Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Camila Dutervil (UnB)

Minicurrículo

    Camila Dutervil é documentarista, antropóloga e professora de cinema na Universidade de Brasília. Estudou na Escuela Internacional de Cine y TV em Cuba, se especializou em montagem no Ateliers Varan, em Paris, onde também concluiu o Mestrado em Cinema pela Université Paris VIII. A pesquisadora é doutora em cinema pela Università Roma Tre, onde defendeu uma tese sobre as fronteiras entre o Cine-Transe e o cinema de poesia. Atualmente Camila se prepara para filmar seu primeiro longa-metragem.

Ficha do Trabalho

Título

    Divino Tempo Transfigurado: Os gestos filmados por Maya Deren

Formato

    Remoto

Resumo

    Essa comunicação propõe uma aproximação entre a obra de Maya Deren, fundadora da ciné-dança, e a última criação da artista da dança e da imagem Ana Pi, denominada The Divine Cypher, em referência à The Divine Horsemen, filme documentário póstumo de Maya. O cinema e a dança compartilham uma relação ontológica com o movimento e nessa pesquisa a dança emerge como interrogação ao cinema: Qual é o papel do audiovisual na transmissão dos gestos ordinários e das danças sagradas, na projeção de futuros?

Resumo expandido

    A presente pesquisa propõe uma aproximação entre a obra de Maya Deren, fundadora da ciné-dança -arte do movimento da camera-, e a última criação da artista da dança e da imagem Ana Pi, denominada The Divine Cypher, em referência à The Divine Horsemen: The Living Gods of Haiti, o filme documentário póstumo de Maya Deren.
    Maya Deren iniciou sua carreira no cinema experimental e na dança, seu interesse principal, enquanto coreógrafa, eram as danças de possessão. Colaborou com Katherine Dunham, coreógrafa afro-americana, que alimentou seu persistente interesse pelo ritual e pelos estados alterados de consciência, em especial o voodoo haitiano. Encorajada pelo antropólogo Gregory Bateson, o qual conhece na New School for Social Research, durante o seminário A Função da Dança nas Sociedades Humanas, em que se discutia um método científico para filmar rituais de possessão, Maya Deren programa partir para o Haiti. Entre 1947 e 1951, a artista filma no Haiti material que foi finalizado postumamente por seu último marido Teji Ito, resultando no filme Divine Horsemen. O material bruto captado por Maya consegue representar de dentro, o mundo interior dos participantes dos ritos de possessão.
    O cinema e a dança compartilham uma relação ontológica com o movimento e nessa pesquisa a dança emerge como uma interrogação ao cinema: Qual é o papel das formas audiovisuais experimentais, ensaísticas, dos processos criativos na transmissão dessas práticas e na projeção de futuros?
    Ana Pi e Maya Deren compartilham um mesmo percurso criativo transversal, de uma curiosidade absoluta e do processo artístico associado à uma metodologia de pesquisa. Maya Deren, à partir dos anos 1940, estuda de maneira empírica a cultura haitiana, suas danças e o patrimônio vodoo, experiência relatada no livro The Divine Horsemen: The Living Gods of Haiti e o filme documentário póstumo de mesmo título.
    A artista mineira Ana Pi ganhou visibilidade com o seu curta-metragem Noir Blue (2018) filmado no continente africano. Sua prática está situada entre noções de trânsito, deslocamento, pertencimento, memória e gestos ordinários. The Divine Cypher, a última criação de Pi é uma obra realizada no cruzamento da imagem e do corpo, da artes visuais e das artes da presença, segundo a artista “uma dança dedicada à beleza revolucionária do povo haitiano do passado do presente e do futuro”. Contemplada com uma bolsa do Museum of Modern Art de New York City ( MoMA), sete décadas depois da pesquisa filmada por Deren, Ana registra a forma pela qual essas danças sagradas foram preservadas e como elas podem encontrar ressonância na atualidade. The Divine Cypher circula entre a imagem e a dança, uma viagem no tempo que se inspira nos gestos filmados e nos sonhos de Maya Deren. Ana Pi se questiona: Os gestos ordinários e as danças sagradas filmadas por Maya Deren sobreviveram?
    Filmando rituais de possessão no Haiti, Deren acabou por se colocar o desafio da recriação de imagens do invisível e a tensão que isso implica se expressa em uma linguagem cinematográfica específica: “O artista è um mago que, através da percepção dos poderes e princípios escondidos do invisível os torna aparentes no nível do visível” (DEREN apud SUDRE, 1996: p. 366 ).
    Ana Pi integra essa dimensão imagética onírica da ancestralidade em sua obra, e como artista negra desde seu lugar de fala, empreende ainda uma investigação política sobe o Haiti contemporâneo. A nossa curiosidade aponta para a intercessão entre as poéticas das duas artistas transfiguradas no tempo e seu potencial de imaginar futuros.

Bibliografia

    DEREN, Maya. Amateur versus Professional: Maya Deren Notes, Essays Letters- In Film Culture, no 39 , Winter: New York, 1965.

    __Il cineridodistti e il montaggio creativo ‘’ Cinema” n. 30 novembre, 1952.

    __Divine Horseman. [1959]. Mondadori Editore. Milano. (tr.it.) I cavallieri divini del vudù, EST, Milano 1997
    MINH-HA, Trinh T. & NANCHY N. Chen. “Speaking Nearby”. In: KAPLAN, E. Ann (Ed.). Feminism & Film. Nova York: Oxford University Press, 2000.
    NICHOLS, Bill (org.), Maya Deren and the American Avant-Garde (Berkeley / Los Angeles: University of California press, 2001
    SUDRE, Alain-Alcide. Dialogues Théoriques avec Maya Deren Du cinéma-experimental au cinéma-ethnographique. L’Harmattan. Paris, 1996

    TRIVELLI, Anita. Sulle trace di Maya Deren: Il cinema come progetto di avventura. Lindao, Torino, 2003.
    VIEIRA, João Luiz. O visionário cinema de fluxo de Maya Deren : dança em foco- ensaios contemporâneos de videodança. Rio de Janeiro, 2012.