Trabalhos Aprovados 2022

Ficha do Proponente

Proponente

    felipe maciel xavier diniz (UNIRITTER)

Minicurrículo

    Doutor em Comunicação pela UFRGS e mestre pela mesma instituição. Professor da Faculdade de Comunicação Social da Uniritter, nos cursos de Produção Audiovisual, Publicidade e Jornalismo. Cineasta e sócio da Modus Produtora de Imagens. Diretor dos documentários Por Onde Passeiam tempos Mortos (2014), Desenredo (2016), e da ficção Sonata (2019), entre outros.

Ficha do Trabalho

Título

    Filmes em Primeira Pessoa: o que essas formas dizem sobre o cinema.

Seminário

    Teoria de Cineastas

Formato

    Presencial

Resumo

    Essa apresentação coloca em jogo o cinema autobiográfico traduzido a partir da produção de imagens pessoais captadas pelos próprios diretores. Conhecidos como diários íntimos ou filmes pessoais, tais dispositivos encontram abrigo nas dimensões ensaísticas do cinema. Nosso objetivo é compreender como tais modos de enunciação pensam o cinema, como essas formas de produzir imagens, a partir da experiência íntima compartilhada, podem configurar teorias sobre o cinema.

Resumo expandido

    O diretor Jonathan Cauette posiciona a câmera de modo que enquadre em primeiro plano seu rosto enquanto fala ao telefone. Do outro da linha está o médico de sua mãe relatando os efeitos de um tratamento psiquiátrico pesado. O cineasta Kiko Goifman está sozinho em um quarto de hotel no centro de BH. Ele relata para a câmera os planos para investigar o paradeiro de sua mãe biológica que nunca conheceu. A documentarista Beth Formaginne segura uma câmera apoiada na barriga. Ela está deitada em uma cama de leito semi-intensivo de um hospital onde se trata dos efeitos da Covid em seu corpo. A imagem que vemos é de um médico que se paramenta do outro lado do vidro. Essas cenas aconteceram respectivamente nos filmes Tarnation de 2003, 33 de 2002 e Ar de 2021. Nos três filmes os diretores são os próprios personagens que gravam suas histórias com a câmera em próprio punho.
    Esses três instantâneos se mostram a nós como portas de entrada a uma problemática que parece ser comum na produção cinematográfica mundial nas últimas décadas. É a partir dessas fulgurações que propomos construir aqui um percurso capaz de compreender qual o lugar dos impulsos (auto)biográficos dentro desse cenário – e, por outro lado, como esses filmes trabalham as formas de enunciação dessas subjetividades, propondo novas maneiras de visibilizar a vida e o íntimo. Partimos, portanto, de uma caracterização desse cinema que se destaca pela apresentação de um modo de mise-en-scène documental capaz de encontrar a dramatização de um cotidiano narrado e visualizado por câmeras subjetivas.
    Tal interesse, pelas suas formas de construção narrativa e imagética, se insere nos debates sobre a configuração contemporânea do espaço biográfico (ARFUCH, 2010), distendida pela ação midiática e atravessada por certa vertigem, que coloca os sujeitos por toda a parte. Se por um lado esse interesse em colocar a vida cotidiana em frente e ao centro, focando os esforços estéticos na escrita dos sujeitos e suas visões de si, tem lugar em parte da tradição cinematográfica, como se viu, é uma postura que também pode ser lida e integrada a um movimento mais amplo da cultura. Representações (auto)biográficas grassam por diversos campos, integrando formas artísticas para além do cinema, como na literatura, nas artes visuais e nas janelas narcisísticas da internet.
    A disseminação dos meios de comunicação e a acessibilidade às mais diferentes mídias parece ter papel importante nesse processo no contemporâneo, e narrativas como as propagadas pelo cinema são parte importante na constituição desse novo espaço biográfico, como discute Leonor Arfuch (2010), em um dos estudos centrais dessa “nova onda” do biografismo.
    Nos interessa, portanto, refletir sobre um cinema, cujo dispositivo transpõe a experiência vivida para as próprias câmeras, configurando a cotidianidade como matéria prima para a narrativa (TONELO, 2021). Tais obras, muitas vezes compreendidas como diários fílmicos, como filmes pessoais, como ensaios inspirados no cinema direto, colocam o cinema documental diante um dilema que ora amarra suas formas na banalidade de uma experiência íntima e “secreta” e ora se enquadra na dimensão do espetáculo, quando torna as imagens públicas para serem consumidas.
    Muitos foram os diretores que na história do cinema, principalmente a partir no final da década de sessenta, experimentaram as formas autobiográficas com câmeras subjetivas e pessoais para produzirem seus filmes. Neste momento essa pesquisa não foca em nenhum cineasta específico. Neste primeiro movimento a discussão que propomos gira em torno da problematização que compreende tais dispositivos como uma forma de pensar a teoria do cinema. Como tais filmes dão a ver teorias sobre o cinema? Auto-reflexividade, contradições público/privadas, intimidade, espetáculo, produção simbólica de uma época, são algumas das pistas que tais formas elaboram. Iremos atrás delas a fim de entender como modos de fazer produzem modos de pensar o cinema.

Bibliografia

    ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.
    COMOLLI, Jean-Louis. O desvio pelo direto. Cahiers du Cinéma, n. 211, 1969. Disponível em: . Acesso em 25 abr. de 2022.
    SARLO, Beatriz. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São. Paulo: Companhia das Letras, 2007.
    SIBILIA, Paula. O show do eu: a intimidade como espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 2016.
    TONELO, Gabriel. Filmar-se, Sendo: O tempo narrativo presente em documentários autobiográficos.Aniki: Revista Portuguesa da Imagem em Movimento. V.9 n.1. Disponível em https://aim.org.pt/ojs/index.php/revista/article/view/792. Acesso em 15 mai de 2022.
    VEIGA, Roberta. Autobiografia “não-autorizada”: por uma experiência limiar no documentário na primeira pessoa. Doc On-Line. n. 19, mar. 2016. p. 42-59. Disponível em: . Acesso em: 27 mar. 2022.