Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Gabriela Kvacek Betella (UNESP)

Minicurrículo

    Professora assistente na FCL-UNESP-Assis, área de Língua e Literatura italiana. Mestre e doutora em Teoria Literária e Literatura Comparada (USP), com pós-doc no IEB-USP. Atuação voltada para os estudos das relações entre Literatura, História e Audiovisual, no âmbito da coordenação da área de italiano no Departamento de Letras Modernas e no programa de pós-graduação de sua unidade, na linha de pesquisa Literatura Comparada e Estudos Culturais.

Ficha do Trabalho

Título

    Nanni Moretti no Instagram: ponto de vista da intimidade mascarada

Formato

    Presencial

Resumo

    Autobiografia dell’uomo mascherato (2017), publicado no Instagram em 2020, mantém relações com a filmografia autobiográfica de Moretti, ao mesmo tempo em que lança mão de propósitos reelaborados em documentários e curtas da filmografia, assim como reafirma modos de manipulação do ponto de vista. Situamos o curta na obra do diretor romano e no cenário de produções experimentais que pedem formas de representação capazes de redefinir as próprias crises e de apontar soluções criativas.

Resumo expandido

    O diretor italiano Nanni Moretti não é adepto dos dispositivos móveis, nem das redes sociais, muito menos dos streamings que, nos últimos anos, têm multiplicado as possibilidades do audiovisual, tanto no aspecto da criação quanto na divulgação das mais diversas produções. Seu longa mais recente, Tre Piani (2021), esperou meses até a 74ª. edição do Festival de Cannes para sua estreia. Apesar da declarada posição contrária aos novos formatos, o diretor tem seu nome na conta do Instagram em que podemos encontrar várias postagens de sua produtora, a Sacher Film, contando com quase 100 mil seguidores. Entre fevereiro e março de 2020, o perfil @nannimoretti_ (que de março de 2018 até junho de 2019 era @sachercinema) publica um curta em seis episódios, Autobiografia dell’uomo mascherato, realizado em 2017. O filme traz o próprio Moretti em algumas situações do seu cotidiano, passeando por uma cidade quase vazia, abrindo caixas de sua mudança, exibindo inúmeros cadernos de anotações, assistindo a um ensaio de espetáculo sentado na plateia vazia do auditório aberto do Parco della Musica, participando de um debate no Cinema Nuovo Sacher e, finalmente, passando por uma sessão de radioterapia. Em todas as situações, ele veste a máscara estranha que, na sequência das imagens de abertura da primeira postagem, com o cenário de Roma vazio em avenidas e calçadas, fez muitos dos seguidores especularem sobre uma profecia dos dias que se seguiriam em lockdown pela pandemia de Covid-19, embora o filme tenha sido realizado mais de três anos antes e se refira a outra doença, o linfoma de Hodgkin, cuja recidiva ocorre em 2017, após ter sido vencido pelo diretor nos anos de 1990.
    Naquela ocasião, o último episódio de Caro diário (Nanni Moretti, 1993) revisou a saga da descoberta e cura do linfoma com a ironia que costura os episódios do longa. Interpretado por Moretti, o protagonista apartado da realidade, a deambular sozinho quase ao modo do Palomar de Italo Calvino, instaurava suas críticas contundentes aos problemas urbanos, sociais, culturais e pessoais, num exercício reflexivo que não subtraía a autoestima e a reafirmação de certezas. No limite, é possível pensar no enfrentamento dos problemas de geração e no investimento nas questões de ponto de vista como elementos estratégicos da poética de Moretti, pontos de força que vão se alternando em filmes mais recentes, sem o peso autobiográfico, porém com a intensidade da melancolia das tramas. De certo modo, o curta realizado em 2017 e postado no Instagram em 2020 mantém relações com a filmografia autobiográfica de Moretti, ao mesmo tempo em que lança mão de propósitos reelaborados em poucos documentários e curtas da filmografia, assim como reafirma modos de manipulação do ponto de vista capazes de misturar as definições de autobiografia, autoficção e filme-ensaio. Nossa proposta é situar o curta na obra do diretor romano e no cenário de produções experimentais que pedem formas de representação capazes de absorver e oferecer novos sentidos às próprias crises (das cidades, das sociedades, da cultura e do “eu”) e de apontar soluções criativas.

Bibliografia

    BETELLA, G. K. Memória experimental ou diário de poucas palavras de Nanni Moretti. Texto digital. v. 16, n. 2, p. 223-239, ago-dez 2020.
    BETELLA, G. K. O sujeito ético no cinema de Nanni Moretti. Devires, v. 14, n. 2, p.124-145, jul-dez 2017.
    MARCUS, M. Caro Diario and the Cinematic Body of Nanni Moretti. Italica, v. 73, n. 2, p. 233–247, 1996.
    GUSDORF, G. Conditions and Limits of Autobiography. In: OLNEY, J. Autobiography: Essays Theoretical and Critical. Princeton, Princeton University Press, 1980.
    MORETTI, N. Autobiografia dell’uomo mascherato. Un cortometraggio in 6 parti. La città. Instagram. 23 fev 2020. https://www.instagram.com/p/B86GORZorKa/?utm_source=ig_web_copy_link; Il trasloco. Instagram. 01 mar 2020; Le prove. Instagram. 15 mar 2020; Il dibattito. Instagram. 15 mar 2020; Il ballo. Instagram. 22 mar 2020; Il finale. Instagram. 29 mar 2020.
    MORETTI, N. La sconfitta. In: APRÀ, A. et. al. Dimensione Super8. Quaderno del Filmstudio, Stampa Centro Grafico GPR, 1975, p. 95.