silêncio. Um filme sobre o luto, revelando o seu caráter contemporâneo pelos aparatos tecnológicos (como as conversas de Chantal com a mãe realizadas por skype e pelas filmagens em câmeras portáteis digitais) e que culmina no último trabalho para as duas: Natalia faleceu dois meses antes do lançamento do filme e Chantal suicidou no mesmo ano. Para responder à questão colocada no início desta pesquisa, proponho um estudo no recorte de sua filmografia em torno das obras News From Home (1977) e No Home Movie (2015), por serem dois filmes privilegiados e declarados para as atribuições do lar em sua obra e por habitarem um território em comum, o das escritas de si . O privilégio mencionado também se refere às possibilidades de cotejo entre os filmes. Seja pelo olhar temporal e histórico, bem como as alterações de estratégias documentais e discursivas que se estabelecem entre eles.
    O espaço do lar (associado ao doméstico, íntimo, da família) é utilizado, comumente, como sinônimo do espaço da casa. No entanto, considero pertinente a separação entre os termos para um melhor delineamento. Em seu artigo “Casa e lar: a essência da arquitetura” (2002), João Miguel apresenta a configuração da casa como o invólucro delimitador do público e privado. Um lugar de descanso, prazer e defesa – como uma fortaleza e castelo – que adquire caráter simbólico contra as agressões externas. Ao passo que o lar, portanto, é a pele coletiva da casa, capaz de organizar as relações, memórias e afetos entre os moradores.
    Nesse sentido, a presente pesquisa aposta em “queerizar” a noção do lar e, assim, da relação materna nos dois filmes de Chantal Akerman. A proposta desta pesquisa, portanto, parte da hipótese que o lar de Chantal Akerman está localizado (e, portanto, deslocado de si) na figura da mãe. O pressuposto se debruça e será articulado por um tripé operador-analítico: operador: a dimensão epistolar/voz in loco; a composição de quadro e a mise-en-scène. Na esteira do desenvolvimento dos estudos de gênero e procurando contribuir com as demandas de um cinema que desloque os papéis estereotipados e essencialistas da maternidade, a proposta de análise se associa com embasamento teórico-analítico de perspectiva feminista.

Bibliografia

    ANZALDUA, Gloria. Queer (izar) a escritora – Loca, escritora y chicana. BRANDÃO, I.; CAVALCANTI, I.; LIMA COSTA, C. da, p. 1970-2010, 2017.
    AZEVEDO, Adriana Pinto Fernandes. Reconstruções queers – por uma utopia do lar. Tese (Doutorado em Letras) Programa de Pós-Graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.
    ISHAGHPOUR, Youssef. O Fluxo e o Quadro. Devires: Cinema e Humanidades, v. 7, n. 1, p. 24-35, 2010.
    LEBOW, Alisa. Identidade em deslize: o registro autobiográfico na obra de Chantal Akerman. Trad. Roberta Veiga e Carla Italiano. Devires: Cinema e Humanidades, v. 14, n. 2, p. 18-29, 2017.
    MARGULIES, I. Nada acontece: o cotidiano hiper-realista de Chantal Akerman. Trad. Roberta Veiga e Marco Aurélio Sousa Alves. São Paulo: Edusp, 2016.
    MIGUEL, João Marão Carnielo. Casa e lar: a essência da arquitetura. Jornal Vitruvius. Arquitextos. Ano 03, out. 2002. Disponível em . Acessado em 25 de setembro de 2021