Ficha do Proponente
Proponente
- Mili Bursztyn de Oliveira Santos (UFF)
Minicurrículo
- Realizadora audiovisual. Possui graduação em Comunicação Social – Radialismo (2010) e mestrado (2017) em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atualmente é doutoranda no Programa de Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense.
Ficha do Trabalho
Título
- Imagens da redemocratização: aproximações entre filmes do ano 1984
Mesa
- O cinema como dispositivo de produção de memória
Formato
- Presencial
Resumo
- Investigaremos a produção de memória sobre a ditadura militar e a redemocratização brasileira a partir das imagens do cinema nacional que circularam no contexto histórico do ano de 1984. Para isso, será realizada a análise comparativa dos filmes “Evangelho segundo Teotônio” (1984), de Vladimir Carvalho, e “Verdes Anos” (1984), de Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil. Examinaremos como os filmes aportam ou interrogam a concepção de um pacto nacional e os projetos de futuro que permeiam as obras.
Resumo expandido
- Nos voltamos para as imagens do cinema de 1984 para pensar processos de elaboração da memória sobre a ditadura e redemocratização no Brasil. Para isso, propomos a aproximação entre dois filmes nacionais lançados no ano em questão, o documentário “O Evangelho segundo Teotônio” e a ficção “Verdes Anos”. À medida que o cinema, no calor dos acontecimentos, serve como artefato de elaboração de memórias, os filmes se apresentam como modos de pensar e responder aos problemas da época. Na análise das obras elencamos ideias chaves relativas ao momento da redemocratização, como pacto social e projeção de futuro, que operam como cortes de aproximação possíveis entre as obras.
Tomamos o ano de 1984 como epicentro de reverberação dos temas e imagens mobilizados pela ideia de redemocratização, em torno do qual os filmes se organizam. No imaginário nacional, o ano de 1984 está associado à imagem de esperança e alegria. A ditadura está em crise e os comícios das Diretas Já, movimento em defesa do restabelecimento de eleições diretas para presidente, ganham as ruas. Os comícios realizados nos primeiros meses de 1984 mobilizam milhões de pessoas. Mas, apesar da forte pressão popular, a emenda constitucional propondo o retorno de eleições diretas para presidente, apresentada pelo deputado federal Dante de Oliveira, foi derrubada no Congresso Nacional em abril do mesmo ano. O sonho das eleições diretas é frustrado e adiado para 1989. Nas últimas eleições indiretas, Tancredo Neves, um civil, é escolhido presidente do Brasil, quebrando um longo ciclo de presidentes militares. Porém, diante de seu falecimento inesperado, seu vice, José Sarney, é quem toma posse.
1984 é um momento limiar, de transição da ditadura para a democracia, de emergência e elaboração de memórias traumáticas e fabulação de futuros. Os filmes apontam para um modelo social em crise e as respostas dos autores a esta crise revelam formas de continuidade e rupturas com o passado. Neste sentido, nos parece importante retomar a construção da figura mitológica de Teotônio Vilela em “O Evangelho segundo Teotônio”. Vilela foi um político alagoano, eleito deputado estadual pela UDN em 1954, posteriormente, representante da bancada do açúcar no senado. Após o golpe de 1964 e a extinção dos partidos políticos em 1965, ingressa na Arena, partido de apoio à ditadura que deixou em 1979, para ingressar no MDB, partido de oposição ao regime, em que terá uma atuação destacada na articulação da Lei da Anistia. Morre em 1983, mas não sem antes afirmar, no filme de Carvalho, sua convicção de que só a luta armada poderá libertar a América do Sul de seus tiranos.
“Verdes Anos” é uma livre adaptação do conto de Luiz Fernando Emediato, com direção de Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil. Ambientada no início dos anos 1970, a trama se passa durante o milagre econômico, período em que o país viveu um forte crescimento e geração de empregos, mas que, paradoxalmente, representou o achatamento dos salários, o aumento da corrupção e da concentração de renda, levado a um aprofundamento das desigualdades sociais. No plano político, o período ficou marcado pelo recrudescimento da repressão e violência do regime militar. Tendo este cenário político como pano de fundo, o filme narra as questões existenciais de um grupo de jovens em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul. O protagonista é Nando, jovem que experimenta as descobertas típicas desta fase e vive em contradição com o pai, Leopoldo, personagem que está sempre acusando nos modos de vida das pessoas no seu entorno, a conivência com o autoritarismo, a violência e a decadência moral da ditadura.
Propomos pensar a relação entre os filmes enquanto uma constelação de imagens que se atraem tanto pelas semelhanças quanto pelas diferenças. Para isso, nos valemos da contribuição de autores que, a partir da leitura de Benjamin (1985), valorizam a dimensão temporal, heterogênea e anacrônica (DIDI-HUBERMAN, 2015) das relações entre história, memória e imagens.
Bibliografia
- BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura – obras escolhidas, volume I. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1985.
DIDI-HUBERMAN, Georges. Diante do tempo: História da arte e anacronismos da imagem. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2015.
HUYSSEN, Andreas. Culturas do passado-presente: modernismo, artes visuais, políticas da memória. Rio de Janeiro: Contraponto, 2014.
NAPOLITANO, Marcos. “Recordar é vencer: as dinâmicas e vicissitudes da construção da memória sobre o regime militar brasileiro”. In: Antíteses v. 8, n. 15esp., p. 09-44, nov. 2015.
TELES, Edson; SAFATLE, Vladimir Safatle (Orgs.). O que resta da ditadura: a exceção brasileira. São Paulo: Boitempo, 2010.
XAVIER, Ismail. “Do golpe militar à abertura: a resposta do cinema de autor”. In: XAVIER, Ismail. O cinema brasileiro moderno. São Paulo: Paz e Terra, 2001.