Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    India Mara Martins (UFF)

Minicurrículo

    Professora do Departamento de Cinema da Universidade Federal Fluminense – UFF e do Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual – PPGCINE. Doutora em Design pela PUC-Rio com a tese Documentário animado: experimentação, design e tecnologia. Atualmente pesquisa a representação do espaço e atmosfera fílmica no audiovisual contemporâneo. É coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Cinema e Audiovisual – PPGCINE e da Araci Incubadora de Cinema e Audiovisual da UFF.

Ficha do Trabalho

Título

    A opressão das mulheres representada em três filmes de animação

Mesa

    Animação, suas interfaces e processos

Formato

    Presencial

Resumo

    A proposta deste trabalho é evidenciar a potência da animação na representação de situações reais em filmes que abordam a vida de mulheres num contexto de fundamentalismo religioso. A partir de três filmes, que apresentam o cinema de animação em diferentes perspectivas, o documentário animado Onda Verde (2010 ), Teerã Tabu (2017) e A ganha-pão (2018) mostramos que o cinema de animação, por sua linguagem e plasticidade, se tornou uma forma de expressão privilegiada para tratar o irrepresentável.

Resumo expandido

    A animação se tornou uma estratégia para representar temas complexos e delicados, seja no documentário animado, abordando situações como o abuso infantil em Break the silence: kids against child abuse (1994) – CBS, de John Cannemaker, revelando os perigos ambientais em Atomnia (2002), de Estelle Breysse e outros, que alerta para os submarinos nucleares abandonados no mar Báltico pela antiga URSS, ou em filmes de animação, que partem da representação de uma realidade pré-existente sem o compromisso com as perspectivas documentarizantes.
    Nesta proposta discutimos a situação do feminino (enquanto gênero e performatividade) no contexto do fundamentalismo religioso em três filmes de animação: o documentário animado Onda Verde (2010 ), dirigido por Ali Samadi Ahadi, e os filmes de animação Teerã Tabu (2017), de Ali Soozandeh e A ganha pão (2018), de Nora Twomey .
    Em A Onda Verde, dirigido por Ali Samadi Ahadi em 2010, temos uso da animação para a representação audiovisual dos protestos que tomaram conta do Irã no período da eleição presidencial de 2009, que foram registrados por celulares, desenhos realizados por prisioneiros, encarcerados pela violenta resposta do governo iraniano, ao que ficou conhecido como Movimento Verde.
    No filme Teerã Tabu (2017) acompanhamos a história de duas mulheres e suas dificuldades intransponíveis numa sociedade desigual. Oriundas de contextos diferentes, uma é prostituta e a outra dona de casa, as duas têm em comum a ausência total de liberdade para realizar coisas simples como matricular o filho na escola ou ter acesso a uma conta bancária, situação que lhes foi imposta pelo regime islâmico do Irã. Teerã Tabu opta pelo live action convertido em traços animados que mantêm o realismo dos movimentos, apesar de se distanciar do que se convencionou chamar de representação do real, por causa da sua plasticidade.
    The Breadwinner (no original, 2018), chamado no Brasil de A ganha-pão, foi dirigido pela britânica Nora Twomey e coproduzido por cinco países, apresenta um retrato desolador da vida das mulheres no Afeganistão. A história se passa em 2001, quando o Talibã assume o poder no Afeganistão e tira das mulheres, entre outros, o direito de andar na rua sem um homem da família. Filha de uma escritora e de um professor, que não podem mais exercer a profissão, Parvana sabe ler e escrever – ao contrário da imensa maioria das meninas do país. É a partir do seu olhar que experienciamos todo tipo de situações absurdas sob qualquer ponto vista: da prisão abusiva do pai a impossibilidade das mulheres saírem de casa para buscar comida para a sua família. O que leva Parvana a se passar por menino para ajudar a mãe e a irmã, que não podem sair de casa sem a companhia do pai, que se encontra preso. O filme de animação foi indicado ao Oscar e ao Globo de Ouro em 2018 e chegou ao Brasil pela Netflix.
    Neste grupo de filmes, o filme Onda Verde é o único que se assume como documentário animado e apresenta as características que possibilitam esta associação na nossa perspectiva. “Entendemos o documentário animado como um filme de situações e fatos reais registrados através de diferentes dispositivos utilizados como base para posterior intervenção da animação, que muitas vezes é computacional. A animação deve ser uma opção de representação consciente em função do potencial visual que se adequa ao conteúdo apresentado pelo documentário. A animação deve estar amalgamada no conteúdo, e não ser apenas um complemento, uma solução estética (Martins, 2009). Contudo, os outros dois filmes convocam um olhar mais atento, por utilizarem a animação em toda sua potência plástica e poética, para tratar temas de difícil abordagem com delicadeza, mas de forma contundente. De certo modo, estes três filmes evidenciam as muitas possibilidades de representação da realidade a partir da animação, que aqui é pensada como arte e linguagem.

Bibliografia

    EVANS, Noell Wolfgram. J.R. Bray – Documentarian? In: The Animated Documentary, disponível em www.fpsmagazine.com, march 2005.
    Global Gender Gap Report, World Economic Forum, 2020. Disponível em https://reliefweb.int/report/world/global-gender-gap-report-2020
    Martins, India Mara. Documentário animado: experimentação, tecnologia e design, tese de doutorado, Departamento de Arte e Design, PUC-Rio, 2009.
    MELEIRO, Alessandra O novo cinema iraniano: arte e intervenção social. São Paulo: Escrituras Editora, 2006.
    ROBERTSON, Bárbara, “Psychorealism – Animator Chris Landreth Creates a New Form of Documentary Filmmaking” in Computer Graphics World, julho de 2004.
    WARD, Paul. Documentary: the margins of reality. Wallflower Paperback, Great Britain, 2005.
    WELLS, Paul. Understanding Animation, Routledge: Taylor e Francis Group, London, New York, 1998.
    —————–. Introduction to Film Studies (2a. edition), London, NY, Routledge, 1999