Ficha do Proponente
Proponente
- João Vitor Resende Leal (Unicamp)
Minicurrículo
- Doutor em Meios e Processos Audiovisuais (ECA-USP), atualmente em estágio pós-doutoral com bolsa FAPESP (nº 2019/25162-0) no Programa de Pós-Graduação em Multimeios (IA- Unicamp). Graduado em Comunicação Social pela UFMG, com Master-1 em Ciências da Comunicação pela Université de Grenoble-3 e Master-2 em Estudos Cinematográficos pela Université de Paris-3.
Ficha do Trabalho
Título
- Deslizamentos do corpo-imagem e o trabalho do espectador
Seminário
- Estética e plasticidade da direção de fotografia
Formato
- Presencial
Resumo
- A partir da aproximação de Untitled Film Stills (Cindy Sherman, 1977-1980) e Screen Tests (Andy Warhol, 1964-1966) – duas séries que, pela tensão entre fotografia e cinema, insinuam a existência de filmes que não existem –, este trabalho pretende discutir as relações entre corpo, imagem e espectador. Examinaremos como cada série modula a imagem do corpo, elaborando um corpo-imagem que oscila entre os extremos de um “efeito de personagem” e um “efeito de presença”.
Resumo expandido
- A partir da aproximação de duas séries de imagens – os Untitled Film Stills de Cindy Sherman (1977-1980) e os Screen Tests de Andy Warhol (1964-1966) –, esta apresentação propõe uma reflexão acerca das relações entre corpo, imagem e espectatorialidade. Buscaremos inicialmente sustentar essa aproximação das séries a partir da constatação de uma oscilação dos corpos-imagem por entre os meios da fotografia e do cinema. No caso de Sherman, veremos que as figuras femininas (encarnadas pela própria artista) parecem emergir de narrativas ficcionais que, todavia, não se desenrolam de fato: ao contrário do que o título da obra sugere, os film stills não são fotogramas arrancados do fluxo de filmes pré-existentes nem imagens de bastidores de um filme em produção, mas fotografias que recorrem a convenções cinematográficas para evocar situações dramáticas. Já a série de Warhol subverte a prática habitual do screen test: ao invés de servir ao casting de um filme ficcional, os planos em close-up de longa duração se colocam como obras documentais autônomas que dilatam o instante pregnante da fotografia: as performances flagradas pela câmera não aspiram à constituição de personagens em futuras obras ficcionais, mas à ostentação da inalienável singularidade dos sujeitos colocados à sua frente. Nessa articulação entre cinema (duração, movimento, ficção) e fotografia (retrato, fixação de um instante), as duas séries também insinuam, portanto, a existência de filmes que não existem: os filmes supostamente já feitos (Sherman) e aqueles ainda por fazer (Warhol) existem apenas como possibilidade que demanda o trabalho de imaginação empreendido pelo espectador.
Tal trabalho do espectador, no entanto, não é solicitado da mesma maneira em cada uma das séries, na medida em que, em cada uma delas, a modulação da imagem do corpo se dá de modo distinto. Enquanto Cindy Sherman não hesita em explorar as possibilidades expressivas dadas pelo enquadramento e a composição da imagem, a escolha de locações e, sobretudo, a composição visual de sua própria figura (figurino, maquiagem, postura corporal etc.), o trabalho de Andy Warhol reflete, ao contrário, um desejo minimalista de esvaziar a imagem de todo artifício: seus filmes-retrato são feitos em estúdio com fundo neutro, sem roteiro nem instruções precisas aos sujeitos filmados. Assim, a nosso ver, enquanto os Untitled Film Stills evidenciam o controle de Sherman para fazer com que os corpos-imagem produzam um “efeito de personagem”, nos Screen Tests de Warhol as funções mínimas do diretor (acionar a câmera) e do sujeito filmado (permanecer no mesmo lugar por toda a duração do filme) intensificam, antes, um “efeito de presença”.
Por meio dessa aproximação entre as obras, portanto, nosso objetivo é analisar o corpo-imagem e alguns de seus efeitos possíveis, enfatizando em particular seus deslizamentos entre presença e representação. Para tanto, no plano teórico, recorreremos pontualmente aos conceitos de “performance” (Zumthor, 2007), “plasticidade” (Malabou, 2000), “presença” (Landowski, 2004) e “personagem” (Pavis, 1997), examinando os fluxos migratórios da imagem por outros meios e outros corpos (Belting, 2014; Coccia, 2010), bem como pelos meandros da memória e da imaginação do espectador (Lefebvre, 1999).
Bibliografia
- BELTING, H. Antropologia da imagem. Lisboa: KKYM, 2014.
COCCIA, E. A vida sensível. Florianópolis: Cultura e Barbárie, 2010.
DIKA, V. The (moving) pictures generation: The cinematic impulse in downtown New York art and film. Nova York: Palgrave Macmillan, 2012.
LANDOWSKI, E. “Modos de presença do visível” in OLIVEIRA, A. C. (org.). Semiótica plástica. São Paulo: Hacker, 2004, pp. 97-112.
LEFEBVRE, M. “On memory and imagination in the cinema”. New Literary History, v. 30, n. 2, 1999, p. 479-498.
MALABOU, C. Plasticité. Paris: Léo Scheer, 2000.
MIRANDA, J. B. Corpo e imagem. São Paulo: Annablume, 2011.
OLIVEIRA JR., L. C. “Retratos em movimento”. Ars, n. 31, 2017, p. 183-208.
PAVIS, Patrice. “Le personnage romanesque, théâtral, filmique”. Iris, nº 24, 1997, p. 171-183.
RIBEIRO, M. “A imagem como experiência em Untitled film stills”. Passagens, v. 8, n. 2, 2017, p. 27-50.
ZUMTHOR, P. Performance, recepção, leitura. São Paulo: Cosac Naify, 2007.