Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    Angela Nelly dos Santos Gomes (UFPA)

Minicurrículo

    Docente do bacharelado em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Pará-UFPA. Doutoranda no PPGCOM/UFPA – Comunicação, Cultura e Amazônia. Mestre em Comunicação pela UMESP-SP. Roteirista, documentarista, produtora, jornalista.

Ficha do Trabalho

Título

    Reflexões sobre resistência no cinema indígena Mebêngôkre-Kayapó

Seminário

    Cinemas pós-coloniais e periféricos

Formato

    Presencial

Resumo

    Neste trabalho propõe-se uma reflexão teórico-conceitual sobre resistência tendo como objeto empírico o cinema indígena Mebêngôkre Kayapó, do Pará. Para isso analiso trechos de filmes do coletivo Beture de cineastas indígenas Mebêngôkre Kayapó. Busco situar os sentidos do conceito de resistência em diálogo com a perspectiva decolonial e os estudos de cinema.

Resumo expandido

    Esta comunicação propõe uma reflexão teórico-conceitual sobre resistência no cinema indígena Mebêngôkre Kayapó (Pará). Busco situar diversos sentidos de resistência numa perspectiva interdisciplinar em diálogo com a perspectiva decolonial e os estudos de cinema, para identificar gestos ou sentidos de resistência em filmes produzidos pelo coletivo Beture Mebêngôkre Kayapó.
    A produção audiovisual indígena na Amazônia é atravessada pelo contexto sócio-histórico, político e cultural, e emerge como importante instrumento aliado às lutas de resistência. Não por acaso, luta, arma e resistência são palavras frequentemente associadas quando se fala em cinema indígena. Assim buscamos compreender e refletir sobre os elementos ou aspectos que podem ser entendidos como gestos de resistência nos filmes Mebêngôkre Kayapó, que se aliam à luta política contra as diversas formas de opressão.

    Para traçar um horizonte de interpretação sobre o tema é necessário dialogar com vários autores. Da comunicação, à antropologia e sociologia, da filosofia à arte, todos esses campos oferecem importantes e distintos aspectos para a reflexão.

    A perspectiva da comunicação decolonial oferece uma interessante chave de interpretação para essa questão, a partir da visada da realocação da enunciação para o ponto de vista do “sub/alterno”, segundo Torrico Villanueva (2018, p. 79), como uma “perspectiva insurgente que irrompe no espaço do pensamento desde outro lugar de enunciação”.
    Com a filosofia da arte, Didi-Huberman, que tem na resistência um tema crucial ao analisar as imagens do holocausto, diz que a sublevação pode se manifestar de distintas maneiras pois “não devemos ver nas imagens apenas o que elas representam. As imagens não são apenas coisas para representar; elas mesmas são coisas que estão no extremo de nossos corpos. […] Uma imagem é um gesto”, acrescentando que o ato de produzir a imagem pode ser em si um gesto de sublevação, de resistência (2017, s.p.).

    Nos estudos fílmicos a ideia da resistência é associada a um certo tipo de “filme-denúncia” ou “ativista”, por serem imagens ou filmes que trazem na sua fundação “o desejo explícito de intervenção e transformação social”, conforme Cesar (2017, p.12). Nesse contexto essa noção de resistência é bastante reivindicada pelos próprios cineastas indígenas, visto que não raro suas produções são “gestadas em contextos de disputas políticas e sociais” (ibdem).

    No caso dos Kayapó, por exemplo, essa conotação foi amplamente manifestada já nos primeiros anos de contato com esse meio, em mais um capítulo da luta pela defesa de seu território ancestral, no final da década de 1980 contra o projeto Kararaô, atual Belo Monte.

    Se essa vertente da “denúncia” como registro é forte no cinema Kayapó, o é também o registro como “memória”. É o que Dias (2011, p. 158) nomeou como o ato de “guardar por imagens” a capacidade, para os indígenas, da imagem em reconstituir um momento ou conhecimento especifico. O que deve ser entendido como uma atividade primordial “que concentra e apresenta de forma privilegiada (mas também simplificada) diferentes usos das imagens”; esse entendimento traz em si mais do que mera adequação de meios a fins, pois “os discursos nativos são verdadeiros discursos de patrimônio. De toda forma, essa “documentação cultural” é uma maneira que os povos indígenas encontraram de lutar contra a invisibilidade olhando para as gerações futuras. Didi-Huberman trata da potência da imagem contra a invisibilidade também como uma forma de reexistência a partir da ideia de “sobrevivência das imagens”. (DIDI-HUBERMAN, 2017; 2021). Para ele a imagem nesse sentido é testemunho e também esperança ao projetar-se para o futuro, como memória.

    É com essa perspectiva que analiso os filmes do coletivo Beture, que tem como tema as lutas por direitos e preservação de seus territórios, assim como o registro de seu modo de vida e saberes ancestrais como salvaguarda da memória de seu povo.

Bibliografia

    AS IMAGENS não são apenas coisas para representar. Entrev. com Georges Didi-Huberman. 20 jun. 2017c. Disponível em: www.ihu.unisinos.br/186- noticias/noticias-2017/568830-as-imagens-nao-sao-apenas-coisas-pararepresentar-entrevista-com-georges-didi-huberman.

    CESAR, A. “Cinema como ato de engajamento: documentário, militância e contextos de urgência”. In: C-Legenda – Revista do Programa da Pós-graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade Federal Fluminense. Rio de Janeiro, V. 35, 2017, p. 11-23.

    DIAS, Diego Madi. Filmar e guardar: reflexões sobre “cultura ” a partir do caso Mebêngôkre-Kayapó (PA). Revista Eletrônica do Programa de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio- Unirio|MAST v. 4, p. 149–169, 2011.
    DIDI-HUBERMAN, Georges. Sair da escuridão Georges Didi-Huberman. Caderno de Leituras n.129. Chão da Feira, 2021.
    TORRICO VILLANUEVA, Erick. La comunicación decolonial, perspectiva in/surgente. Revista Latinoamericana de Ciencias de la Comunicación. São Paulo, v. 15, n. 28, 20